Lula agora se movimenta para frear os ataques do PT a Joaquim Levy. Quer que o foco do partido, a ser definido no congresso que começará no próximo dia 11, seja uma “agenda de desenvolvimento”, algo que “crie esperança”. É um jogo de palavras, mas também uma manobra tática e um retrato das oscilações do ex-presidente. Depois de ter cacifado o nome de Levy para a Fazenda, passou parte do tempo fuzilando o ajuste fiscal para, agora, em nova reviravolta, arrefecer a crítica à política econômica.
Lula não quer ficar mal na fita, carregar a fama de ser responsável pela (re)eleição de Dilma e muito menos aparecer como incentivador da passagem do PT para a oposição ao governo. Talvez pense em desgastar o governo, cozinhá-lo em fogo brando, faturando caso decole, mas não se comprometendo demais caso fracasse. Em suma, bater sim em Levy e na política de ajuste, mas não criar atrito excessivo com Dilma. E precisa que o PT o acompanhe nesta operação.
Internamente, Lula busca reforçar sua segunda pele: a imagem de quem sempre está bem com todos e a todos comanda. Sua liderança no PT passa por aí. Flutua sobre grupos e correntes, dialogando com a esquerda e a direita, sem agradar inteiramente a ninguém, mas sempre amortecendo toda crítica a seu protagonismo centralizador.
UM CONDOMÍNIO…
Fora do partido, ou seja, entre os diversos grupos e interesses sociais, ocorre o mesmo: foi assim em seus oito anos como presidente, durante os quais converteu a máquina governamental em um imponente “condomínio”, para empregar expressão sempre destacada pelo cientista político Luiz Werneck Vianna.
Hoje ficou tudo mais difícil. A manobra é delicada e perigosa. Há petistas desconfiados dela, que revela um Lula dúplice, moldado segundo circunstâncias, oportunidades e planos pessoais. Personagem que, em política, é mais problema que solução.
O ex-presidente precisa de um PT minimamente unido. Sabe que a solidariedade partidária será importante caso cresçam contra ele as acusações de envolvimento nas negociatas da Petrobrás, ou caso o mensalão volte a ser esmiuçado. O fracasso do governo Dilma inevitavelmente cairá em sua conta e nada será melhor do que emergir como aquele que conseguiu dar o devido suporte à conduta governamental. De tabela, torce e age para que o partido não abrace a causa da autocrítica e da renovação.
GORDURA PARA QUEIMAR
O PT não está acabando, à beira do precipício. Tem muita gordura para queimar e uma importante folha de serviços à democracia brasileira, que o legitima e sustenta. Mas os antagonismos internos cresceram, há mais tensões no ar, o próprio partido alterou sua configuração e vive hoje uma nova situação. Sente que precisa sacudir seus andrajos e recuperar a alma originária. Tudo ficou muito mais complexo. Nem sequer a anunciada filiação de mais 200 mil cidadãos ao PT deixa o panorama mais claro, ou menos turbulento.
Lula quer o céu e a terra. Continua com o instinto político de sobrevivência ativado. No entanto, ele não é todo o PT. Terá de gastar muita saliva para dobrar as correntes partidárias e permanecer dando as cartas na “sociedade civil” petista. Como todo organismo que vive e respira, o PT terá de processar seus conflitos e reconstruir sua vontade, sua identidade.
12 de junho de 2015
Marco Aurélio Nogueira
Estadão
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