Equipe econômica quer reduzir ao mínimo as alterações na PEC do teto
O governo federal teria economizado R$ 107 bilhões com o pagamento dos salários dos seus servidores se a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que cria um teto de gastos vinculado à inflação tivesse sido implementada desde 2000, quando a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) foi aprovada pelo Congresso Nacional.
O cálculo, feito por consultores de finanças públicas da Câmara dos Deputados, é revelador das razões que têm levado a máquina do funcionalismo a se movimentar ferozmente nos gabinetes do Congresso contra o teto, medida central do ajuste fiscal anunciado pela equipe econômica do governo Michel Temer.
Os servidores querem que as despesas de pessoal fiquem de fora das regras da PEC, assim como pedem também os representantes das áreas de saúde e educação. É certo que a PEC vai impor uma disputa muito grande pela repartição dos recursos orçamentários, e essa briga já começou antes mesmo de a proposta ter sido aprovada. Um arrocho salarial maior deve acontecer, principalmente, depois que o prazo de vigência dos reajustes concedidos ao longo deste ano terminar, em 2019.
Uma prova dessa antecipação do embate é o que tem ocorrido com os projetos de reajustes dos servidores que ainda tramitam no Congresso. Boa parte do funcionalismo já está recebendo o salário com o aumento, mas categorias com poder de pressão, como delegados da Polícia Federal e auditores da Receita Federal e do Trabalho, ainda dependem de aprovação. Sem contar o projeto que eleva o salário dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) e traz repercussões também nos Estados. Essa pressão provocou uma racha na base aliada do governo, que ameaça a votação do ajuste fiscal e expôs de forma mais clara a ambiguidade do discurso das lideranças políticas do PMDB e de outros partidos de sustentação do governo.
Como a PEC se propõe a colocar um limite na taxa de crescimento total dos gastos, sem atacar nenhum segmento específico, qual grupo de gasto será comprimido dependerá da força de pressão no Parlamento.
A verdade é que os gastos com o pagamento da folha de pessoal cresceram, nos últimos 16 anos, com velocidade muito superior à da inflação. Nesse período apenas em três anos (2003, 2012 e 2015) o aumento das despesas de pessoal da União foi inferior ao IPCA.
O caso mais gritante ocorreu em 2006, durante o governo Lula, quando os gastos com pessoal cresceram em ritmo quatro vezes maior do que a inflação de 3,14% registrada naquele ano.
Situação muito parecida ocorreu em 2009, ano de recessão econômica, quando o IPCA fechou em 4,31% e a folha subiu 15,63%. O resultado dessa disparidade foi um salto da folha nos últimos 16 anos de R$ 58,24 bilhões, para os R$ 277,1 bilhões autorizados neste ano. Para 2017, não será diferente. Os consultores preveem um aumento de 9% da folha, enquanto a inflação esperada é de 7,3%, de acordo com as últimas previsões.
Com a aproximação do desfecho do impeachment da presidente afastada Dilma Rousseff, a discussão da PEC esquentou nos últimos dias, assim que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, sinalizou que pretende correr com a tramitação. As críticas ao teto aumentaram justamente depois que a consultoria técnica da Câmara divulgou dados mostrando que o limite de gastos previsto na PEC pode não ser suficiente para atender os aumentos salariais já concedidos. E pior: os números indicaram que somente a partir de 2025 haveria espaço para o aumento das despesas com pessoal acima do crescimento vegetativo da folha, estimado em 3% ao ano.
Para complicar a vida dos servidores, a PEC traz como instrumento de freio a proibição de reajustes, criação de novos cargos e alteração na estrutura de carreira quando o teto for descumprido. Essas restrições são um dos itens que estão na mira de mudanças pelos parlamentares, além do prazo de vigência do teto, que pode cair de 20 para sete anos.
Nas áreas de saúde e educação, a pressão tende a ser maior. A equipe econômica quer reduzir ao mínimo as alterações no texto da emenda, sob pena de ver o teto desfigurado e sem capacidade de controlar a trajetória explosiva da divida publica. Mas já sabe que dificilmente conseguirá conter as mudanças se a tramitação demorar muito tempo. Por isso, a pressa do governo para concluir o quanto antes a votação. Rodrigo Maia se comprometeu a tentar preservar o texto. Sem o teto, o ajuste morre antes mesmo de começar.
28 de agosto de 2016
Adriana Fernandes, Estadão
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