"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 15 de setembro de 2013

ENTREVISTA: AFFONSO CELSO PASTORE

Affonso Celso Pastore: "Política atual acentua a ineficiência da economia"
 
Governo compromete os avanços de reformas anteriores, diz Pastore
FOLHA DE SÃO PAULO

Na entrevista, concedida na última quarta-feira em São Paulo, o ex-presidente do Banco Central Affonso Celso Pastore diz que o ano que vem deve ser de mais gastos do governo, mais inflação e mais pressão pela alta do dólar.
 
Folha - Estamos condenados, pela política econômica, a voltar a um crescimento de 3%, com uma inflação em 6%?
Affonso Celso Pastore - Não. O Brasil não está "condenado", porque cometeu algum pecado, a ter que crescer sempre a 2%, 2,5%. Também não pode crescer 6%, não há mão de obra suficiente. Há uma vedação demográfica.
De 2002 para cá, a taxa de ocupação subiu, o desemprego caiu. Agora há um estoque muito menor de gente voluntariamente fora do mercado de trabalho. Caiu na margem a contribuição do crescimento populacional para a expansão da economia.
O segundo ponto é que a contribuição da produtividade total dos fatores no Brasil vem diminuindo.
 
É ela o que mais contribui para o crescimento, não?
Sim, embora você precise também de acumulação de capital. O Brasil, durante o início do governo militar, teve um conjunto de reformas que gerou um período de alta elevação de produtividade nos anos subsequentes, o chamado "milagre econômico".
Depois, houve um segundo ciclo, que começou com a abertura da economia no governo Collor, passou pelo ciclo de reforma monetária do governo FHC, pela Lei de Responsabilidade Fiscal e pelo período de reformas do primeiro governo Lula.
Esses são exemplos de reformas que realmente aumentaram a eficiência, aumentaram a produtividade.
Mas o impulso dessas reformas está morrendo, porque nós estamos virando isso de cabeça para baixo. Em vez de acentuar a ida para a eficiência, estamos acentuando a ida para ineficiência.
 
Um dos argumentos do governo é que as licitações vão dar esse ganho de produtividade porque, ao melhorar a infraestrutura, vão baixar o custo.
Eu não tenho dúvidas de que a infraestrutura é absolutamente fundamental para gerar tudo isso. Agora deixe-me falar um pouco sobre a forma como estão sendo conduzidas: o governo não tem dinheiro, então chama o setor privado. Mas ele diz "você tem que dar um passo aqui, outro passo para cá, você não pode sair desse círculo".
Para elevar a TIR [taxa interna de retorno, medida de rentabilidade de um investimento], o BNDES alavanca com 80%, 90% de financiamento, baixa o custo de capital. Mas isso vira aumento de dívida pública. E tem um subsídio aqui dentro, além de você estar aumentando a dívida bruta para fazer o gasto.
Não precisava pôr o BNDES para financiar a infraestrutura se você aceitasse uma TIR um pouco mais alta.
Aqui entra a filosofia do processo: tenho que ficar com o pedágio baixo porque quem usa a estrada é o cara que vota em mim. Se eu cobrar dele na forma de custo da dívida, ele não vai nem perceber. Vai dizer que a culpa é dos banqueiros. Então, eu baixo a TIR, baixo o pedágio, dou dinheiro para o BNDES, aumento a dívida bruta. Isso gera uma carga sobre a sociedade inteira, mas o eleitor está defendido.
A forma como está sendo feita não é a forma correta. Desculpe, é correta para quem tem o objetivo político de se eleger e de usar esse tipo de instrumento para ficar no poder. Mas não do ponto de vista econômico.
 
O papel do BNDES na sua visão está desvirtuado?
O BNDES não precisava ir ao extremo que está indo.
 
O sr. se lembra de algum outro momento da história em que o BNDES tivesse sido usado...
Isso aí? Mas nunca!
 
Esse tipo de medida é fruto de um projeto político ou se deve à convicção de que é um modelo que pode levar ao desenvolvimento do país?
As duas coisas. O Lula tinha o mesmo objetivo que a Dilma. O PT tem um projeto de poder para muitas décadas. A Dilma continua no mesmo projeto. Mas o Lula não teve dúvidas em pegar um banqueiro reputado [Henrique Meirelles] e colocar no Banco Central, em escolher um ministro da Fazenda que não levou nenhum economista do PT para trabalhar com ele.
O Antonio Palocci tinha uma característica básica: ele ouvia as pessoas. Ouvia as críticas e não as tomava pessoalmente. Era capaz de processar aquela informação.
O Lula tinha pragmatismo. Tinha um projeto de poder, mas não tinha vedação ideológica.
Agora compara o atual ministro da Fazenda com isso o que descrevi sobre o Palocci...
 
Mas foi o próprio Lula que escolheu o atual ministro...
É, sumiu o pragmatismo. O projeto de poder continua, mas aquele negócio de usar a economia de mercado por conveniência do projeto político mudou. Agora você quer usar o social-desenvolvimentismo. Quer dizer, tem um componente ideológico agora muito maior.
 
E qual o cenário para 2014?
Está para nascer o candidato que não aumenta gasto público em um ano de eleição. Acho que o superavit primário [economia do governo para pagar juros da dívida] vai para baixo. Acho que essas transferências para o BNDES e para a Caixa continuam. Acho que a inflação fica alta, vai sacrificar a Petrobras, vai sacrificar a energia elétrica para não repassar tudo para o preço.
Há uma pressão que está aumentando sobre o câmbio. Estamos intervindo um caminhão no mercado de câmbio e ainda assim ele está em R$ 2,30. O Banco Central está vendendo muito, algum sucesso ele tem. Mas isso mostra a força que tem para depreciar o real.
 
E o que acontece com quem herdar esse abacaxi em 2015?
Descasca e, se não estiver podre, come. O Brasil já pegou abacaxis complicados no passado. Alguém vai ter que suar sangue, suor e lágrimas para consertar isso. Mas tudo é consertável.
 
Há algum outro ponto com o qual o sr. esteja pessoalmente preocupado no momento?
Estou preocupado com o São Paulo Futebol Clube (risos).
 
 
15 de setembro de 2013

Nenhum comentário:

Postar um comentário