"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

A MIGRAÇÃO NO MEDITERRÂNEO E O RADICALISMO ISLÂMICO


Com toda certeza, a terceira guerra mundial já está em cu




Quanto mais próximo estiver de sua origem, de seu ponto de partida, mais um movimento religioso se mantém fiel à ideia que o fez nascer. Se voltarmos aos séculos I e II, encontraremos o cristianismo passando pelas catacumbas de Roma, o cerco em sítios ermos às margens do Mediterrâneo e, sobretudo, tocado pelo martírio que enfrentava nas arenas do Império. Coerentemente com a trajetória de Cristo, que foi martirizado na cruz, o fiel cristão entendia que para seguir o caminho mais reto, aquele que leva ao reino do céu, ao nirvana cristão, ele deveria passar pelas pegadas do martírio, do sofrimento mais cruel. Martirizados foram Pedro e Paulo sinalizando o fim do bom cristão.
A história oficial que chegou até nós, depois de séculos influenciada pelo Vaticano, fez dos romanos apenas carrascos. Entretanto, o Império Romano tinha outras preocupações em relação a quem vinha de Israel, calçando sandálias e pregando pobreza.
A tradição de Roma não era certamente a perseguição religiosa, e os cristãos eram minoria desarmada e inócua no século I. Roma era a capital do sistema de Estado mais amplo e mais bem-estruturado de todos os tempos. Seu modelo republicano foi roubado dos gregos, que, no seu melhor momento, se organizaram em cidades repúblicas, autônomas, com população média de 20 mil habitantes – seguindo o mito da Cidade do Sol. A cidade helênica era estruturada para ser autossuficiente e soberana, com seu sistema de defesa, concedendo a todos a igualdade de direitos, com os melhores cidadãos chamados para governar e, os mais velhos, para legislar, organizados em assembleia.
AMPLIANDO A REPÚBLICA
Roma ampliou o sistema de república e a estendeu a um território de milhões de pessoas de origens e culturas variadas num raio de 3 mil quilômetros de seu centro. A firmeza romana se ancorava, entretanto, na tolerância, cultural e religiosa. Deixar viver era a forma de assimilar. Roma tinha templos e imagens de tudo o que se venerava e adorava no Império.
Cristo foi crucificado numa colônia por decisão dos judeus quando Pilatos, vencido, lavou as mãos. Roma era tolerante para se manter como “caput mundi” sem resvalar em polêmicas religiosas. O sincretismo permitiu encontrar a saída às diferenças. E o cristianismo, em seguida, mais que substituir tradições, cristianizou a Páscoa, o Natal e outras antigas festividades.
O cristão dos primeiros dois séculos após a morte de Cristo não era apegado aos bens materiais, os desprezava, seguia estritamente o que Cristo ensinou por meio de seus apóstolos e discípulos: “Faça da pedra que encontrar o seu travesseiro”. Ou ainda: “Dai a César o que é de César, e a Deus o que a Ele pertence…”. Os primeiros cristãos almejavam o martírio como forma de serem fiéis, procuravam esse fim, e o martírio, em muitos casos, os gratificava. Os romanos nunca tinham se dado a um fenômeno de aspirantes ao martírio.
A martirização tinha como prêmio o paraíso e ainda era o exemplo recente de Pedro e Paulo. A presença estaminal do Cristo Redentor, morto há poucas décadas, pulsava nas veias dos fiéis.
FILÓSOFOS LAVAM AS MÃOS…
Adriano, Antonino e Marco Aurélio, os imperadores filósofos, apesar de serem contrários à perseguição e de se esquivarem das arenas, não conseguiam contrastar o desejo dos mártires e a tendência da crueldade praticada nas arenas. Os imperadores filósofos também lavavam as mãos.
A superação da dor se realizava em êxtases que precediam a união com o Supremo, e os mártires, mesmo sendo recortados e queimados, pareciam não se importar. Sentavam-se em cadeiras de ferro incandescentes ou deixavam-se mutilar impassíveis como faquires.
Quando a religião cristã se alastrou no terceiro século, desequilibrou o sistema e determinou sua queda. O romano guerreiro foi contido pelo romano que acreditava no perdão.
Roma minguou de 1 milhão para 25 mil habitantes. Embora o cristianismo fizesse ruir o Império, ele aproveitou sua organização para que a Igreja Vaticana pudesse se expandir como um império religioso.
A ideia que a renúncia à vida levaria ao paraíso e melhoraria o mundo ressurge 20 séculos depois. A intensidade (fanatismo) que marcou o cristianismo primordial foi revivida no islamismo radicalizado do Estado Islâmico, o que leva um contingente numeroso a banalizar a importância da vida e a exaltar a morte e o martírio por uma causa.
O ISLAMISMO AVANÇA
Como o cristianismo cimentou seus alicerces com o sangue dos mártires, os mártires islâmicos atraem um número crescente e avassalador de seguidores fanáticos. A relativização da importância da vida determina o abandono da “razão comum” e promove o extermínio como mérito.
A declaração de uma possível terceira guerra mundial se deu em 11/09/2001, sem delimitar fronteiras e provocando êxodos, migrações e horrores que assombram todos os continentes. A pressão sobre a Europa, laboratório da civilização ocidental, se faz insuportável e nos deixa imaginar uma escalada islâmica, até ajoelhar, em poucas décadas, o continente inteiro.
Provavelmente, faltou no século XX entender que era necessária uma distribuição de oportunidades em países da mesma bacia mediterrânea. A proximidade ficou desproporcional à diversidade de condições e de culturas. O estrago está aí.
A humanidade parece que ainda vai sofrer muito até encontrar uma solução.

22 de fevereiro de 2016
Vittorio Medioli
O Tempo

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