Resultados do teste Pisa mais uma vez fazem soar as sirenes sobre o estado da educação no país. Estranhamente, não haveremos de sair do lugar
Em seu magnífico livro A vida em análise, recém-lançado no Brasil, o psicanalista norte-americano Stephen Grosz conta, entre outras, a história de Marisa Panigrosso – mulher que saiu rapidamente da Torre Sul do World Trade Center assim que soaram os alarmes. As demais pessoas que estavam com ela no 98.º andar não fizeram o mesmo, e não viveram para contar. Grosz aproveita a deixa para se perguntar por que tendemos a ignorar os muitos alarmes que soam na sociedade. Negligência? Conforto? Descrença?
O Pisa – sigla em inglês para o Programa Internacional de Avaliação de Alunos – é uma promoção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Abrange 470 mil alunos de 15 anos, oriundos de 65 países industrializados, incluindo convidados com menos lucros a exibir, a exemplo do Brasil. Repete-se a cada três anos. Nessa ocasião, as sirenes tocam solenemente para nós. Aliás, não seria exagero dizer que a única serventia do exame seja justamente essa: a de nos fazer reagir. Mas não chega a tanto, para surpresa geral. Um caso para Grosz.
O Brasil entra no Pisa como um agregado, um agraciado pela oportunidade de comparar seu desempenho e medir seu estágio em meio a nações que fazem investimentos maciços em educação. Quem sabe se anime. A estratégia não tem funcionado. Algum caprichoso que se ocupe em colocar lado a lado os resultados do teste, desde sua implantação, em 2000, há de ver que o país tem lugar cativo nas últimas posições, merecendo um prêmio, sim, mas por sua persistência na apatia. Fosse um ataque às Torres Gêmeas, estaríamos todos mortos.
O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, bem que tentou fazer de conta que o bicho não é tão feio como se pinta. Destacou o avanço dos 20 mil alunos brasileiros testados no campo da Matemática, mas sua retórica não convenceu. Estamos em 55.º lugar em Leitura e compreensão de texto; em 58.º na Matemática e 59.º em Ciências, posições resistentes às palavras de conforto. Marisa Panigrosso nem esperaria a última nota antes de se descabelar até a escada de incêndio.
A inércia tem uma explicação: o Pisa reflete o que já estamos carecas de saber. Diante de um fato sobre o qual não podemos agir, tendemos a ficar calados, à espera de que alguém mude de assunto, poupando-nos do tédio. Para os que não querem passar o próximo milênio com cara de paisagem, resta tentar resolver o problema por partes, para pelo menos entender o que significam três edições de bocejos no Pisa. Ter notas tão baixas em Ciência, por exemplo, é um tabefe: sinal de que para nós o avanço tecnológico continuará a ser uma mentira, uma lorota boa.
Um bom roteiro sobre perdas e danos é partir do Plano Nacional de Educação, o PNE, que vai fazer água antes de os investimentos na educação chegarem a 10% do PIB, como se planeja. Pois o buraco começa aí, na falta de instrumentos. Ora, dinheiro não é problema. Não resolve a educação, sabe-se. O Brasil até que gasta bastante. Mas é difícil não passar na frente de uma escola pública sem concluir que se trata de um dos lugares mais desprestigiados de que se tem notícia. Já os estádios de futebol, nem tanto.
Estima-se que o Brasil gaste US$ 26 mil com cada um de seus alunos entre 6 e 15 anos. Esse valor, se comparado ao de países que ocupam o topo do Pisa, reforçam a impressão de que somos mesmo ruins em matemática – a básica. Dica: basta multiplicar por quatro e eis o número ideal. Em tempo – professores americanos ganham 20% a mais do que a média de todos os salários do país. Professores brasileiros, 20% a menos. A carreira não é atraente. Explica e justifica.
Sem plano, sem investimentos, o que sobra são os estragos. Vale repetir o dado que assombrou o país nesses quase idos de 2013. Soube-se que um em cada cinco jovens entre 15 e 29 anos está fora da escola – 70% deles são mulheres. Que 5,3 milhões de brasileiros entre 18 e 25 anos nem estudam nem trabalham. Que algo como 23% dos jovens da faixa etária avaliada pelo Pisa não estão nem sequer na escola, o que de resto nos garantiria uma posição ainda pior.
A essa altura, melhor deixar: não é a prova que importa. O que importa é que a cada prova nos damos conta da dimensão da tragédia: 40% dos que ingressam no ensino médio não vão chegar ao fim do ciclo, confirmando o maior sistema de fracasso da vida brasileira. O que dizer, afinal, do fato de que 2 milhões de inscritos para o Enem não apareceram para fazer a prova? Mais estranho que a ficção.
Em seu magnífico livro A vida em análise, recém-lançado no Brasil, o psicanalista norte-americano Stephen Grosz conta, entre outras, a história de Marisa Panigrosso – mulher que saiu rapidamente da Torre Sul do World Trade Center assim que soaram os alarmes. As demais pessoas que estavam com ela no 98.º andar não fizeram o mesmo, e não viveram para contar. Grosz aproveita a deixa para se perguntar por que tendemos a ignorar os muitos alarmes que soam na sociedade. Negligência? Conforto? Descrença?
O Pisa – sigla em inglês para o Programa Internacional de Avaliação de Alunos – é uma promoção da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Abrange 470 mil alunos de 15 anos, oriundos de 65 países industrializados, incluindo convidados com menos lucros a exibir, a exemplo do Brasil. Repete-se a cada três anos. Nessa ocasião, as sirenes tocam solenemente para nós. Aliás, não seria exagero dizer que a única serventia do exame seja justamente essa: a de nos fazer reagir. Mas não chega a tanto, para surpresa geral. Um caso para Grosz.
O Brasil entra no Pisa como um agregado, um agraciado pela oportunidade de comparar seu desempenho e medir seu estágio em meio a nações que fazem investimentos maciços em educação. Quem sabe se anime. A estratégia não tem funcionado. Algum caprichoso que se ocupe em colocar lado a lado os resultados do teste, desde sua implantação, em 2000, há de ver que o país tem lugar cativo nas últimas posições, merecendo um prêmio, sim, mas por sua persistência na apatia. Fosse um ataque às Torres Gêmeas, estaríamos todos mortos.
O ministro da Educação, Aloizio Mercadante, bem que tentou fazer de conta que o bicho não é tão feio como se pinta. Destacou o avanço dos 20 mil alunos brasileiros testados no campo da Matemática, mas sua retórica não convenceu. Estamos em 55.º lugar em Leitura e compreensão de texto; em 58.º na Matemática e 59.º em Ciências, posições resistentes às palavras de conforto. Marisa Panigrosso nem esperaria a última nota antes de se descabelar até a escada de incêndio.
A inércia tem uma explicação: o Pisa reflete o que já estamos carecas de saber. Diante de um fato sobre o qual não podemos agir, tendemos a ficar calados, à espera de que alguém mude de assunto, poupando-nos do tédio. Para os que não querem passar o próximo milênio com cara de paisagem, resta tentar resolver o problema por partes, para pelo menos entender o que significam três edições de bocejos no Pisa. Ter notas tão baixas em Ciência, por exemplo, é um tabefe: sinal de que para nós o avanço tecnológico continuará a ser uma mentira, uma lorota boa.
Um bom roteiro sobre perdas e danos é partir do Plano Nacional de Educação, o PNE, que vai fazer água antes de os investimentos na educação chegarem a 10% do PIB, como se planeja. Pois o buraco começa aí, na falta de instrumentos. Ora, dinheiro não é problema. Não resolve a educação, sabe-se. O Brasil até que gasta bastante. Mas é difícil não passar na frente de uma escola pública sem concluir que se trata de um dos lugares mais desprestigiados de que se tem notícia. Já os estádios de futebol, nem tanto.
Estima-se que o Brasil gaste US$ 26 mil com cada um de seus alunos entre 6 e 15 anos. Esse valor, se comparado ao de países que ocupam o topo do Pisa, reforçam a impressão de que somos mesmo ruins em matemática – a básica. Dica: basta multiplicar por quatro e eis o número ideal. Em tempo – professores americanos ganham 20% a mais do que a média de todos os salários do país. Professores brasileiros, 20% a menos. A carreira não é atraente. Explica e justifica.
Sem plano, sem investimentos, o que sobra são os estragos. Vale repetir o dado que assombrou o país nesses quase idos de 2013. Soube-se que um em cada cinco jovens entre 15 e 29 anos está fora da escola – 70% deles são mulheres. Que 5,3 milhões de brasileiros entre 18 e 25 anos nem estudam nem trabalham. Que algo como 23% dos jovens da faixa etária avaliada pelo Pisa não estão nem sequer na escola, o que de resto nos garantiria uma posição ainda pior.
A essa altura, melhor deixar: não é a prova que importa. O que importa é que a cada prova nos damos conta da dimensão da tragédia: 40% dos que ingressam no ensino médio não vão chegar ao fim do ciclo, confirmando o maior sistema de fracasso da vida brasileira. O que dizer, afinal, do fato de que 2 milhões de inscritos para o Enem não apareceram para fazer a prova? Mais estranho que a ficção.
16 de dezembro de 2013
Editorial Gazeta do Povo - PR
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