Emprego. Com indústria desaquecida, trabalhadores migram para o comércio e os serviços, onde ainda há vagas disponíveis; para especialistas, no entanto, o problema dessa migração é a baixa qualidade dos postos de trabalho oferecidos nesses setores
Os problemas que a indústria brasileira atravessa já fizeram mais de 200 mil funcionários perder o emprego em pouco mais de dois anos.
Os trabalhadores industriais estão migrando para setores que ainda têm fôlego para aumentar as contratações, como o comércio e, principalmente, os serviços, firmando os contornos da mobilidade do mercado de trabalho nacional.
Os números da Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram que, em junho de 2011, a força de trabalho da indústria - que inclui os subsetores de transformação, extrativa e distribuição de eletricidade, gás e água - somava 3,769 milhões de empregados. O resultado foi o maior da série histórica, iniciada em março de 2002.
No mês passado, no entanto, esse número caiu para 3,544 milhões de trabalhadores. Só neste ano, são menos 117 mil vagas nas seis principais regiões metropolitanas do País.
"Hoje se emprega muito menos gente no setor industrial do que há dez anos. Isso é uma tendência de longo prazo. O emprego industrial tende a se reduzir, e a maior parte do emprego disponível é o de baixa qualificação no setor de serviços. Não há nenhuma indicação de que isso possa se reverter (no próximo ano)", afirmou o presidente do Instituto de Estudos do Trabalho e Sociedade (Iets), Simon Schwartzman.
Desde o auge do emprego na indústria, na metade de 2011, a população ocupada no setor recuou 6%, apontou o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). O cálculo tem como base os dados do IBGE, cuja PME é apurada em seis regiões metropolitanas: Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre, Recife, Salvador e Belo Horizonte.
"Ou seja, 225 mil postos de trabalho foram extintos. Esse dado bate com o da Pesquisa Industrial Mensal: Empregos e Salários (Pimes), também do IBGE. A indústria desacelerou a produção e mandou gente embora mesmo", avaliou o economista-chefe do Iedi, Rogério César de Souza.
São Paulo. Na Região Metropolitana de São Paulo, responsável por cerca de 40% da PME, a participação da indústria na população ocupada encolheu 1,1 ponto porcentual em dois anos. O setor detinha 19,2% da população ocupada em novembro de 2011, mas passou a responder por apenas 18,1% em novembro de 2013.
No ápice do emprego industrial na região, verificado em agosto de 2008 - um mês antes da quebra do Lehmann Brothers, que marcou o início da grande crise econômica global -, o setor empregava 1,955 milhão de pessoas. Em novembro deste ano, a indústria local tinha encolhido para 1,762 milhão de funcionários, o equivalente a um corte de 193 mil vagas só em São Paulo.
Por outro lado, a região registrou aumento na participação do comércio, que saiu de uma fatia de 17,7% da população ocupada em novembro de 2011 para 18,1% em novembro último.
Ao mesmo tempo, o setor chamado de outros serviços - segmento que inclui alojamento, transporte, limpeza urbana e serviços pessoais - passou a contar com uma parcela de 18,3% da população ocupada na Região Metropolitana de São Paulo, ante a fatia de 17,2% verificada dois anos antes.
Dessa maneira, a categoria de "outros serviços" ultrapassou a indústria como maior segmento empregador na região, que tem o maior e mais diversificado parque industrial do País.
Adaptação ao setor de serviços nem sempre é tarefa fácil
Por meses, a indústria conseguiu reter trabalhadores mesmo enquanto havia retração na produção. Agora, o quadro é inverso. Nem a ligeira reação da produção nos últimos três meses foi suficiente para evitar novos cortes.
"A perda na indústria (em novembro) em relação a setembro é significativa. A indústria, por dois meses consecutivos, vem apresentando reduções nos postos de trabalho. Houve queda de 2,4% na população ocupada em outubro (na comparação com o mês anterior) e recuo de 2,5% em novembro", afirmou o coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE, Cimar Azeredo.
Além do vaivém da produção (desde alta de 2,8% em janeiro até queda de 2,5% em julho), a indústria perde em competitividade. Com o mercado de trabalho aquecido, é inevitável que trabalhadores migrem para outros setores, avalia o economista da Fundação Getúlio Vargas (FGV) Fernando de Holanda Barbosa Filho. Segundo ele, acaba valendo a lógica do "quem paga mais".
João Saboia, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IE/UFRJ), pondera, contudo, que trabalhadores da indústria (dispensados ou não) podem até tentar migrar para o setor terciário, mas essa adaptação não é necessariamente fácil.
"Às vezes, o que ele sabe fazer é algo tipicamente industrial." Nesse caso, o trabalhador pode abdicar do mercado formal e se tornar um profissional autônomo, segundo o professor.
O problema do setor terciário, para onde esses trabalhadores estão migrando, é que em geral são empregos de baixa produtividade e de rendimento mais baixo, apontou Saboia. "A massa das vagas no setor terciário está na base da pirâmide." Segundo ele, o setor de serviços responde por dois terços dos empregos no País, e a tendência é de que essa proporção aumente. "Nos EUA, 80% dos empregos estão no setor terciário."
30 de dezembro de 2013
DANIELA AMORIM, IDIANA TOMAZELLI - O Estado de S.Paulo
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