"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 12 de julho de 2017

QUANTO DA NOSSA CULTURA ESTAMOS CEDENDO AO ISLÃ?

Tudo isso aconteceu na mesma semana. Um juiz alemão proibiu o comediante Jan Böhmermann de repetir versos “obscenos” de seu famoso poema sobre o presidente turco Recep Tayyip Erdogan. Um teatro dinamarquês aparentemente cancelou a apresentação dos “Versos Satânicos” da sua temporada por medo de “represálias”. Dois festivais de música franceses não apresentarão o Eagles of Death Metal — a banda americana que tocava no Bataclan, uma sala de espetáculos em Paris, quando ela foi alvo do ataque dos terroristas do ISIS (89 pessoas foram assassinadas), — por conta de comentários “islamofóbicos” de Jesse Hughes, vocalista do grupo. Hughes sugeriu que os muçulmanos passem por uma revista mais minuciosa , ressaltando que “está certo ser mais exigente quando se tratar de muçulmanos a esta altura”, acrescentando:

“Eles sabem que há um belo grupo de menores brancos que são idiotas e cegos. Temos esses adolescentes brancos que cresceram em um ambiente liberal desde o jardim de infância, cercados com essas imponentes noções que nada mais são do que conversa fiada”.

Brendan O’Neill ressalta, “os liberais ocidentais estão fazendo o trabalho sujo para eles; eles estão silenciando aqueles que o ISIS considera blasfemos; eles estão completando os atos de terror do ISIS”.

Há algumas semanas, a editora mais importante da França, a Gallimard, despediu o seu mais famoso editor, Richard Millet, que escreveu um ensaio no qual ele assinala:

“O declínio da literatura e as profundas mudanças ocorridas na França e na Europa em consequência da ininterrupta e extensa imigração de fora da Europa, com seus assustadores elementos do salafismo militante e da correção política alojadas no coração do capitalismo global; vale dizer, significa o perigo da destruição da Europa juntamente com seu humanismo cultural ou humanismo cristão, em nome do humanismo em sua versão multicultural“.

Kenneth Baker acaba de publicar sua nova obra On the Burning of Books: How Flames Fail to Destroy the Written Word (Sobre a Queima de Livros: Porque as Chamas Não Conseguem Destruir a Palavra Escrita). Trata-se de um compêndio do assim chamado “bibliocausto”, a queima de livros desde o Califa Omar a Hitler, incluindo a fatwa contra Salman Rushdie. Quando os nazistas incineraram livros em Berlim eles declararam que das cinzas desses romances se “levantará a fênix de um novo espírito“. O mesmo ódio vem dos islamistas e de seus aliados politicamente corretos. Sequer temos uma vaga ideia de quanto da cultura ocidental nós cedemos ao Islã.

O filme “Submissão” de Theo Van Gogh, pelo qual ele foi assassinado, desapareceu de muitos festivais de cinema. Os desenhos do Profeta Maomé da revista Charlie Hebdo estão fora do alcance dos olhares do público: depois do massacre, pouquíssimas mídias reeditaram aquelas caricaturas. As postagens no blog de Raif Badawi, que lhe custaram 1.000 chibatadas além de dez anos de prisão na Arábia Saudita, foram apagadas pelas autoridades sauditas e agora circulam como a Samizdat, a literatura proibida na União Soviética.

Molly Norris, a cartunista americana que em 2010 fez desenhos de Maomé e proclamou o “Dia de Todo Mundo Desenhar Maomé”, ainda vive escondida, teve que mudar de nome e de vida. O Metropolitan Museum of Art de Nova Iorque retirou as imagens de Maomé de uma exposição, enquanto a imprensa de Yale baniu as imagens de Maomé de um livro sobre charges. A Joia de Medina, um romance sobre a esposa de Maomé, também foi retirado.

Na Holanda, uma ópera sobre Aisha, uma das esposas de Maomé, foi cancelada em Roterdam depois que a peça foi boicotada pelos atores muçulmanos da companhia teatral, quando ficou evidente que seriam alvos de islamistas. O jornal NRC Handelsblad publicou na manchete da primeira página “Teerã no Meuse“, o rio que passa pela cidade holandesa.

Na Inglaterra, o Museu Victoria e Albert retirou a imagem de Maomé. “Os museus e as bibliotecas britânicos têm em seu acervo dezenas dessas imagens, em sua maioria miniaturas de manuscritos de vários séculos, mas estão, em grande medida, longe dos olhos do público”, segundo matéria do The Guardian. Na Alemanha, a Deutsche Opera cancelou a ópera Idomeneo de Mozart em Berlim, porque ela retratava a cabeça cortada de Maomé.

A peça “Tamerlão o Grande” de Christopher Marlowe, que inclui uma passagem em que Maomé “não merece ser adorado”, foi reescrita no teatro Barbican de Londres, ao passo que os organizadores do carnaval de Colônia cancelaram os carros alegóricos em homenagem a Charlie Hebdo.

Na cidade holandesa de Huizen, duas pinturas de nus foram removidas de uma exposição após a reação desfavorável de muçulmanos. A obra da artista holandesa/iraniana Sooreh Hera, foi retirada de vários museus holandeses porque algumas das fotografias retratavam Maomé e seu genro Ali. Em conformidade com o exposto, um dia a National Gallery de Londres, Uffizi de Florença, Louvre de Paris ou Prado de Madri poderão resolver censurar Michelangelo, Rafael, Bosch e Balthus para não ofender a “suscetibilidade” dos muçulmanos.

O dramaturgo inglês Richard Bean foi obrigado a censurar uma adaptação da comédia “Lisístrata” de Aristófanes, na qual as mulheres gregas entram em “greve de sexo” para impedir seus companheiros de irem para a guerra (no script de Bean, virgens muçulmanas entram em greve para impedir a ação de homens bomba). Diversos vilarejos espanhóis pararam de queimar efígies de Maomé nas solenidades que celebram a reconquista do país na Idade Média.

Há um vídeo gravado em 2006, no qual as ameaças de morte contra Charlie Hebdo se tornaram preocupantes. No vídeo jornalistas e cartunistas estão reunidos em volta de uma mesa para decidir qual será a capa da próxima edição da revista. Eles conversam sobre o Islã. Jean Cabu, um dos cartunistas que depois foi assassinado por islamistas, coloca a questão da seguinte maneira: “ninguém na União Soviética tinha o direito de fazer sátiras sobre Brezhnev.”

Depois, outra futura vítima, Georges Wolinski, diz, “Cuba está cheia de cartunistas, mas não fazem caricaturas sobre Castro. De modo que somos felizardos. Sim, somos felizardos, a França é um paraíso”.

Cabu e Wolinski estavam certos. As democracias são, ou pelo menos deveriam ser, custodiantes de um tesouro perecível: liberdade de expressão. Esta é a maior diferença entre Paris e Havana, Londres e Riad, Berlim e Teerã, Roma e Beirute. Liberdade de expressão é o que temos de melhor da cultura ocidental.

Graças a campanha dos islamistas e o fato de que agora somente alguns “malucos” ainda se aventuram no exercício da liberdade. Iremos apenas ficar amedrontados? Cartunistas, jornalistas e escritores “islamofóbicos”, são os primeiros europeus desde 1945 a se retiraram da vida pública para protegerem suas próprias vidas. Pela primeira vez na Europa desde que Hitler ordenou a queima de livros na Bebelplatz em Berlim, filmes, pinturas, poemas, romances, charges, artigos e peças estão sendo literal e figurativamente queimados.

O jovem matemático francês Jean Cavailles, que para explicar seu fatídico envolvimento com a Resistência antinazista, costumava dizer: “nós lutamos para podermos ler o Paris Soir em vez do Völkischer Beobachter“. E por esta razão somente, é autodestrutivo polemizar sobre a beleza de charges, poemas ou pinturas. No Ocidente, pagamos um preço muito alto pela liberdade para podermos usufruir dela. Devemos todos, portanto, protestar quando um juiz alemão proíbe versos “ofensivos”, quando uma editora francesa despede um editor “islamofóbico” ou quando um festival de música bane uma banda politicamente incorreta.

Ou será que já é tarde demais?

12 de julho de 2017
Giulio Meotti, editor cultural do diário Il Foglio, é jornalista e escritor italiano.
Publicado no site do Gatestone Institute.
Tradução: Joseph Skilnik

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