Era aquele que dizia que não bebeu nada, apesar do bafo de cerveja.
Era aquele que dizia que não fumou, apesar do cheiro de cigarro.
Era aquele que dizia que não pegou as chaves, apesar de ter sido o último a sair com elas.
Era aquele que negava antes de ouvir a pergunta. Das situações mais triviais às mais complexas.
Desprezava as pequenas mentiras. Acreditava que representavam lapsos necessários, pequenas omissões imprescindíveis para viver a dois.
Eu me transformei por amor. Busco ser honesto sempre, assumindo as mancadas e as falhas.
Mentir não me tornava imperfeito, mentia porque não admitia errar. Não aceitava arranhar a minha imagem. Somente mente quem se julga perfeito, e quer esconder seus vacilos.
Atravessei um tabu de décadas, deixei para trás antigas crenças que não entendo de onde tirei.
Todo homem é conservador e resiste às metamorfoses. Até se apaixonar.
“Não vou mudar”, portanto, é uma frase falsa. Apague de seu vocabulário.
Por amor, mudaremos sim. É só mudando que amadurecemos.
Por amor, nos revolucionamos sim.
Pode vir com sua teimosia, com seu orgulho, com sua arrogância, afirmando que é imutável, que não mexerá em seu temperamento, que tem seus hábitos, que foi assim toda a vida, mas mudará sim.
A convivência influencia, abre as ideias, destrói intolerâncias, força a mutação emocional.
Amor é exceção. É quando praticamos a exceção. Pode deixar as regras para os outros.
Quer uma maior declaração do que tentar fazer o que não admitia ou apreciar o que recusava?
Se você mantinha distância de água, por amor fará natação.
Se você alertou que jamais dirigiria um carro, por amor entrará numa autoescola.
Se você alimentava horror de avião, atravessará o oceano atlântico de seu medo.
No relacionamento que dá certo, promessa não é maldição. Ainda que tenha lavrado verdades no cartório, elas serão lavadas dentro de casa: vão desbotar, vão amarelar, vão desaparecer.
Já vi gente parar de beber, parar de fumar, parar de trapacear, parar de trair.
Vícios são abolidos, virtudes são regeneradas: mudaremos sim.
Encontraremos coragem no olhar terno e confiante de nossa esposa. Localizaremos vontade na cumplicidade ingênua do filho.
Mudaremos sempre. Mudaremos vários fins enquanto não vem nossa morte.
19 de janeiro de 2014
Fabricio Carpinejar, Zero Hora
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