"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

A PETROBRAS E AS MANOBRAS CONTÁBEIS


A Petrobras, que já foi orgulho dos brasileiros, passa por um momento delicado, com os seus indicadores financeiros e de produção em declínio. Os dados, em sua franqueza matemática, invariavelmente constrastam com a grandiloquência, o ufanismo e a fantasia que caracterizam o discurso das autoridades responsáveis pela área, a ponto de hoje ser, talvez, o exemplo mais expressivo da crescente divergência entre a realidade econômica e a propaganda oficial.
Os números, as informações e as declarações constantes do balanço do terceiro trimestre da Petrobras, divulgado no dia 25 de outubro, confirmam a divergência.
O resultado operacional e o lucro da empresa continuam declinando. O lucro líquido caiu de R$ 6,2 bilhões, no 2º trimestre, para R$ 3,4 bilhões, no 3º. Já a produção sofreu uma queda de 1%, se tomarmos o período de janeiro a setembro de 2013 em comparação com igual período de 2012.
Seria muito fácil simplificar as coisas e jogar toda a culpa pelos maus resultados da Petrobras no desastrado controle de preços que o governo vem impondo à empresa. Essa seria a pior maneira de interpretar os números, pois passa a impressão que todos os problemas de gestão que corroem a estatal não existem, de modo que bastaria suspender a política de controle de preços de derivados que a companhia atingiria imediatamente a excelência.
Nada mais falso. Uma leitura atenciosa dos dados do balanço indica que o controle de preços é apenas um dos problemas da empresa.
Quando assumiu, a presidente Graça Foster impôs como uma das principais metas a redução dos custos e os ganhos de eficiência. Esses objetivos não estão sendo alcançados. Os dados são eloquentes.
O conceito mais importante para verificar a evolução dos custos é o chamado lifting cost. Esse montante, que representa a quantia de toda a etapa de extração até que o petróleo esteja disponível para ser transportado para refino ou exportação da Petrobras, aumentou em 8% de janeiro a setembro de 2012 e de 2013. Saltou de US$ 13,79 para US$ 14,71. É bom lembrar que o dólar, no período, teve grande valorização, o que só piora o quadro, uma vez que uma parte dos gastos da empresa, como mão-de-obra, são denominados em reais. É preciso que se explique esse aumento galopante.
A produção não cresce, os resultados se deterioram e, à moda de bode expiatório, se lança toda a culpa na política equivocada de controle de preços do governo. À luz desses dados, percebe-se que o buraco da Petrobras é mais embaixo, talvez no pré-sal.
Nos comentários ao Balanço dirigidos pela Presidente da empresa aos investidores e acionistas, encontra-se, entre outras, a seguinte justificação para a incapacidade de expandir a produção no 3º trimestre: a dificuldade de contratação no Brasil de navios nos anos de 2010 e 2011. Em 2012, a diretoria autorizou a contratação de 10 navios, sendo oito no exterior e dois no País.
A linguagem é um tanto cifrada, mas tudo leva a crer que se proibiu ou se cerceou a encomenda desses navios no exterior até 2012. Se for assim, estamos diante de mais um caso de falso nacionalismo, da prevalência de posições retrógradas a interferir na gestão da Petrobras e que, antes de contribuir para o enriquecimento do Brasil, travam seu desenvolvimento e prosperidade.
Essa declaração faz crer que teria havido alguma proibição ou restrição para a encomenda ou compra desses navios no exterior até o ano de 2012 e, só então, diante da acumulação, por pelo menos dois anos de prejuízos gerados pela medida, foi autorizada a contratação no exterior dessas embarcações.
Seria preciso que a presidente da Petrobras esclarecesse essa questão. De onde surgiu essa restrição? Da própria Petrobras ou do governo? Onde ela estava formalizada? Qual o rombo no balanço de pagamentos provocado na conta petróleo e na balança comercial brasileira somente por essa restrição? Quem determinou essa restrição e, portanto, é o responsável por atrasar em anos o aumento da produção de petróleo no Brasil? É preciso esclarecer quem promoveu essa patriotada.
Outro ponto a ser apontado é a estranha simultaneidade entre a publicação do balanço do 3º trimestre e a divulgação de fato relevante pela empresa relativo à nova metodologia de preços a ser utilizada pela Petrobras.
Diante dos desastrosos resultados operacionais e financeiros do balanço do 3º trimestre, a diretoria da empresa resolve tirar um coelho da cartola e lança sobre o mercado esse fato novo, sem sequer ter obtido autorização prévia do acionista controlador, a União, para sua implantação. Logo em seguida, a União, por meio do presidente do Conselho de Administração, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, desautoriza publicamente a iniciativa, alertando que a tal metodologia se resume a estudos iniciais sujeitos ao crivo do próprio Conselho, que só teria tomado conhecimento da proposta naquele mesmo dia! Diante disso, a CVM se mobilizou e requereu esclarecimentos adicionais.
É importante sublinhar esse ponto: uma decisão estratégica para o fluxo de caixa da companhia é divulgada como fato relevante sem que o Conselho tivesse tomado conhecimento! A que ponto chegou a governança do setor de petróleo no País? É uma barafunda!
Estranhamente, esse lacônico e singelo comunicado sobre a possível adoção de nova metodologia ao conhecimento do Conselho da empresa teve o condão de elevar as cotações das ações preferenciais em quase 8% no dia seguinte à publicação do balanço, mesmo à vista dos resultados decepcionantes entregues pela direção da empresa.
Logo depois, o Sr. Almir Guilherme Barbassa, Diretor Financeiro e de Relações com Investidores da Petrobras, divulgou aditamento ao fato relevante, esclareceu pontos do que seria a nova metodologia de preços, mas afirmou que a decisão final será no dia 22 de novembro. Fica a pergunta: o que houve foi uma genuína reação favorável do mercado ou poderia ter havido movimentação de compra de grandes agentes tais como fundos de pensão de estatais ou fundos de investimento administrados por bancos públicos?
Agora mesmo estamos assistindo a uma guerra de bastidores. A presidente da empresa dá uma declaração aqui, o ministro da Fazenda rebate dali, e assim a vai seguindo a nau dos insensatos.
Assim, a política de preços de uma empresa estatal independente transforma-se em questão de Estado, com direito a toda sorte de intrigas palacianas. Talvez, em breve, as reuniões ministeriais no Brasil venham a ter como tema único o controle de preços, a exemplo do que vem sendo feito no setor de energia elétrica e transporte urbano, enquanto a produção claudica, a produtividade despenca e a inflação não dá sinais de trégua.
Esse episódio da nova metodologia de reajuste é só mais um sinal da regressão econômica e institucional promovida pelos sucessivos governos do Partido dos Trabalhadores.
Diante de tudo isso, o balanço da Petrobras, que é um documento importantíssimo, pois expressa não apenas a grave situação em que se encontra, mas também sintetiza o que a desastrada intervenção governamental na economia tem causado ao País: aumento da inflação, déficit na balança comercial, deterioração das contas públicas, queda na produtividade, elevação de custos, fragilização das empresas estatais.
E mais importante: o propalado nacionalismo que tem inspirado essas ações tem trazido, na verdade, enormes prejuízos aos interesses do Brasil e dos brasileiros. A Petrobras é só a vítima mais evidente.
 
13 de novembro de 2013
Aloysio Nunes Ferreira é Senador (PSDB-SP).

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