"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

INVOLUÇÃO VENEZUELANA


Com os poderes que lhe concede a Lei Habilitante, Maduro poderá tornar realidade o desejo de Chávez de levar o país ao mesmo mar de felicidade em que navega Cuba

O regime bolivariano se debate entre a farsa e o dramatismo heroico. Algumas de suas atuações são hilárias; outras, causam tristeza. As grosserias espetaculares e a retórica explicativa correspondente parecem sair de uma ópera-bufa. Por este motivo, a convulsionada retórica da atualidade venezuelana geralmente traz à mente o que se dizia do decadente Império Austro-Húngaro: “A situação é grave, mas não é séria.”

O presidente Nicolás Maduro anunciou a criação de um vice-ministério ao qual se confiaria a transcedental missão de conseguir a suprema felicidade do povo venezuelano. Semelhante iniciativa burocrática tem sua origem numa tradução inadequada de “the greatest happiness for the greater number” (“a maior felicidade para o maior número de pessoas”), o critério sugerido por Bentham para avaliar as políticas públicas, doutrina que se conhece como utilitarismo. Jeremy Bentham (1748-1832) foi um filósofo britânico de ideias avançadas, que teve grande influência sobre as reformas administrativas do Século XIX. Sua concepção política equivale à antítese da dos ideólogos do socialismo do Século XXI.

As declarações governamentais acerca do caos cambial oferecem um exemplo adicional de incoerência. Enquanto um funcionário afirma que o mercado paralelo de divisas é uma ficção, outro se compromete a pulverizá-lo. A Venezuela administra um sistema de controle de câmbio. O poder de compra da moeda nacional está em queda livre como consequência de um manejo econômico inábil. O mercado paralelo de câmbio reflete a perda da confiança na política do governo. O preço em bolívares de um dólar no mercado paralelo é cerca de dez vezes maior do que estabelece a taxa de câmbio oficial.

A inflação é um problema que escapou ao controle das autoridades. Num mundo em que a tendência dos índices de preços é de queda, a Venezuela registra um ritmo de inflação anual de 54%. A cifra correspondente ao índice de preços dos alimentos é de 70%. É difícil que se possa modificar a situação enquanto persistir a prática de financiar o gasto público descontrolado com emissão monetária.

O governo declarou que o setor privado e a oposição são os causadores da inflação. Como resposta a uma suposta guerra econômica, Maduro pretende controlar os preços por meio da força pública (polícia). Uma cadeia de eletrodomésticos sofreu intervenção manu militari. Com grande aparato, seus estoques têm sido oferecidos à venda com grandes descontos. Os administradores da empresa foram presos.

Uma interpretação benévola deste episódio seria que se trata de uma manobra desesperada para se contrapor ao mal-estar da opinião pública diante do desabastecimento, da carestia e das falhas frequentes no sistema de eletricidade, causas de apagões.

Mas, se Maduro utilizar os poderes que lhe concede a Lei Habilitante para arruinar as empresas e impor um sistema econômico do tipo soviético, estaria tornando realidade o desejo de Hugo Chávez de levar a Venezuela ao mesmo mar de felicidade em que navega Cuba.

 
25 de novembro de 2013
Rodrigo Botero Montoya, O Globo

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