Na falta de uma reforma que corrija as trincas estruturais da política, políticos erguem puxadinhos. É um voto distrital aqui, uma fusão partidária ali, uma proibição de coligação em eleições proporcionais acolá. Pouco aparecem, pois o noticiário político foi submetido ao policial, mas é de laje em laje, de puxadinho em puxadinho que se constroem as metades pobres das metrópoles no Brasil. Pelo visto, as novas estruturas da política também.
O Senado aprovou pelo menos duas leis que têm potencial de transformar o resultado das eleições. Ambas ainda precisam ser aprovadas na Câmara dos Deputados - o que pode ser mais difícil do que parece, já que as duas Casas representam interesses distintos e seus presidentes travam duelo típico de adolescentes que querem comparar o tamanho de seu - digamos - prestígio.
Porém, as chances de o voto distrital e o fim das coligações de deputados e vereadores virarem leis são maiores do que jamais foram as de o PT aprovar o seu projeto de reforma política. Se os puxadinhos pararem em pé na Câmara, o que acontecerá com a balança do poder? Quem sairia ganhando? Quem ficaria menor?
A proibição de que partidos se juntem em uma chapa só - somando seus votos - para eleger vereadores, deputados estaduais e federais tiraria do mapa, logo na primeira eleição, pelo menos cinco dos partidos nanicos que têm representação no Congresso. O mais provável é que esse efeito se repetisse nos pleitos seguintes, enxugando progressivamente o total de siglas.
O mesmo efeito tende a acontecer com a adoção do voto distrital. Os pequenos partidos só conseguem eleger vereadores numa grande cidade quando seus votos são distribuídos por muitos distritos e/ou quando - no caso dos partidos de esquerda - se beneficiam do voto genérico na legenda partidária. Ter o nome mais votado em um distrito é muito mais difícil. A concorrência é maior.
Os maiores partidos podem distribuir recursos estrategicamente: gastar pouco em distritos onde derrota ou vitória são certas, e despejar toneladas de propaganda e multidões de militantes pagos onde a disputa está apertada, para virá-la em favor de seu candidato. Concentrado em poucos lugares, o dinheiro tende a ser ainda mais decisivo na eleição.
Os puxadinhos políticos em construção tendem a matar os pequenos partidos e aleijar os médios, até eles se tornarem pequenos e morrerem também. É questão de tempo. Antevendo esse destino, várias legendas intermediárias estão numa política de expansão e aquisição. São os casos do PTB e do DEM - o improvável casamento dos trabalhistas históricos com seus patrões. De PSB e PPS - uma aquisição pintada de fusão, tipo Itaú-Unibanco. De PL e PSD.
Esse cenário de concentração partidária é incentivado pelo desgaste do PT, que deve levar a sigla de Lula, em 2016, à sua eleição mais difícil em 25 anos. Com a impopularidade colossal do governo Dilma, a prisão em série de dirigentes partidários e a economia claudicante, os candidatos petistas, como Fernando Haddad, vão ter que ralar muito para se eleger.
Também vai depender de como a Justiça delimitar os distritos eleitorais. Com o voto distrital, o mapeamento é tudo. O repórter Daniel Bramatti, do Estadão Dados, dividiu São Paulo em 55 distritos de duas maneiras distintas, e comparou o desempenho de PT e PSDB, usando os votos para vereador recebidos por ambos em 2012. Num mapa, o PT ganharia em 29 distritos, e o PSDB, em 26. No outro, os tucanos venceriam em 28, e os petistas, em 27.
O PT foi o único grande partido que cresceu consistentemente nos últimos 15 anos nos municípios. Entre 2000 e 2014, dobrou o número de vereadores e triplicou o de prefeitos. Tornou-se, ao mesmo tempo, o maior aliado (via coligações) e o maior adversário do PMDB, o então rei absoluto do municipalismo. Esse ciclo acabou. E o que ocupará o seu lugar ainda é incerto.
04 de maio de 2015
José Roberto de Toledo
Nenhum comentário:
Postar um comentário