"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 5 de março de 2014

DIGNÍSSIMO PATIFE (Versão 2014)



 
Digníssimo patife,

Pelo presente instrumento, venho dirigir-me a vossa excelência. Com minúsculas e na segunda pessoa, pessoa de segunda que és, mauricinho de nariz empertigado. Tu, que te ocultas, sorrateiro, por trás dessa impecável e pretíssima toga de bosta. Tu que recebes aprumado a reverência do povo de joelhos à espera de tuas soberanas e irretocáveis decisões peremptórias. Tu que por horas discorres pausada e enfadonhamente em rede nacional teu arrazoado ululante. Tu que estás imbuído da divina prerrogativa, intransferível e vitalícia, de julgar e decidir o destino dos homens que habitam o mun­do dos vivos, já que o dos mortos foge à tua jurisprudência, instância suprema à do teu supre­mo. Embora nutras anseios em manter paridade e equiparação divina com Aquele que exerce tal competência. Tu mesmo, nobre calhorda, que de tanto exercer o ofício de julgar os outros, julgas-te acima dos outros.

Venho oficiar-te, honorável canalha, que vejo mais retidão e honra na palavra espontânea e honesta que brota do coração de um humilde iletrado do que no alfarrábio que sustém tuas áridas, infindáveis, mirabolantes e ordinárias sentenças. As mesmas que revestes, impávido, em capa dura, fazendo-as constar com letras doura­das dos anais que ostentas nas prateleiras intermináveis onde expões tua soberba grandiloquência farisaica e tua rocambo­lesca sapiência estéril.

Amealhas com vileza recursos tomados do povo injuriado para manter intacto esse intrincado e indecifrável sistema, tão inócuo quanto iníquo, que qualificas cinicamente de Justiça, a fim de cobrir com aura de magnificência e infalibilidade essa espeta­culosa e suntuosa pantomima patética e embusteira a fim de deixar boquiabertas as legiões dos sem-justiça desse país, mantendo­-os sob o jugo do teu julgar.

Sai da tocaia, egrégio velhaco. Desce desse palácio de letras, capítulos, parágrafos, alíneas, incisos, caputs e cláusulas em que te enclausuras. Cumpre salientar, excelentíssimo pústula, que permanecem livres e soltos, zombando de nossa cara e articulando novas tramoias os corruptos que pomposamente livrastes das masmorras. Não por um senti­mento benevolente de perdão ou por uma crença abnegada no poder de recuperação humana mas por um displicente pragmatismo jurídico que mantém todos inimputáveis.

Sob o manto do teu garganteado ‘estado de direito’ malfeitores de todas as espécies ascenderam aos postos de direção com a tua serena condescendência. Mais: com a tua cruel cumplicidade. São estes que tratas com a mais alta leniência, amparando-os com a força irrefutável da lei, draconiana indulgência e into­lerância zero. Cobrindo a impunidade com o manto legalista da imu­nidade. “Por falta de provas”, provas.

Todo teu empenho é de não punir. Inocentes ou culpa­dos, pouco importa. ‘In dubio pro reo’, desde que tuas sagradas mordomias permaneçam intocadas e teus honorá­rios quitados ‘in specie’ com correção, exatidão, integri­dade e... justiça.

E assim, por todos os pretextos, vais libertan­do das grades todos os poderosos tubarões, reservando os horrores dos calabouços aos despossuídos que não participam do pecúlio que sustenta a devassidão moral que apadrinhas, consagrando desavergonhadamente esse país como o paraíso da impunidade.

Deixa de hipocrisia. A quem pretendes enganar dizen­do que és a fonte da Justiça? Teu ofício é apenas advogar em prol de vermes, devolvendo­-lhes em serviços pérfidos o peso do ouro que repassam a teus confrades. A justiça é o contrário de ti. É tornar o mundo decente, com as pessoas podendo se olhar de frente, confian­do umas nas outras. Prescindindo de teus sórdidos préstimos.

Justiça seja feita: quem te sustenta, respeitável biltre, são apenas os safados. Crápulas que, dispensando nobres considerações morais, estudam teus intrincados preceitos e se formam doutores para assimilar os meios legais, penais, constitucionais e amorais de permanecer impunes e qualificarem-se a ingressar em tuas ro­dinhas infames.

Os princípios de retidão e civilidade estão dentro de nós (e fora de ti). Num mundo de justos, tua justiça não se ajusta. Justamente!

Data vênia, vai pra p(*) que te pariu.
 
05 de março de 2014
Sérgio Sayeg
in blog o que de mim sou eu

Nenhum comentário:

Postar um comentário