A música “Brasil”, composta por Cazuza e George Israel, é considerada uma declaração de amor ao país. Surgiu na mesma linha de outro sucesso do rock nacional, “Que país é este?”, de autoria de Renato Russo. Ambas são verdadeiros hinos das manifestações populares.
À época, acreditava-se que a maior ameaça ao Brasil era o imperialismo americano. Hoje, sabe-se que o nosso maior inimigo é a corrupção. A ótica mudou, mas a indignação é a mesma: “Brasil, mostra a sua cara, quero ver quem paga pra gente ficar assim...”
Lembrei-me das canções ao perceber que o governo Dilma tem, no momento, duas enormes preocupações: como livrar da inidoneidade o clube de empreiteiras corruptas flagradas na Lava-Jato e como salvar a si próprio da rejeição das contas de 2014.
No primeiro caso, o “acordão de leniência” (ou conveniência) negociado na Controladoria-Geral da União (CGU) — que atravessa e prejudica as investigações em curso — já começou a dar com os burros n'água. Os próprios advogados das empresas perceberam a sua inutilidade se todas as pontas não fossem amarradas. O arranjo com a CGU não elimina a possibilidade de as empreiteiras serem denunciadas pelo Ministério Público Federal, que, de fato e de direito, está à frente das investigações. Além disso, todos os procuradores da força-tarefa que apuram os desvios da Lava- Jato assinaram documento manifestando-se contra a forma como tais acordos foram concebidos pela CGU. Agora, como o plano inicial murchou, alguns deputados federais irão propor mudanças na Lei Anticorrupção. Será a Lei Pró-Corrupção?
O argumento que o “país irá parar” se as empresas forem punidas é mera falácia. No ano passado, as empreiteiras envolvidas na Lava-Jato representaram apenas 6,3% dos investimentos da administração direta da União. Nos canteiros das empresas estatais, quem toca efetivamente as obras são, em sua maioria, empresas terceirizadas, que continuarão a prestar serviços às eventuais substitutas. Ademais, o que gera empregos são as obras e não as empreiteiras, que, mesmo declaradas inidôneas, terão os contratos mantidos, tal como acontece com a Delta Construções, que recebeu R$ 134 milhões em 2014. Na verdade, a ânsia de proteger as empresas decorre é da promiscuidade que elas mantêm — há anos e há vários governos — com políticos e autoridades.
Nas eleições de 2014, por exemplo, as empreiteiras envolvidas doaram R$ 400 milhões, inclusive a 15 parlamentares que integram a CPI da Petrobras, enquanto receberam R$ 3,6 bilhões da União. A generosa Camargo Corrêa já havia doado R$ 3 milhões ao Instituto Lula e pago R$ 1,5 milhão a uma empresa do ex-presidente por quatro palestras. Na semana passada, diplomata sugeriu tornar secretos os documentos solicitados por jornalista que, em uma matéria anterior, relacionou os negócios da Odebrecht a Lula. Aliás, é no mínimo cuspir no prato em que está comendo o petista criticar “as elites” enquanto parte delas o patrocina.
Em relação às contas de 2014, o relatório técnico que embasará a decisão dos ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) mostra que as diversas pedaladas — para falsificar os resultados fiscais e esconder no ano das eleições o rombo que já existia nas contas públicas — somaram R$ 37,1 bilhões. A meu ver, além de crime contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, deveria ser crime eleitoral.
Para que o país mostre a sua cara, é essencial que as instituições mostrem as suas faces. A Polícia Federal e o Ministério Público têm demonstrado autonomia e aversão à leniência e aos conchavos. Nesta semana, o TCU também poderá cumprir o seu papel e honrar a sua história. Em 1893, a Corte considerou ilegal uma nomeação feita pelo então Presidente da República. Indignado, Floriano Peixoto mandou redigir decretos que retirariam a competência do colegiado para impugnar despesas ilegais. O ministro da Fazenda, Serzedelo Corrêa, que deveria redigir os textos, demitiu-se do cargo. O tribunal saiu fortalecido no seu primeiro embate.
Amanhã, às 9h, o tribunal terá nova oportunidade para reafirmar que não cede às pressões do Executivo. Afinal, se a Corte tiver independência apenas para punir prefeitos corruptos, será melhor fechar as portas. Sob o ponto de vista técnico, não há como aprovar contas com irregularidades tão flagrantes. Ao contrário do que diz o governo, a perda da credibilidade do país advém do crime e não da condenação dos criminosos. Plagiando Israel e Cazuza, a frase atual é: TCU, mostra a sua cara!
Lembrei-me das canções ao perceber que o governo Dilma tem, no momento, duas enormes preocupações: como livrar da inidoneidade o clube de empreiteiras corruptas flagradas na Lava-Jato e como salvar a si próprio da rejeição das contas de 2014.
No primeiro caso, o “acordão de leniência” (ou conveniência) negociado na Controladoria-Geral da União (CGU) — que atravessa e prejudica as investigações em curso — já começou a dar com os burros n'água. Os próprios advogados das empresas perceberam a sua inutilidade se todas as pontas não fossem amarradas. O arranjo com a CGU não elimina a possibilidade de as empreiteiras serem denunciadas pelo Ministério Público Federal, que, de fato e de direito, está à frente das investigações. Além disso, todos os procuradores da força-tarefa que apuram os desvios da Lava- Jato assinaram documento manifestando-se contra a forma como tais acordos foram concebidos pela CGU. Agora, como o plano inicial murchou, alguns deputados federais irão propor mudanças na Lei Anticorrupção. Será a Lei Pró-Corrupção?
O argumento que o “país irá parar” se as empresas forem punidas é mera falácia. No ano passado, as empreiteiras envolvidas na Lava-Jato representaram apenas 6,3% dos investimentos da administração direta da União. Nos canteiros das empresas estatais, quem toca efetivamente as obras são, em sua maioria, empresas terceirizadas, que continuarão a prestar serviços às eventuais substitutas. Ademais, o que gera empregos são as obras e não as empreiteiras, que, mesmo declaradas inidôneas, terão os contratos mantidos, tal como acontece com a Delta Construções, que recebeu R$ 134 milhões em 2014. Na verdade, a ânsia de proteger as empresas decorre é da promiscuidade que elas mantêm — há anos e há vários governos — com políticos e autoridades.
Nas eleições de 2014, por exemplo, as empreiteiras envolvidas doaram R$ 400 milhões, inclusive a 15 parlamentares que integram a CPI da Petrobras, enquanto receberam R$ 3,6 bilhões da União. A generosa Camargo Corrêa já havia doado R$ 3 milhões ao Instituto Lula e pago R$ 1,5 milhão a uma empresa do ex-presidente por quatro palestras. Na semana passada, diplomata sugeriu tornar secretos os documentos solicitados por jornalista que, em uma matéria anterior, relacionou os negócios da Odebrecht a Lula. Aliás, é no mínimo cuspir no prato em que está comendo o petista criticar “as elites” enquanto parte delas o patrocina.
Em relação às contas de 2014, o relatório técnico que embasará a decisão dos ministros do Tribunal de Contas da União (TCU) mostra que as diversas pedaladas — para falsificar os resultados fiscais e esconder no ano das eleições o rombo que já existia nas contas públicas — somaram R$ 37,1 bilhões. A meu ver, além de crime contra a Lei de Responsabilidade Fiscal, deveria ser crime eleitoral.
Para que o país mostre a sua cara, é essencial que as instituições mostrem as suas faces. A Polícia Federal e o Ministério Público têm demonstrado autonomia e aversão à leniência e aos conchavos. Nesta semana, o TCU também poderá cumprir o seu papel e honrar a sua história. Em 1893, a Corte considerou ilegal uma nomeação feita pelo então Presidente da República. Indignado, Floriano Peixoto mandou redigir decretos que retirariam a competência do colegiado para impugnar despesas ilegais. O ministro da Fazenda, Serzedelo Corrêa, que deveria redigir os textos, demitiu-se do cargo. O tribunal saiu fortalecido no seu primeiro embate.
Amanhã, às 9h, o tribunal terá nova oportunidade para reafirmar que não cede às pressões do Executivo. Afinal, se a Corte tiver independência apenas para punir prefeitos corruptos, será melhor fechar as portas. Sob o ponto de vista técnico, não há como aprovar contas com irregularidades tão flagrantes. Ao contrário do que diz o governo, a perda da credibilidade do país advém do crime e não da condenação dos criminosos. Plagiando Israel e Cazuza, a frase atual é: TCU, mostra a sua cara!
17 de junho de 2015
Gil Catello Branco
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