O comentarista Lucas Silva, sempre atento, enviou à Tribuna da Internet uma importante matéria da BBC Brasil, sobre uma ação que pode antecipar as eleições diretas para presidente, caso MichelTemer seja cassado pela Justiça Eleitoral. Como o relator Luís Roberto Barroso já preparou o relatório e liberou a ação, basta que a presidente do Supremo, ministra Carmén Lúcia, coloque a questão em pauta após o recesso, em fevereiro.
A Constituição prevê que, caso os cargos de presidente e vice fiquem vagos após a metade do mandato de quatro anos, o Congresso deve eleger um presidente para cumprir o tempo restante. No entanto, o próprio Congresso aprovou em 2015 uma alteração no Código Eleitoral e estabeleceu que, caso a cassação pela Justiça Eleitoral ocorra faltando menos de seis meses para término do mandato, a eleição deve ser direta.
INCONSTITUCIONALIDADE – A questão foi parar no Supremo, porque o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, moveu em maio uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI 5.525) em que pede que a corte considere a mudança do Código Eleitoral incompatível com a Constituição – ou seja, sustenta que a eleição teria que ser indireta caso a chapa presidencial seja cassada a partir de 2017.
Mas a Clínica Direitos Fundamentais da UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro) pediu em outubro para participar da ação como amicus curiae (amigo da corte) e lançou uma argumentação contrária, sustentando que a mudança no Código Eleitoral é constitucional.
O assunto é importante, porque a maioria da população apóia a antecipação da eleição. Segundo pesquisa do Instituto Datafolha, 63% dos entrevistados são favoráveis à renúncia de Temer neste ano para que haja eleição direta antes de 2018.
DEPENDE DO TSE – A hipótese de haver eleição direta é remota, porque na entrevista coletiva desta quinta-feira o próprio Temer disse que não vai renunciar. Isso significa que ele teria de ser cassado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que vai decidir se a chapa presidencial eleita em 2014, composta por Dilma Rousseff e Michel Temer, cometeu ilegalidades na campanha e, por isso, deve ser cassada.
Temer está tranquilo, por dois motivos. 1) O presidente do TSE é o ministro Gilmar Mendes, seu amigo pessoal, que recentemente almoçou com ele no Palácio Jaburu e não vai se declarar suspeito. O mandato de Gilmar Mendes vai até maio de 2018 e ele vai fazer o possível e o impossível para evitar a condenação de Temer, já deu até entrevista dizendo que pode haver separação da chapa para julgamento. 2) o processo é demorado. “Se a chapa for cassada, respeito a decisão do Judiciário. Claro que antes disso haverá recursos e mais recursos”, disse o presidente na coletiva natalina.
TEORIA E PRÁTICA – A reportagem da BBC – sem crédito do autor – explora com habilidade a polêmica jurídica, para mostrar que na teoria existe mesmo a possibilidade da antecipação da próxima eleição direta. Na prática, porém, a hipótese é remota, a não ser que surjam novas denúncias envolvendo de forma direta o presidente Michel Temer, circunstância que até parece bem provável.
Nesta quinta-feira, enquanto ele dava a entrevista coletiva no Palácio Alvorada, para dizer que não houve doação ilegal da Odebrecht, o Estadão publicava reportagem de Andreza Matais revelando que o ex-assessor José Yunes, melhor amigo de Temer, recebeu propina de R$ 1 milhão, em dinheiro vivo, liberada por Eliseu Padilha, aquele ministro que está com os bens bloqueados pela Justiça, por grilagem de terras públicas, devastação de 1,3 mil hectares de reserva ecológica e acusação de impor trabalho semiescravo, mas não pode ser demitido.
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PS – Somente a proteção a Padilha já representa transgressão constitucional ao Princípio da Moralidade e configura crime de responsabilidade de Temer, segundo a Lei do Impeachment, art. 9º, item 7: “Proceder de modo incompatível com a dignidade, a honra e o decoro do cargo”. Em nenhum país minimamente civilizado, um ministro respondendo a esse tipo de processo poderia se tornar intocável. Ou “imexível”, como diria Rogério Magri. Mas em matéria de leis e ética, aqui no Brasil tudo é questão de interpretação. (C.N.)
23 de dezembro de 2016
Carlos Newton
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