O BC ignora que o maior causador do impacto fiscal na política monetária é ele
Enquanto o governo batalha junto ao Congresso para aprovar a Proposta de Emenda Constitucional PEC 241, que estabelece o congelamento por 20 anos das despesas primárias (que excluem juros), o impacto fiscal da política monetária vai aprofundando o déficit fiscal que pode ultrapassar R$ 670 bilhões (10,7% do PIB) neste ano!
Vale observar que o déficit público previsto para este ano não é de R$ 170 bilhões como afirma o governo, mas sim de R$ 670 bilhões, pois ele omite cerca de R$ 500 bilhões (!) que é o déficit causado pelos juros.
O impacto fiscal da política monetária ocorre basicamente pela: a) taxa básica de juros Selic; b) emissão de swaps cambiais e; c) manutenção de reservas internacionais.
As reservas internacionais custaram no primeiro semestre deste ano R$ 263,3 bilhões (!) ou 4,3% do PIB segundo o balanço do Banco Central (BC), que fez o cálculo diariamente pela diferença entre a taxa de rentabilidade das reservas, incluindo a variação cambial, e a taxa média de captação apurada pelo BC.
Em apenas seis meses o impacto fiscal das reservas internacionais supera em 54,8% (!) o déficit primário projetado de R$ 170 bilhões para este ano e, no entanto, é de se estranhar que a questão dessas reservas não esteja na ordem do dia do debate fiscal do País.
Felizmente, o Bradesco rompe essa letargia fiscal e apresenta competente estudo, no qual estima segundo seis critérios usualmente adotados, o nível ótimo de reservas que equilibra percepção de risco e custo, chegando à conclusão que o volume de reservas que atinge hoje US$ 377 bilhões, pode estar bem acima do nível ótimo. Acrescenta, ainda, que a métrica mais conservadora é do FMI, que sugere algo ao redor de US$ 190 bilhões.
Venho repetindo nesta coluna a urgente necessidade da venda gradual do excesso de reservas, que estimo em US$ 200 bilhões. Já passamos por uma grava crise internacional em 2008 e atravessamos aquela turbulência com reservas no nível de US$ 200 bilhões, sem problemas de risco cambial.
Os que se opõem à venda de reservas argumentam com o risco de solvência externa em situação de fragilidade fiscal. Ora, essa fragilidade é causada principalmente pelo impacto dos juros nas contas públicas e, parte considerável desse impacto é devido ao excesso de reservas. Esse excesso causa um custo da ordem de R$ 100 bilhões por ano.
Mas há outros excessos que impactam o déficit fiscal e decorrem, também, da Selic fora de lugar. Internacionalmente a taxa básica de juros se encontra desde a crise de 2008 ao redor da inflação. Se seguíssemos o exemplo internacional teríamos uma economia anual da ordem de R$ 200 bilhões.
Além disso, carece de sentido o Tesouro Nacional manter no BC um trilhão de reais sem remuneração. Considerando metade como excesso, a economia anual ao abater a dívida alcançaria R$ 70 bilhões.
Em síntese, a eliminação desses excessos permitiria uma economia anual com juros da ordem de R$ 370 bilhões (!) e redução da relação dívida/PIB dos atuais 68,5% para 49,2%.
O retorno da denominada bolsa empresário de R$ 521 bilhões do Tesouro emprestado ao BNDES, permitiria uma economia adicional anual de R$ 35 bilhões e levaria a relação dívida/PIB para 40,6%, em linha com a média dos emergentes.
O BC, na ata da última reunião do Copom, colocou como uma das condições para iniciar a redução da Selic a aprovação no Congresso da PEC 241 e da reforma previdenciária, consideradas essenciais para reduzir o impacto fiscal na política monetária. Enquanto isso, o BC parece ignorar que o maior causador do impacto fiscal na política monetária é ele próprio com os excessos aqui apontados.
Como vem crescendo as incertezas quanto a aprovação das propostas do governo neste Congresso pode ser de alto risco aguardar o movimento do BC para reduzir a Selic.
Assim, temo que se perca mais uma oportunidade de real mudança, ficando o País refém dessa autêntica armadilha monetária.
25 de setembro de 2016
Amir Khair, Estadão
MESTRE EM FINANÇAS PÚBLICAS PELA FGV E CONSULTOR.
Enquanto o governo batalha junto ao Congresso para aprovar a Proposta de Emenda Constitucional PEC 241, que estabelece o congelamento por 20 anos das despesas primárias (que excluem juros), o impacto fiscal da política monetária vai aprofundando o déficit fiscal que pode ultrapassar R$ 670 bilhões (10,7% do PIB) neste ano!
Vale observar que o déficit público previsto para este ano não é de R$ 170 bilhões como afirma o governo, mas sim de R$ 670 bilhões, pois ele omite cerca de R$ 500 bilhões (!) que é o déficit causado pelos juros.
O impacto fiscal da política monetária ocorre basicamente pela: a) taxa básica de juros Selic; b) emissão de swaps cambiais e; c) manutenção de reservas internacionais.
As reservas internacionais custaram no primeiro semestre deste ano R$ 263,3 bilhões (!) ou 4,3% do PIB segundo o balanço do Banco Central (BC), que fez o cálculo diariamente pela diferença entre a taxa de rentabilidade das reservas, incluindo a variação cambial, e a taxa média de captação apurada pelo BC.
Em apenas seis meses o impacto fiscal das reservas internacionais supera em 54,8% (!) o déficit primário projetado de R$ 170 bilhões para este ano e, no entanto, é de se estranhar que a questão dessas reservas não esteja na ordem do dia do debate fiscal do País.
Felizmente, o Bradesco rompe essa letargia fiscal e apresenta competente estudo, no qual estima segundo seis critérios usualmente adotados, o nível ótimo de reservas que equilibra percepção de risco e custo, chegando à conclusão que o volume de reservas que atinge hoje US$ 377 bilhões, pode estar bem acima do nível ótimo. Acrescenta, ainda, que a métrica mais conservadora é do FMI, que sugere algo ao redor de US$ 190 bilhões.
Venho repetindo nesta coluna a urgente necessidade da venda gradual do excesso de reservas, que estimo em US$ 200 bilhões. Já passamos por uma grava crise internacional em 2008 e atravessamos aquela turbulência com reservas no nível de US$ 200 bilhões, sem problemas de risco cambial.
Os que se opõem à venda de reservas argumentam com o risco de solvência externa em situação de fragilidade fiscal. Ora, essa fragilidade é causada principalmente pelo impacto dos juros nas contas públicas e, parte considerável desse impacto é devido ao excesso de reservas. Esse excesso causa um custo da ordem de R$ 100 bilhões por ano.
Mas há outros excessos que impactam o déficit fiscal e decorrem, também, da Selic fora de lugar. Internacionalmente a taxa básica de juros se encontra desde a crise de 2008 ao redor da inflação. Se seguíssemos o exemplo internacional teríamos uma economia anual da ordem de R$ 200 bilhões.
Além disso, carece de sentido o Tesouro Nacional manter no BC um trilhão de reais sem remuneração. Considerando metade como excesso, a economia anual ao abater a dívida alcançaria R$ 70 bilhões.
Em síntese, a eliminação desses excessos permitiria uma economia anual com juros da ordem de R$ 370 bilhões (!) e redução da relação dívida/PIB dos atuais 68,5% para 49,2%.
O retorno da denominada bolsa empresário de R$ 521 bilhões do Tesouro emprestado ao BNDES, permitiria uma economia adicional anual de R$ 35 bilhões e levaria a relação dívida/PIB para 40,6%, em linha com a média dos emergentes.
O BC, na ata da última reunião do Copom, colocou como uma das condições para iniciar a redução da Selic a aprovação no Congresso da PEC 241 e da reforma previdenciária, consideradas essenciais para reduzir o impacto fiscal na política monetária. Enquanto isso, o BC parece ignorar que o maior causador do impacto fiscal na política monetária é ele próprio com os excessos aqui apontados.
Como vem crescendo as incertezas quanto a aprovação das propostas do governo neste Congresso pode ser de alto risco aguardar o movimento do BC para reduzir a Selic.
Assim, temo que se perca mais uma oportunidade de real mudança, ficando o País refém dessa autêntica armadilha monetária.
25 de setembro de 2016
Amir Khair, Estadão
MESTRE EM FINANÇAS PÚBLICAS PELA FGV E CONSULTOR.
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