O PT sofre uma afecção grave, cujo sintoma é a tendência à alienação da realidade, substituída pela visão de um mundo paralelo que melhor se conforma a seus anseios e conveniências. Uma demonstração contundente desse comportamento mórbido foi a reunião de um tal “conselho consultivo” da presidência do PT realizada na manhã de segunda-feira num hotel em São Paulo. Lula e Rui Falcão, presidente nacional da legenda, não chegaram exatamente, pelo que se apurou, a consultar os consultores sobre nada, mas explicaram tudo em que devem acreditar a respeito dos problemas políticos e econômicos que o Brasil enfrenta, e como resolvê-los.
Fora do roteiro previamente imaginado por Falcão para o encontro ficou apenas a questão da “tarefa muito especial” da “montagem de uma poderosa bateria de ações, recursos, debates e mobilizações de solidariedade a Lula”, vítima da “escalada de ataques” da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e da “mídia golpista”. Mas Falcão, que anunciara esse tema da pauta uma hora antes do encontro, não deve ter consultado previamente o chefe, pois logo após a reunião se desmentiu: “Isso não ocorreu. Isso não foi mencionado. Isso não estava na pauta”. De acordo com participantes do encontro, Lula foi categórico sobre esse assunto: “Não aguento mais falar disso”. Reação tipicamente nervosa, reveladora de um quadro de óbvia disfunção. Afinal, ele não consegue dar explicações razoáveis e consistentes a respeito do sítio de Atibaia que está à sua disposição – e por isso se exaspera.
Mas tem imaginação para ditar cátedra sobre como resolver a crise econômica – embora sobre a crise política e, sobretudo, moral em que a tigrada mergulhou o País ele prefira nada falar. Chegou até a dar um prazo para que o governo de sua pupila Dilma Rousseff comece a apresentar resultados positivos na economia: o fim deste semestre. Se isso não acontecer, previu o Oráculo petista, a partir do segundo semestre os indicadores econômicos e sociais, que avançaram durante sua gestão, poderão regredir aos índices do final do governo FHC: “Aí não vai ter povo para defender”.
Sobre a questão econômica foi apresentado durante a reunião um documento, obviamente sacramentado por Lula, que cobra do governo a adoção de medidas para a retomada do crescimento econômico. Os termos desse documento são um magnífico exemplo do voluntarismo petista, que parte do pressuposto de que tudo o que precisa ser feito é óbvio e depende exclusivamente de vontade política. Ou seja, se até agora Dilma Rousseff não implementou essas medidas foi porque não quis.
Afirma o documento petista: “Não se pode aguardar mais para inaugurar medidas que retomem o crescimento econômico sustentável, com inclusão social, geração de empregos, distribuição de renda, controle da inflação, melhoria dos serviços públicos, investimentos em infraestrutura”. Tudo muito simples e fácil. Afinal, quem não é a favor de tudo isso, e ainda da paz mundial, da descoberta da cura do câncer, do extermínio do Aedes aegypti, da extinção da fome no planeta, de fins de semana ensolarados...
A triste realidade, que a morbidez em estado avançado impede os petistas de enxergar, é que durante os oito anos de Lula nada foi feito de concreto para estimular e garantir um “crescimento econômico sustentável”. Em vez disso, torrou-se o dinheiro público, por exemplo, em programas socialmente necessários, mas equivocados, porque sem o amparo de medidas econômicas que lhes garantissem sustentabilidade no longo prazo. É claro, e até Lula sabe disso hoje, que o primeiro mandato de Dilma foi catastrófico porque, embalado pelo voluntarismo estatista da “nova matriz econômica”, foi incapaz de criar mecanismos de proteção da economia brasileira, de modo especial a produção industrial, das ameaças de uma conjuntura adversa. O resultado dessa incúria se colhe agora. Mas o lulopetismo, obcecado pela ideia de sobreviver numa realidade paralela, é incapaz de fazer autocrítica e propor medidas renovadoras, reestruturantes, para o governo que elegeu. Insiste em continuar tocando música para os ouvidos de eleitores que, na verdade, já perdeu.
22 de fevereiro de 2016
Estadão
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