Balbino, governador da Bahia, quando a gente andava de trem |
SALVADOR – Quando o velho elevador do velhíssimo edifício da Rua da Quitanda, no centro do Rio, parou no escritório de advocacia do ex-governador da Bahia Antonio Balbino, eu já sabia o que ia lhe falar. Passei as quatro horas do voo germinando o “Jornal da Semana”, que ia lançar.
Não conhecia bem Balbino. Ele certamente menos a mim. Mas sempre tive uma admiração enorme pela sua biografia. Dos políticos da Bahia, só Octávio Mangabeira rivalizava com ele. Culto, talentoso, inteligente, formação universal, Balbino foi preparado “para brilhar lá fora”.
Nasceu em 1912 em berço de roça que era também um berço de ouro. O pai fazendeiro em Barreiras, extremo oeste da Bahia. E a mãe irmã de um dos brasileiros mais poderosos de seu tempo: Geraldo Rocha, homem de confiança de Getúlio Vargas, dono dos jornais “A Noite”, “A Nota”, “O Radical”, e o mais próximo amigo no Brasil do ditador argentino Perón.
ALUNO BRILHANTE – Pôs logo o sobrinho querido embaixo do braço. Balbino, moreno queimado, boca gorda, olhos apertados, estudou em Salvador e em 1929 foi para o Rio estudar Direito e trabalhar no jornal do tio, “A Noite”. Aluno brilhante, orador da turma, formou-se em 32 e foi fazer doutorado de Economia na Sorbonne em Paris, em 33 e 34. Voltou e saiu candidato à Constituinte estadual na legenda da oposição, liderada por Octávio Mangabeira, contra a chapa do interventor Juracy Magalhães. Elegeu-se.
Na Assembleia, fez parte da comissão encarregada de elaborar a Constituição do Estado. Getúlio deu o golpe de 37. Balbino foi ser professor, advogado, jornalista no “Diário de Notícias” que dirigiu de 1939 a 42. Professor, ensinava tudo: – Sociologia e Lógica, no pré-curso da Faculdade de Medicina; Finanças, na Faculdade de Direito; e História das Doutrinas Econômicas, na Faculdade de Filosofia.
FAMA DE GÊNIO – Em 45, candidato à Assembléia Nacional Constituinte, pelo pequeno PPS (Partido Popular Sindicalista), perdeu. Em janeiro de 47, já no PSD, elege-se para a Assembléia Constituinte estadual. Em 50, deputado federal. Chega ao Rio com fama de gênio.
Relator do projeto criando a Petrobras, a Lei 2004 afinal aprovada em outubro de 53, quando já era ministro da Educação e Cultura. Em 54, o PSD lhe nega a legenda para governador e lança Pedro Calmon. Balbino, com Juracy, que ganhou o Senado, saiu pelo PTB e UDN e venceu.
Sabia tudo da Bahia, do Brasil e do mundo. Terminado o governo, foi para a rua da Quitanda advogar e dar pareceres Em 1962, elege-se senador.
Estava em Paris na sua morte, em 1992. O Brasil foi frio. Como foi depois no seu centenário, em 2012. Não somos a Europa, que cuida de seus grandes mortos. E Balbino deixou plantada na história política do século passado uma forte presença. Era um homem excepcionalmente inteligente
NA DITADURA – Muitos de nós, que durante a ditadura militar fizemos a resistência, tivemos dele, em instantes duros, cruéis, uma solidariedade silenciosa mas sempre eficiente. Waldir Pires, Mário Lima, Hélio Ramos, eu, tantos outros que voltamos do exílio, saímos da cadeia ou nos livramos de IPMs e processos pela mão sábia e calorosa dele.
Devo-lhe uma absolvição no Superior Tribunal Militar que parecia impossível. E o fim de uma ordem de prisão na Bahia, assinada e já embalada. Ele fazia, depois sorria:
– “Tome juízo. Não os desafie. Eles têm os canhões”.
CAMINHOS ABERTOS – Balbino tem um título que a Bahia lhe deve. Foi ele quem começou a modernização do Estado. Governador em 54, entregou ao grande Rômulo Almeida o planejamento da nova Bahia. Com ele Rômulo criou a Comissão de Planejamento Econômico, da qual nasceram o Centro Industrial de Aratu, o Polo Petroquímico, a Coelba, a Tebasa, a Sabesb. Juracy, Lomanto, ACM, andaram caminhos abertos por Balbino e Rômulo.
Ministro da Indústria e Comércio de Jango, com o golpe de 1964 entrou para o MDB até 1971, quando voltou para a advocacia, no Rio, criando uma das mais poderosas bancas de advocacia do País.
Vai demorar muito para a Bahia fazer outro Balbino.
LEWANDOWSKI – O professor e economista baiano Helio Duque, tantas vezes iluminador desta coluna, mais uma vez acende a luz:
– O Conselho Nacional da Justiça, fiscalizador dos tribunais superiores na administração da Justiça, é presidido pelo ministro Lewandowski, do STF. Decisão surpreendente, em reunião do seu conselho, estabeleceu polêmica que desprestigia o Judiciário brasileiro. O ministro Lewandowski defendeu que juízes, desembargadores e membros dos tribunais superiores, ao proferir palestras promovidas por entidades privadas, ficam desobrigados de informar o valor recebido. De acordo com o jornal “O Estado de S.Paulo” (13-7-2016), teria afirmado: “Não somos obrigados a revelar quanto recebemos nas atividades privadas”.
Data vênia, Excelência. A Constituição, no artigo 95, determina que aos juízes é vedado receber, a qualquer título ou pretexto, auxilio ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, A atividade extra permitida pela Lei Orgânica é só o magistério superior.
31 de julho de 2016
Sebastião Nery
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