Espera-se que nesta semana a Procuradoria-Geral da República encaminhe ao Supremo os primeiros inquéritos com base nos depoimentos dos 77 dirigentes e executivos da Odebrecht. A operação Lava Jato enfim entrará na segunda etapa de sua trajetória, mas ainda está longe do fim, por que não faltam candidatos à delação premiada. No entanto, nem todos conseguirão alcançar esse benefício que pode lhes diminuir as penas. Como diz a Bíblia (em Mateus 22:14), muitos serão chamados, mas poucos os escolhidos.
DELAÇÃO SUSPENSA – O mais ansioso dos réus que almejam delação premiada é o empresário Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, que está preso em Curitiba e já tinha acertado a colaboração com a Procuradoria, mas foi alvejado pelo vazamento de alguns trechos de seu depoimento, justamente a parte que evidenciava sua intimidade com o ministro Dias Toffoli. Este fato chocou o falso moralismo do Supremo e levou o então relator Teori Zavascki a anular a delação premiada do empresário.
É mais do que provável que Léo Pinheiro não tenha nada a ver com o vazamento, mas foi ingênuo ao falar sobre Dias Toffoli, despertou a ira corporativista do Supremo e se lascou.
A FILA ANDA – Chegou a ser divulgada uma falsa notícia de que a força-tarefa só aceitaria delação de mais uma empreiteira – no caso, a Odebrecht – e a OAS ficaria automaticamente de fora. Mais isso é conversa fiada. Hipoteticamente, todo réu tem direito ao benefício, desde que tenha a quem delatar.
Não existem restrições na lei, mas na prática só é aceita a delação de um criminoso menor que entrega um maior. Por exemplo, o empresário Eike Batista tem chance de fechar uma delação premiada, caso consiga delatar grande figuras da política, mas não adianta oferecer a cabeça de seu ex-amigo Sérgio Cabral, porque já existem provas demais contra o ex-governador.
Quanto ao próprio Cabral, entrou em desespero na prisão, porque ele é considerado chefe de quadrilha, só tem condições delatar os cúmplices, que se ocupam justamente em entregá-lo, e agora já foi aprovada a delação premiada do ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado, Jonas Lopes, aumentando as provas contra o ex-governador e incriminando muitos outros conselheiros do TCE.
CUNHA NA FILA – Outro preso que busca a delação premiada é o ex-deputado Eduardo Cunha, que já perdeu quase tudo – o cargo, o mandato parlamentar, o prestígio social, o respeito das comunidades evangélicas, uma boa parte dos bens e a dignidade. Só lhe restou a família e parte do dinheiro que a Lava Jato ainda não conseguiu mapear. Sua mulher Cláudia Cruz também está sendo processada e os filhos continuam sob investigação.
Antes de ser preso, Cunha passou dois meses selecionando documentos e provas com ajuda do doleiro Lúcio Funaro, que em Brasília operava lavagem de dinheiro para políticos e autoridades. Funaro acabou preso em julho pela Lava Jato, mas antes disso entregou a Cunha uma quantidade enorme de recibos, anotações e documentos.
MACHADO A PERIGO – O delator Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro, indicado ao cargo pelo senador Renan Calheiros (PMDB-AL), conseguiu fazer delação, está devolvendo apenas R$ 75 milhões em módicas prestações e continua em liberdade junto com os filhos que participavam do esquema. A famiglia ainda tem muito dinheiro escondido. Basta dizer que o equivalente a R$ 96 milhões foram investidos em imóveis no Reino Unido, conforme denúncia do jornal londrino The Guardian.
Mas a investigação não prosperou, todo mundo sabe que Machado deu uma volta no procurador Rodrigo Janot e no ministro Teori Zavascki, e por isso o novo relator Edson Fachin mandou reabrir as investigações.
MORO E O SUPREMO – Nesta época de carnaval, a festa da Lava Jato continuou e o juiz Sérgio Moro aproveitou para condenar Delúbio Soares, ex-tesoureiro do PT, e mais uma galera envolvida em lavagem de dinheiro. Enquanto isso, o Supremo ainda não condenou ninguém e continua fantasiado de tribunal.
E assim a Lava Jato se equilibra numa perna só, como se fosse um Saci judicial que insiste em desfilar como mestre-sala na passarela da Justiça.
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PS – Excepcionalmente, não falaremos hoje no ministro Eliseu Padilha, que somente terá alta na semana que vem. Mas daqui a pouco o jurista Jorge Béja vai explicar que o ainda chefe da Casa Civil perderá o direito ao foro privilegiado, se continuar licenciado do cargo. (C.N.)
05 de março de 2017
Carlos Newton
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