"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

PAPAI NOEL É UM BOM VELHINHO (ESPECIALMENTE PARA O MUNDO DOS NEGÓCIOS!)



Charge do Erlich, reprodução do Arquivo Google
A classe média brasileira, geralmente, gasta 50% do valor que recebe do 13º salário com o pagamento de dívidas, mas vai às compras atendendo ao apelo do Papai Noel, um velhinho bonachão apenas para o comércio. A chegada de Papai Noel na noite de Natal é esperada com ansiedade por crianças em todo o mundo, embora o mito do “bom velhinho” carregue outras versões em nada carismáticas ou bondosas, como revela Roland Barthers em seu livro “Mitologias”, que se ocupa com uma análise semiológica das mensagens veiculadas pelos meios de comunicação de massa.
Segundo o livro, Papai Noel funciona como imagem reparadora da sociedade. É um momento em que a sociedade se livra de sua culpa, através do presente e da imagem idealizadora do “bom velhinho”, do pai e do mundo adulto, pois a sociedade não aceita que se possa ter um lado bom e outro mau. Papai Noel surge, neste aspecto, como um personagem apenas bom e com ele a sociedade se redime. Isso passa para a criança, que é impedida de expressar o seu lado agressivo (mau).
A imagem da infância é feita de formulações ideais de bondade e inocência, afirmam os psicólogos, que vêem assim, um comportamento repressor do Papai Noel, na medida em que o presente, na verdade, é uma troca. Só recebe presente que se comporta bem, uma maneira do pai esconder a repressão que ele exerce sobre o filho.
SÃO NICOLAU – A ideia de que Papai Noel teve origem como sucessor de São Nicolau ou São Klaus pode ter sido o início do hábito de dar presentes na Alemanha, não é muito aceita pelos psicólogos. “Na versão de Walt Disney para Papai Noel, nota-se que ele confecciona brinquedos numa fábrica em que os anões são artesãos e há, naturalmente, um artesão-chefe. Logo, Papai Noel procura ocultar o caráter de produção coletiva da indústria”.
Para os psicólogos, Papai Noel, como se apresenta hoje, é uma construção moldada sobre fragmentos de mitos europeus. “Nessa construção encontramos, entre outros, o componente de humanização que é semelhante aos dos desenhos animados. Quer dizer, a figura do Papai Noel é acentuada pelos traços curvos, é engordada como acontece com os bichos”.
Na verdade, Papai Noel só existe como escamoteamento, porque o consumo continua sendo culpado, enquanto ele é o móvel inocentador desse consumo, pois absolve sua culpa. Por outro lado, ele é um dos muitos mitos do poder em sua imagem dadivosa. Por isso, “ele é Papai Noel, um substituto do pai, porque é o pai quem realmente faz. Pai, em escala social, é a instituição. Logo, Papai Noel é uma imagem institucional”, do ponto de vista psicológico.
AUTOGRATIFICAÇÃO – Na análise psicanalítica, Papai Noel opera como elemento de frustração do superego e de resistência ao consumo. Ele frustra o superego do consumidor naquilo que este tem de crítica à gratificação. Quer dizer, o anseio de gratificação pelo presente de Papai Noel e, este presente é uma autogratificação, sobretudo, quando se dá alguma coisa a um filho.
No Brasil, o incremento da propaganda do mito Papai Noel, a partir de 1930, associa-se à industrialização e ao acréscimo de dependência externa. Vale ressaltar que, na década de 30, em todo o mundo, Papai Noel assumiu a feição que tem hoje, esse caráter bonachão, no quadro de uma crise econômica duradoura, quando foi necessária a intervenção do Estado em todos os setores da economia (a política do New Deal reproduzida nos países europeus de diferentes formas).
FOLIA DE REIS – O Brasil, pelo processo de colonização, vinha desenvolvendo várias representações natalinas próprias, que se centravam nas Festas de Reis. Estas festas, apesar dos folguedos de representações religiosas de origem ibérica, eram de realização brasileira, um ritual que variava de região para região. Não havia no país unidade nacional para manter uma só representação. Mas essas festas foram sendo esmagadas em função da sociedade de consumo, surgindo, então, a imagem definitiva e alienígena de Papai Noel, puxando seu trenó em pleno verão tropical.
O Natal (data do nascimento de Jesus Cristo) foi deturpado pelo mito Papai Noel, pois sua importância como instituição comercial na sociedade brasileira, sobretudo no processo de industrialização de bens de consumo, é notável, uma vez que se reflete nos próprios ciclos de emissão de papel-moeda, explicam os economistas. Nesses ciclos há piques:
O primeiro ocorre entre os meses de maio e julho, e é destinado à indústria de bens; o segundo ocorre entre agosto e setembro, destinando-se ao comércio atacadista de bens; e o último começa em outubro e emenda dezembro, que é o pique do varejo e do financiamento ao consumidor. Mesmo porque uma boa parte dos brasileiros que vive ao nível de subsistência tem como único recurso de compra a gratificação do Natal.

23 de dezembro de 2016
Paulo Peres

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