O Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que empresas e funcionários têm competência legal para negociar diretamente condições de trabalho, quando as entidades sindicais da categoria se recusarem a fazê-lo
Abrindo um importante precedente, que coincide com a colocação da reforma da legislação trabalhista na agenda política pelo governo do presidente Michel Temer, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que empresas e funcionários têm competência legal para negociar diretamente condições de trabalho, quando as entidades sindicais da categoria se recusarem a fazê-lo.
A decisão foi tomada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais da Corte e o caso envolve um acordo feito pela empresa Braskem diretamente com seus empregados, contra a vontade do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Química e Petroquímica da cidade de Triunfo, no Rio Grande do Sul. O acordo instituiu turnos ininterruptos de 12 horas de jornada, entre maio de 1997 e maio de 1999.
Editada em 1943, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) admite, no artigo 617, a possibilidade de negociação direta entre empregados e empregadores, quando as entidades sindicais não a promoverem em tempo hábil. Quatro décadas e meia depois, a Constituição de 1988 fixou em seis horas a jornada de trabalho em turnos ininterruptos de revezamento, mas permitiu que esse horário seja alterado por meio de negociações coletivas.
Ao julgar o caso da Braskem, a Subseção I do TST teve de avaliar se o artigo 617 da CLT foi admitido pela Constituição, pois, pela hierarquia das leis, a norma constitucional prevalece sobre leis ordinárias, como é o caso das leis trabalhistas. Até esse julgamento, os Tribunais Regionais do Trabalho (TSTs) não admitiam a possibilidade da negociação direta, alegando que, com o advento da Constituição, o artigo 617 da CLT teria perdido validade.
Por maioria, os ministros da Subseção I entenderam que esse artigo não é incompatível com a Constituição, motivo pelo qual ele continua em vigor. Além disso, enfatizando a conexão entre os dois textos legais, os ministros reafirmaram que a negociação direta entre empregados e empregadores só poderá ser realizada quando os sindicatos trabalhistas e as federações e as confederações correspondentes se recusarem a promovê-la. Com a decisão do TST, os TRTs a partir de agora terão apenas de analisar se os requisitos exigidos para a negociação coletiva direta estão presentes nos casos concretos que tiverem de julgar.
Dirigentes de sindicatos trabalhistas criticaram duramente a decisão da Subseção I do TST, alegando que, por deixar os trabalhadores desamparados, ela coloca os direitos sociais em risco. Segundo o advogado do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Química e Petroquímica de Triunfo, Marthius Cavalcanti Lobato, a entidade teria aceitado negociar com a Braskem, mas não concordou com nenhuma das propostas apresentadas. E a empresa, em vez de procurar a federação e a confederação sindical, teria apresentado um abaixo-assinado dos empregados pedindo negociação direta, o que foi aceito pelo TST, disse ele ao jornal Valor.
Até o momento, o acórdão da decisão da Subseção I do TST, cuja redação ficou a cargo do ministro João Oreste Dalazen, ainda não foi publicado. Contudo, por mais que dirigentes sindicais e advogados trabalhistas a critiquem, essa decisão vai ao encontro das inovações que membros do governo Temer pretendem introduzir na velha legislação trabalhista de 1943, para adequá-la à complexidade da economia brasileira. Concebida quando o País ainda engatinhava em matéria de industrialização, a CLT tornou-se uma camisa de força tanto para o setor industrial quanto para o setor de serviços, ambos cada vez mais funcionalmente diversificados. O denominador comum dessas inovações é o princípio de que o negociado entre empregados e empregadores, nas convenções coletivas sobre condições de trabalho, prevaleça sobre o que está legislado. As instâncias inferiores da Justiça do Trabalho já se manifestaram contrárias a essas inovações, sob a justificativa de que elas ameaçam conquistas sociais. Mas, como o precedente aberto deixa claro, esse não é o entendimento de parte da última instância da instituição.
10 de setembro de 2016
Editorial Estadão
Abrindo um importante precedente, que coincide com a colocação da reforma da legislação trabalhista na agenda política pelo governo do presidente Michel Temer, o Tribunal Superior do Trabalho (TST) decidiu que empresas e funcionários têm competência legal para negociar diretamente condições de trabalho, quando as entidades sindicais da categoria se recusarem a fazê-lo.
A decisão foi tomada pela Subseção I Especializada em Dissídios Individuais da Corte e o caso envolve um acordo feito pela empresa Braskem diretamente com seus empregados, contra a vontade do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Química e Petroquímica da cidade de Triunfo, no Rio Grande do Sul. O acordo instituiu turnos ininterruptos de 12 horas de jornada, entre maio de 1997 e maio de 1999.
Editada em 1943, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) admite, no artigo 617, a possibilidade de negociação direta entre empregados e empregadores, quando as entidades sindicais não a promoverem em tempo hábil. Quatro décadas e meia depois, a Constituição de 1988 fixou em seis horas a jornada de trabalho em turnos ininterruptos de revezamento, mas permitiu que esse horário seja alterado por meio de negociações coletivas.
Ao julgar o caso da Braskem, a Subseção I do TST teve de avaliar se o artigo 617 da CLT foi admitido pela Constituição, pois, pela hierarquia das leis, a norma constitucional prevalece sobre leis ordinárias, como é o caso das leis trabalhistas. Até esse julgamento, os Tribunais Regionais do Trabalho (TSTs) não admitiam a possibilidade da negociação direta, alegando que, com o advento da Constituição, o artigo 617 da CLT teria perdido validade.
Por maioria, os ministros da Subseção I entenderam que esse artigo não é incompatível com a Constituição, motivo pelo qual ele continua em vigor. Além disso, enfatizando a conexão entre os dois textos legais, os ministros reafirmaram que a negociação direta entre empregados e empregadores só poderá ser realizada quando os sindicatos trabalhistas e as federações e as confederações correspondentes se recusarem a promovê-la. Com a decisão do TST, os TRTs a partir de agora terão apenas de analisar se os requisitos exigidos para a negociação coletiva direta estão presentes nos casos concretos que tiverem de julgar.
Dirigentes de sindicatos trabalhistas criticaram duramente a decisão da Subseção I do TST, alegando que, por deixar os trabalhadores desamparados, ela coloca os direitos sociais em risco. Segundo o advogado do Sindicato dos Trabalhadores da Indústria Química e Petroquímica de Triunfo, Marthius Cavalcanti Lobato, a entidade teria aceitado negociar com a Braskem, mas não concordou com nenhuma das propostas apresentadas. E a empresa, em vez de procurar a federação e a confederação sindical, teria apresentado um abaixo-assinado dos empregados pedindo negociação direta, o que foi aceito pelo TST, disse ele ao jornal Valor.
Até o momento, o acórdão da decisão da Subseção I do TST, cuja redação ficou a cargo do ministro João Oreste Dalazen, ainda não foi publicado. Contudo, por mais que dirigentes sindicais e advogados trabalhistas a critiquem, essa decisão vai ao encontro das inovações que membros do governo Temer pretendem introduzir na velha legislação trabalhista de 1943, para adequá-la à complexidade da economia brasileira. Concebida quando o País ainda engatinhava em matéria de industrialização, a CLT tornou-se uma camisa de força tanto para o setor industrial quanto para o setor de serviços, ambos cada vez mais funcionalmente diversificados. O denominador comum dessas inovações é o princípio de que o negociado entre empregados e empregadores, nas convenções coletivas sobre condições de trabalho, prevaleça sobre o que está legislado. As instâncias inferiores da Justiça do Trabalho já se manifestaram contrárias a essas inovações, sob a justificativa de que elas ameaçam conquistas sociais. Mas, como o precedente aberto deixa claro, esse não é o entendimento de parte da última instância da instituição.
10 de setembro de 2016
Editorial Estadão
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