Chesf leva eólicas sem entregar linhas. Empresa não concluiu sistema de transmissão de dezenas de parques, mas emplacou 25 novos projetos de usinas movidas a vento
O leilão de energia eólica realizado na sexta-feira chamou a atenção por três motivos. Primeiro, pela agilidade no bater do martelo. Durou 40 minutos, quando normalmente as disputas duram por horas. Segundo, pela parca presença dos investidores privados. A terceira surpresa foi a agressividade da Chesf. Em parceria com outras empresas e fundos de investimento, emplacou 25 dos 66 projetos vencedores - 38% do total.
Não haveria estranhamento não fosse a mesma Chesf uma referência negativa na energia movida a vento. A empresa venceu muitos leilões de linhas de transmissão para parque eólicos no Nordeste, mas até hoje não concluiu os projetos.
As empresas do sistema Eletrobrás, Furnas e Chesf, habilitaram 38 dos 66 projetos - 58% do total. Pelos cálculos da Thymos, consultoria do setor de energia, a presença das estatais superou a média. Nos dois últimos leilões de parque eólicos, realizados em 2011, elas detinham 25% e 50% dos projetos vencedores. A líder disparada era a Eletrosul e a Chesf, apenas a lanterninha. No leilão de sexta-feira, a Eletrosul nem sequer participou.
Thaís Prandini, diretora executiva da Thymos, tem duas leituras para a supremacia das estatais no leilão de eólicas. "De um lado há o aspecto positivo: apesar de a Eletrobrás estar num processo de reestruturação, mostra que ainda pode investir e buscar alternativas para melhorar as receitas", diz Thaís. "Por outro lado, dá um pouco de medo ver a Chesf, que tem um histórico ruim no setor de eólicas, com tantos projetos: a empresa se enroscou na construção de linhas de transmissão e não há garantias de que não fará o mesmo na geração."
A Chesf entrou com força nos recentes leilões de transmissão e arrematou a maioria das linhas no Nordeste, a sua área de atuação. Levou, mas tem dificuldade para entregar. Os projetos estão atrasados, o que criou um efeito dominó de prejuízos e distorções no mercado de eólicas.
Efeito dominó. Por causa da Chesf, o governo reviu as regras e prazos para a expansão dos parques eólicos. Como o investidor tem direito de receber o pagamento quando conclui o parque - haja ou não conexão à rede -, o atraso faz com que os consumidores paguem por uma energia que não recebem. Estima-se que a conta chegue a R$ 800 milhões neste ano.
Para evitar o aumento desse gasto e o transtorno para a imagem do governo, foi oferecido aos investidores a possibilidade "concatenar" os projetos: atrasar o parque para que seja inaugurado com a linha.
Mudou-se também a regra para a expansão das linhas de transmissão. Inicialmente, ficou definido que os parques não arcariam com a conexão com a rede. Grupos de parques seriam ligados a estações coletoras, chamadas ICGs, que, por sua vez, seriam ligadas à rede.
Para definir o número e a localização das ICGs, o governo primeiro fazia os leilões de geração e, depois, os de transmissão. Como a Chesf não conseguiu cumprir o cronograma, a ICG foi estigmatizada e abandonada. A partir do leilão de sexta-feira, quem vence precisa arcar com o custo da conexão a uma rede já existente. Não serão feitos leilões para a construção de novas linhas por enquanto.
Especialistas avaliam que o governo adotou "gambiarras" para contornar os contratempos criados pela estatal. "O problema foi a Chesf entrar em todos os leilões porque queria o domínio do Nordeste", diz Adão Linhares Muniz, presidente Câmara Setorial de Energia Eólica do Ceará. "Mas em vez de punir a empresa, o governo fez como o marido da piada: ao descobrir que estava sendo traído, tirou o sofá da sala."
Romeu Rufino, diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica discorda. "A Chesf causou um enorme transtorno e foi punida: recebeu multa e teve a participação nos leilões limitada", diz Rufino. A Aneel agora estuda com a Advocacia-Geral da União entrar com uma ação de reparação de danos.
Enquanto isso, porém, o investidor se mostra mais arredio. O baixo quórum das empresas privadas no leilão, em parte, é atribuído às mudanças das regras. Além de estudar a posição dos cataventos, o investidor agora precisa fazer um projeto de conexão à rede mais próxima, o que demanda tempo para avaliar riscos e retornos. Poucas privadas arriscaram voos solos, como Enerfin, Wobben e Renova, que juntas tiveram 13 projetos vencedores. Grandes empresas, como a CPFL, não participaram.
26 de agosto de 2013
Alexa Salomão - O Estado de S.Paulo
Não haveria estranhamento não fosse a mesma Chesf uma referência negativa na energia movida a vento. A empresa venceu muitos leilões de linhas de transmissão para parque eólicos no Nordeste, mas até hoje não concluiu os projetos.
As empresas do sistema Eletrobrás, Furnas e Chesf, habilitaram 38 dos 66 projetos - 58% do total. Pelos cálculos da Thymos, consultoria do setor de energia, a presença das estatais superou a média. Nos dois últimos leilões de parque eólicos, realizados em 2011, elas detinham 25% e 50% dos projetos vencedores. A líder disparada era a Eletrosul e a Chesf, apenas a lanterninha. No leilão de sexta-feira, a Eletrosul nem sequer participou.
Thaís Prandini, diretora executiva da Thymos, tem duas leituras para a supremacia das estatais no leilão de eólicas. "De um lado há o aspecto positivo: apesar de a Eletrobrás estar num processo de reestruturação, mostra que ainda pode investir e buscar alternativas para melhorar as receitas", diz Thaís. "Por outro lado, dá um pouco de medo ver a Chesf, que tem um histórico ruim no setor de eólicas, com tantos projetos: a empresa se enroscou na construção de linhas de transmissão e não há garantias de que não fará o mesmo na geração."
A Chesf entrou com força nos recentes leilões de transmissão e arrematou a maioria das linhas no Nordeste, a sua área de atuação. Levou, mas tem dificuldade para entregar. Os projetos estão atrasados, o que criou um efeito dominó de prejuízos e distorções no mercado de eólicas.
Efeito dominó. Por causa da Chesf, o governo reviu as regras e prazos para a expansão dos parques eólicos. Como o investidor tem direito de receber o pagamento quando conclui o parque - haja ou não conexão à rede -, o atraso faz com que os consumidores paguem por uma energia que não recebem. Estima-se que a conta chegue a R$ 800 milhões neste ano.
Para evitar o aumento desse gasto e o transtorno para a imagem do governo, foi oferecido aos investidores a possibilidade "concatenar" os projetos: atrasar o parque para que seja inaugurado com a linha.
Mudou-se também a regra para a expansão das linhas de transmissão. Inicialmente, ficou definido que os parques não arcariam com a conexão com a rede. Grupos de parques seriam ligados a estações coletoras, chamadas ICGs, que, por sua vez, seriam ligadas à rede.
Para definir o número e a localização das ICGs, o governo primeiro fazia os leilões de geração e, depois, os de transmissão. Como a Chesf não conseguiu cumprir o cronograma, a ICG foi estigmatizada e abandonada. A partir do leilão de sexta-feira, quem vence precisa arcar com o custo da conexão a uma rede já existente. Não serão feitos leilões para a construção de novas linhas por enquanto.
Especialistas avaliam que o governo adotou "gambiarras" para contornar os contratempos criados pela estatal. "O problema foi a Chesf entrar em todos os leilões porque queria o domínio do Nordeste", diz Adão Linhares Muniz, presidente Câmara Setorial de Energia Eólica do Ceará. "Mas em vez de punir a empresa, o governo fez como o marido da piada: ao descobrir que estava sendo traído, tirou o sofá da sala."
Romeu Rufino, diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica discorda. "A Chesf causou um enorme transtorno e foi punida: recebeu multa e teve a participação nos leilões limitada", diz Rufino. A Aneel agora estuda com a Advocacia-Geral da União entrar com uma ação de reparação de danos.
Enquanto isso, porém, o investidor se mostra mais arredio. O baixo quórum das empresas privadas no leilão, em parte, é atribuído às mudanças das regras. Além de estudar a posição dos cataventos, o investidor agora precisa fazer um projeto de conexão à rede mais próxima, o que demanda tempo para avaliar riscos e retornos. Poucas privadas arriscaram voos solos, como Enerfin, Wobben e Renova, que juntas tiveram 13 projetos vencedores. Grandes empresas, como a CPFL, não participaram.
26 de agosto de 2013
Alexa Salomão - O Estado de S.Paulo
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