Ao aceitar uma taxa real neutra mais baixa, Fed estaria admitindo crescimento menor
Quando os principais banqueiros centrais do mundo se reunirem na próxima semana durante o prestigiado simpósio anual de Jackson Hole, no Estado americano de Wyoming, um assunto deverá dominar as discussões: as economias desenvolvidas podem estar na iminência de uma nova e longa era de taxas de juros significativamente baixas.
O debate ganhou peso nesta semana após a publicação de um artigo do presidente do Federal Reserve (Fed) de São Francisco, John Williams. Ele defende que a taxa de juros real neutra estaria próxima de zero nos Estados Unidos. Os juros reais neutros permitem que a economia cresça conforme seu potencial de expansão sem causar pressões inflacionárias. Segundo Williams, esses juros vêm caindo nos últimos anos em razão de uma série de fatores econômicos, entre eles uma mudança demográfica, um excesso de poupança global, um ritmo mais lento de crescimento da produtividade e um Produto Interno Bruto (PIB) potencial mais baixo.
Assim, ele argumenta que uma política monetária convencional – ou seja, subir ou baixar os juros básicos – tem menos espaço para estimular a economia durante futuras recessões. Seria preciso o auxílio de outros instrumentos, como os de política fiscal. Ele sugere até elevar a meta de inflação, que hoje se encontra em 2% nos EUA, ou fixar como objetivo uma taxa nominal de crescimento do PIB. Para o presidente do Fed de São Francisco, se antes da mais recente recessão o nível “normal” para os juros básicos de curto prazo estaria entre 4% e 4,5%, a queda da taxa real neutra levou o novo “normal” para os juros básicos de curto prazo para entre 3% e 3,5%, ou ainda mais baixos.
Williams não tem voto nas decisões do Fed sobre juros neste ano, mas a sua voz carrega enorme peso não somente entre outros dirigentes da instituição americana como entre autoridades dos principais bancos centrais ao redor do planeta.
A implicação do artigo de Williams é enorme para os próximos passos de política monetária do Fed. Se a taxa de juros real neutra caiu, de fato, para próximo de zero, não só o ritmo de aperto monetário pelo Fed poderá ser mais lento do que inicialmente previsto como o tamanho total de alta de juros será menor. Isso porque, ao aceitar que a taxa real neutra está mais baixa, o Fed estaria admitindo um crescimento econômico menor no futuro. Ou seja, o BC americano hesitará mais em elevar os juros básicos de curto prazo.
Juros de longo prazo. Se os outros dirigentes da instituição, em particular a sua presidente, Janet Yellen, encamparem os argumentos de Williams, os juros de longo prazo podem cair ou, no mínimo, seguir no nível atual. A taxa paga pelos títulos do Tesouro americano de 10 anos está ao redor de 1,56%, enquanto os papéis de 30 anos pagam juros de 2,27%. Se essas taxas de longo prazo caírem ou permanecerem baixas, haverá um efeito imediato sobre o valor do dólar frente às principais moedas internacionais, inclusive o real brasileiro. Isso porque uma era de juros baixos, possivelmente próximos de zero, tornaria as aplicações nos Estados Unidos menos atrativas, levando a um período prolongado de um dólar enfraquecido.
A postura recente de estímulos monetários por parte de vários bancos centrais, como os do Japão e da zona do euro, aumentou bastante a liquidez internacional, incentivando os investidores a buscar maior taxa de retorno em aplicações de países emergentes, como o Brasil.
Em razão disso, o dólar chegou a cair abaixo de R$ 3,13 neste mês. Se prevalecer a visão de John Williams de juros baixos por um período prolongado e da adoção de novas ferramentas de estímulos, não seria uma surpresa surgir pressão para o dólar cair abaixo de R$ 3,00. Com isso, as expectativas inflacionárias no Brasil poderiam ceder mais rapidamente, abrindo espaço para cortes agressivos da taxa Selic.
18 de agosto de 2016
Fábio Alves, Estadão
Quando os principais banqueiros centrais do mundo se reunirem na próxima semana durante o prestigiado simpósio anual de Jackson Hole, no Estado americano de Wyoming, um assunto deverá dominar as discussões: as economias desenvolvidas podem estar na iminência de uma nova e longa era de taxas de juros significativamente baixas.
O debate ganhou peso nesta semana após a publicação de um artigo do presidente do Federal Reserve (Fed) de São Francisco, John Williams. Ele defende que a taxa de juros real neutra estaria próxima de zero nos Estados Unidos. Os juros reais neutros permitem que a economia cresça conforme seu potencial de expansão sem causar pressões inflacionárias. Segundo Williams, esses juros vêm caindo nos últimos anos em razão de uma série de fatores econômicos, entre eles uma mudança demográfica, um excesso de poupança global, um ritmo mais lento de crescimento da produtividade e um Produto Interno Bruto (PIB) potencial mais baixo.
Assim, ele argumenta que uma política monetária convencional – ou seja, subir ou baixar os juros básicos – tem menos espaço para estimular a economia durante futuras recessões. Seria preciso o auxílio de outros instrumentos, como os de política fiscal. Ele sugere até elevar a meta de inflação, que hoje se encontra em 2% nos EUA, ou fixar como objetivo uma taxa nominal de crescimento do PIB. Para o presidente do Fed de São Francisco, se antes da mais recente recessão o nível “normal” para os juros básicos de curto prazo estaria entre 4% e 4,5%, a queda da taxa real neutra levou o novo “normal” para os juros básicos de curto prazo para entre 3% e 3,5%, ou ainda mais baixos.
Williams não tem voto nas decisões do Fed sobre juros neste ano, mas a sua voz carrega enorme peso não somente entre outros dirigentes da instituição americana como entre autoridades dos principais bancos centrais ao redor do planeta.
A implicação do artigo de Williams é enorme para os próximos passos de política monetária do Fed. Se a taxa de juros real neutra caiu, de fato, para próximo de zero, não só o ritmo de aperto monetário pelo Fed poderá ser mais lento do que inicialmente previsto como o tamanho total de alta de juros será menor. Isso porque, ao aceitar que a taxa real neutra está mais baixa, o Fed estaria admitindo um crescimento econômico menor no futuro. Ou seja, o BC americano hesitará mais em elevar os juros básicos de curto prazo.
Juros de longo prazo. Se os outros dirigentes da instituição, em particular a sua presidente, Janet Yellen, encamparem os argumentos de Williams, os juros de longo prazo podem cair ou, no mínimo, seguir no nível atual. A taxa paga pelos títulos do Tesouro americano de 10 anos está ao redor de 1,56%, enquanto os papéis de 30 anos pagam juros de 2,27%. Se essas taxas de longo prazo caírem ou permanecerem baixas, haverá um efeito imediato sobre o valor do dólar frente às principais moedas internacionais, inclusive o real brasileiro. Isso porque uma era de juros baixos, possivelmente próximos de zero, tornaria as aplicações nos Estados Unidos menos atrativas, levando a um período prolongado de um dólar enfraquecido.
A postura recente de estímulos monetários por parte de vários bancos centrais, como os do Japão e da zona do euro, aumentou bastante a liquidez internacional, incentivando os investidores a buscar maior taxa de retorno em aplicações de países emergentes, como o Brasil.
Em razão disso, o dólar chegou a cair abaixo de R$ 3,13 neste mês. Se prevalecer a visão de John Williams de juros baixos por um período prolongado e da adoção de novas ferramentas de estímulos, não seria uma surpresa surgir pressão para o dólar cair abaixo de R$ 3,00. Com isso, as expectativas inflacionárias no Brasil poderiam ceder mais rapidamente, abrindo espaço para cortes agressivos da taxa Selic.
18 de agosto de 2016
Fábio Alves, Estadão
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