"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 30 de junho de 2017

"NO MUNDO, MAIS E MAIS PESSOAS TENDEM AO EXTREMISMO", LAMENTA AMÓS OZ

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No Brasil para participar do ciclo de conferências “Fronteiras do Pensamento”, o escritor e ativista político israelense Amós Oz, 77 anos, falou deu palestras em São Paulo e Porto Alegre. Oz aproveitou a ocasião para lançar “Mais de uma luz” (Companhia das Letras), que reúne três ensaios, dos quais o que abre o livro, “Caro fanático”, é uma versão revista, reeditada e ampliada de “Como curar um fanático”. Na entrevista a seguir, ele fala sobre o aprofundamento da polarização, da eleição de Donald Trump para a presidência dos Estados Unidos e da solução de dois estados para Israel.
O que aconteceu para o aprofundamento das divisões e do extremismo no mundo?Não sei muito sobre a situação do Brasil, então, não posso comentar a respeito. Mas no resto do mundo há uma crescente polarização e radicalização. Mais e mais pessoas tendem ao extremismo. A maior parte à direita, às vezes à esquerda, às vezes a um profundo extremismo religioso. Isso acontece porque as questões estão se tornando cada vez mais complexas. Com isso, muitas pessoas buscam respostas simples, de uma sentença, que cubram amplamente tudo o que se está perguntando. E são sempre os extremistas, os fanáticos e os radicais que têm as respostas mais simples. Eles têm o tipo de resposta que cobre todas as perguntas do mundo.
O senhor acha que as redes sociais tiveram um papel nessa busca por respostas simples e rápidas para questões complexas?A rede social não é necessariamente a causa, mas é um sintoma, porque está se tornando parte da indústria do entretenimento. Para vender, publicizar e competir, eles jogam uma celebridade aos leões duas vezes por semana. Da mesma forma que, na Roma antiga, no Coliseu, eles jogavam as pessoas aos leões. E fazem o mesmo em outros setores da mídia, não importando se essas celebridades são ou não culpadas de qualquer coisa. Também, muito frequentemente, as redes sociais espalham simplificações – respostas simples para questões complexas. “A culpa é da globalização”, “a culpa é do Islã”, “a culpa é do sionismo”, “a culpa é do colonialismo imperialista”. Não importa quem, o importante é culpar alguém. Isso é muito perigoso e infantil. Faz parte de um fenômeno da infantilização da raça humana. Respostas infantis, mídia infantil, política infantil.
O senhor menciona a indústria do entretenimento. Por quê?A imprensa e a mídia estão se tornando uma extensão da indústria do entretenimento. As pessoas leem os jornais, não para ponderar ou estudar ou ampliar seus horizontes, querem diversão ou escândalo ou sensacionalismo. Querem na mídia, na imprensa, na política. Em muitos países, as pessoas votam nos candidatos não porque ele representa suas ideias, mas porque ele é divertido, porque é muito jovem, porque é muito escandaloso, porque usa palavras incríveis. “Vai ser divertido se votarmos nesse candidato, vai haver escândalo, vai ser animado”. Em muitos países, os eleitores votam não porque desejam levar alguém para o Parlamento ou para o governo para representar seus ideais, mas porque querem que a política seja divertida, animada e escandalosa.
Foi o que aconteceu nos Estados Unidos, com a eleição de Donald Trump?Está acontecendo em todos os lugares. Vários parlamentos estão cheios de misses, meteorologistas, astros e estrelas da TV. Então, o limite entre a política e entretenimento está desaparecendo. Os eleitores querem os políticos para entretê-los não para resolver os seus problemas. Portanto, não nos deem ideias, deem-nos frases de efeito; não nos deem uma visão, deem-nos um escândalo; não expressem um horizonte, expressem um insulto doloroso aos seus rivais. Essa é uma perigosa síndrome que está atingindo o futuro da democracia em todos os lugares. Acontece no Brasil, claro, não sei em que medida. E também em Israel, nos Estados Unidos e na Europa.
O senhor não mencionou o presidente americano, Donald Trump, em sua resposta, mas gostaria de insistir em um comentário a respeito dele.Quem foram os rivais de Donald Trump no Partido Republicano que não foram eleitos candidatos (nas primárias)? Muitos deles eram fanáticos religiosos. Trump não é um fanático religioso, é um adolescente extravagante, ávido por atenção e amor. É ruim, mas nem tanto. Se os EUA tivessem eleito um fanático, eu ficaria bem mais preocupado. Quando meus amigos de esquerda, em Nova York, lamentaram a eleição dele dizendo que haviam eleito um Hitler, eu respondi: “Ele está mais para (o ex-primeiro-ministro italiano Silvio) Berlusconi”.
Quando veio ao Brasil no ano passado, outro escritor israelense, David Grossman, seu amigo, disse que a única solução possível para a questão entre Israel e palestinos são dois estados. O senhor defende a mesma solução?Israel é um país muito pequeno, aqui no Brasil as pessoas não têm ideia da dimensão, tem quase o tamanho da Sicília, na Itália, e é menor do que a Dinamarca. Acontece que é a única pátria de árabes palestinos e o único lar dos judeus israelenses. Por que eles não podem se unir e viver juntos, felizes para sempre, como uma grande família? Porque não são unidos, não são felizes e não são uma família. São duas famílias infelizes, divididas pela religião, pela experiência histórica e por anos e anos de ódio e violência. É irreal pensar que essas duas partes simplesmente pulem em uma cama de lua de mel e comecem a fazer amor ao invés de se matar. O que precisamos é o que meu amigo David Grossman disse e que eu venho defendendo desde o fim da Guerra dos Seis Dias, em 1967: dividir uma pequena casa em duas ainda menores, Israel ao lado da Palestina, como vizinhos. Primeiro, israelenses e palestinos terão que aprender a dizer “bom dia” e parar de atirar uns nos outros. Depois, eles terão que desenvolver o hábito de se visitar para tomar café e conversar. Eventualmente, eles deverão fazer o almoço juntos, o que significa dividir a economia. No futuro, quem sabe, um mercado comum, uma confederação. Mas o primeiro passo deve ser um divórcio justo. Duas famílias, dois países vizinhos e em bases iguais, soberanos, mas mutuamente reconhecidos.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG
 – Amós Oz é um dos pensadores mais importantes do mundo. Suas entrevistas são verdadeiras aulas de cultura, racionalismo e civilidade. Está faltando ao Brasil alguém como Amós Oz, para entendermos que podemos alcançar um futuro grandioso, basta termos juízo(C.N.)

30 de junho de 2017
Alessandro GianniniO Globo

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