"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 3 de julho de 2015

MAIORIDADE PENAL: UMA EXIGÊNCIA DE 87% DA POPULAÇÃO

Presidente da OAB e parlamentares de esquerda se unem contra a esmagadora maioria da população, contra a Constituição, contra o Regimento da Câmara e contra a jurisprudência do Supremo. Dizer o quê? Vão estudar!

Vamos lá. Vamos botar alguns pingos nos is. O governo, as esquerdas e a Ordem dos Advogados do Brasil resolveram se unir contra a esmagadora maioria da sociedade brasileira na presunção de que esta não sabe nada, é estúpida e precisa ser tutelada. 
E também se juntaram contra a Constituição, o Regimento Interno da Câmara e a jurisprudência do STF. Marcus Vinicius Furtado Coelho, presidente da OAB, afirmou que a entidade vai recorrer ao Supremo com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade caso a proposta de redução da maioridade penal para alguns crimes seja realmente rebaixada de 18 para 16 anos. 
Endossando argumento exótico de José Eduardo Cardozo, ministro da Justiça, afirma que a maioridade aos 18 é uma cláusula pétrea.
É uma afirmação realmente impressionante. O leitor tem de saber que uma “cláusula pétrea” — dispositivo constitucional  que não será objeto de deliberação nem por emenda — não é uma questão subjetiva, de opinião. Não se trata de mera impressão. Fosse assim, cada nova composição do Supremo diria o que pode e o que não pode ser alterado. A própria Carta diz o que é intocável no país. 
Está no Parágrafo 4º do Artigo 60. Reproduzo para vocês.

§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

I – a forma federativa de Estado;
II – o voto direto, secreto, universal e periódico;
III – a separação dos Poderes;
IV – os direitos e garantias individuais.
Muito bem! Como a maioridade penal não atenta contra a federação, não muda a natureza do voto, não ameaça a separação entre os Poderes, só poderia ser cláusula pétrea se estivesse no Artigo 5º da Constituição, justamente o dos direitos e garantias individuais. E não está. A maioridade está no Artigo 228. E, por óbvio, não é cláusula pétrea.
É um acinte à inteligência a argumentação do presidente da OAB. Eu realmente espero que a proposta seja aprovada só para que o Supremo tenha a chance de se pronunciar a respeito.
Suposta manobra de Cunha
O mesmo Artigo 60 tem um Parágrafo 5º que estabelece o seguinte:

“§ 5º A matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa.”
O que é “sessão legislativa”? É o período de funcionamento do Congresso no ano. Logo, segundo o que vai acima, aquele texto da maioridade rejeitado na terça só pode ser apresentado a partir de novo no ano que vem. OCORRE QUE O TEXTO APROVADO NA QUINTA NÃO É O DE TERÇA, PARA COMEÇO DE CONVERSA. MAS ESSE NÃO É O ARGUMENTO PRINCIPAL.
Os IncisoS II e V do Artigo 191 do Regimento Interno da Câmara são arreganhados na sua clareza. Diz o II: “O substitutivo de Comissão tem preferência na votação sobre o projeto”. Estabelece o V: “Na hipótese de rejeição do substitutivo, ou na votação de projeto sem substitutivo, a proposição inicial será votada por último, depois das emendas que lhe tenham sido apresentadas”.
Vamos aos fatos. Na terça, o texto que não conseguiu os 308 votos necessários era justamente o substitutivo da comissão especial. Não era o texto original. E, por isso, foi votado antes. Se tivesse sido aprovado, o texto original estava prejudicado. Como o substitutivo não passou, o Artigo V obriga o presidente da Câmara a votar o texto original, com as emendas que forem apresentadas. E foi o que fez Cunha. A PEC aprovada na madrugada de quinta excluiu das causas de redução da maioridade tráfico de drogas, roubo qualificado e lesão corporal grave — que constavam no substitutivo de terça.
Marco Aurélio Mello

O ministro Marco Aurélio Mello resolveu ontem se pronunciar a respeito, fora dos autos, em nome da lei, o que é um comportamento um pouco contraditório, não? Afirmou que a votação foi inconstitucional, a exemplo do que dizem o governo e as esquerdas.
Pois é… Em 1996, ele foi relator de um mandado de segurança sobre reforma da previdência em circunstância idêntica, deu a mesma opinião e foi derrotado. O tribunal entendeu que, nas circunstâncias obviamente estabelecidas no Regimento Interno da Câmara, o procedimento é constitucional. Transcrevo, a propósito, trecho do voto do então ministro Sepúlveda Pertence:

“Nem é razoável, com todas as vênias (…) espiolhar coincidências de conteúdo entre o substitutivo rejeitado, seja com a proposta original, seja com a emenda aglutinativa. 
A admissão dessa linha de raciocínio, a pretexto de dar aplicação ao art. 60, § 5º ou ao art. 67 da Constituição, levaria à total inviabilidade do processo legislativo, sempre que se tratasse de proposições complexas. Basta pensar na elaboração de um Código: é óbvio que sempre haveria, no substitutivo acaso preferencialmente rejeitado, numerosas coincidências com o projeto inicial”.
Assim, nas palavras de Pertence, é claro que há coincidências de conteúdo entre o substitutivo que não foi aprovado e o texto original que resultou na emenda aglutinativa aprovada.
Então ficamos assim:

1 – maioridade penal não é cláusula pétrea. A argumentação é ridícula;

2 – como demonstram a Constituição, o Regimento Interno da Câmara e a jurisprudência do Supremo, Cunha agiu rigorosamente dentro das regras.

Os inconformados com o resultado poderiam tentar conquistar votos. Fazer firula na imprensa, para jornalistas que não se ocupam de ler a Constituição, o Regimento Interno da Câmara e a jurisprudência do Supremo é fácil. O link dos três está lá no meu blog.
Sim, eu sou favorável à redução. É uma opinião. Mas opinião é como orelha, grande ou pequena. Todo mundo tem. O que afirmo aqui sobre a constitucionalidade e a legalidade da decisão de Cunha não é uma opinião. É apenas um fato ancorado na Constituição, no Regimento Interno e na Jurisprudência.
Aqui se faz jornalismo para gente direita, que não mente sobre leis nem omite dos leitores os fatos.
03 de julho de 2015
Reinaldo Azevedo

Nenhum comentário:

Postar um comentário