O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, vai analisar se pede o afastamento do ministro do Supremo Tribunal Federal Dias Toffoli das investigações relacionadas à Operação Custo Brasil, que envolve suposto pagamento de propinas ao ex-ministro petista Paulo Bernardo (Planejamento e Comunicações) e sua mulher, a senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR).
Mensagens de celular e e-mails apreendidos pela Polícia Federal indicam que Toffoli tem relação de “amizade íntima” com o ex-ministro da Previdência Carlos Gabas, um dos investigados, o que pode ferir “deveres de imparcialidade” na magistratura. O Estado apurou que documentos sobre o caso, mantidos em sigilo, foram enviados na semana passada pela Procuradoria da República em São Paulo ao gabinete de Janot, ao qual caberá decidir se requer ao Supremo a suspeição do ministro. Não há prazo, contudo, para que o procurador-geral tome uma decisão sobre o caso.
CHURRASCO – Conforme fonte que teve acesso à investigação, as comunicações mostram que Toffoli e Gabas marcavam encontros fora do expediente e combinavam eventos sociais, até mesmo um churrasco, o que chamou a atenção no MPF.
A presidente do Supremo, Cármen Lúcia, também foi oficiada. Janot pode pedir o arquivamento do caso ou arguir a suspeição do ministro, o que levaria a pedir explicações ao próprio Toffoli. Se o ministro entender que não há impedimento e continuar participando de julgamentos do caso, caberá ao plenário do STF decidir o afasta ou não.
A existência das mensagens entre Toffoli e Gabas foi revelada pelo portal estadao.com.br no dia 7 deste mês.
CONSIGNADOS – Desdobramento da Lava Jato, a Custo Brasil apura esquema desvio que movimentou R$ 100 milhões por meio de contrato com a Consist Software, que gerenciava o sistema de concessão de empréstimos consignados a servidores públicos.
Paulo Bernardo é acusado de receber R$ 7 milhões de suborno da empresa, supostamente repassados a ele por meio de um escritório de advocacia ao qual é ligado. A banca também pagaria despesas eleitorais de Gleisi, que é investigada perante o Supremo em inquérito sob relatoria de Toffoli.
Em 23 de junho deste ano, por ordem da Justiça Federal em São Paulo, a Polícia Federal fez buscas na casa de Gabas e o conduziu coercitivamente a prestar depoimento.
Paulo Bernardo foi preso e o apartamento funcional do Senado em que mora em Brasília, juntamente com Gleisi, sofreu buscas.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL – Dias depois, Toffoli negou pedido dos advogados do petista para que a investigação fosse encaminhada para o Supremo, mas determinou sua soltura, justificando que o ex-ministro sofreu “constrangimento ilegal”.
A suposta parcialidade do ministro foi apontada pela Procuradoria da República em São Paulo com base nas mensagens de celular e e-mails de Gabas, apreendidos no dia da operação. O ex-ministro não foi interceptado pela PF. O conteúdo foi descoberto pelos investigadores porque as conversas com Toffoli e as mensagens enviadas por e-mail estavam em seu celular, que foi apreendido.
Relatórios da PF sobre essas comunicações indicam relação pessoal de Toffoli com Gabas. Conforme o Código do Processo Penal, o juiz “dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer delas”. As conversas, segundo apurou o Estado, mostram os dois marcando encontros.
FORO PRIVILEGIADO – O envio dos documentos a Janot foi solicitada pelo procurador porque Toffoli, como ministro do Supremo, é detentor de foro por prerrogativa de função. A remessa foi autorizada no último dia 2 pelo juiz federal Paulo Bueno de Azevedo, da 6.ª Vara Federal, o mesmo que mandou prender Paulo Bernardo em junho. O pedido de afastamento se aplicaria, segundo o MPF em São Paulo, tanto à reclamação apresentada por advogados de Paulo Bernardo na Custo Brasil quanto ao inquérito que investiga Gleisi. A PGR informou que não comentaria o assunto.
Na decisão, ressalvando falar em tese sobre a questão da suspeição, o juiz federal afirmou que a legislação aponta para o distanciamento que os magistrados devem ter dos casos que julgam. “Tal dever é uma garantia para a sociedade, que não pode ficar à mercê de juízes parciais. Note-se que o dever é violado ainda que o magistrado profira decisões tidas como corretas. Isso porque, por mais que sejam consideradas corretas por outros membros do Judiciário, é necessário que também pareçam corretas aos olhos da sociedade. Um juiz parcial prejudica a aparência da Justiça”, escreveu.
CÓPIAS ENVIADAS – O juiz federal deferiu o envio de dois relatórios da PF que contêm o teor das mensagens trocadas com Toffoli para “conhecimento e eventual tomada de providências” de Janot. Além disso, determinou o encaminhamento de cópia de um desses documentos ao STF.
Procurado pelo Estadão, o gabinete de Toffoli informou, em nota, que o ministro “pauta suas decisões de impedimento e suspeição na legislação, analisando, caso a caso, os processos submetidos à apreciação do tribunal”.
Danyelle Galvão, advogada de Gabas, afirmou que não teve acesso aos relatórios e, portanto, não iria comentar o assunto.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Quando Dias Toffoli mandou soltar Paulo Bernardo, de quem é amigo pessoal, denunciamos aqui na “Tribuna da Internet” que ele jamais poderia ter atuado nesse processo. Na forma da lei, teria de se considerar suspeito e passar os autos a outro relator, como fez recentemente o ministro Luís Roberto Barroso. É a atitude correta, mas Dias Toffoli está pouco ligando para o que é certo ou errado, legal ou ilegal. E agora está passando por esse vexame, que será para sempre uma mancha em seu currículo, digo, em sua folha corrida. (C.N.)
17 de dezembro de 2016
Andreza Matais e Fábio Fabrini
Estadão
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