Nos últimos seis anos, uma rotina inalterável abriu as semanas de trabalho da secretária Maria Lúcia Guimarães Tavares: toda manhã de segunda, imprimia de sua agenda do computador, na sede da Odebrecht, em Salvador (BA), uma planilha com requisições para entregas de dinheiro da semana. Era propina e caixa-2 para políticos e agentes públicos, em troca de favores e contratos públicos, em especial, da Petrobrás, de obras de usinas de energia, de metrô e de estádios da Copa 2014.
A Odebrecht montou uma estrutura financeira paralela para operacionalizar os repasses de propinas. Chamados de “prestadores de serviços”, esses operadores financeiros teriam movimentado mais de R$ 1 bilhão, entre 2004 e 2014, só em contratos com a Petrobrás, estima a força-tarefa da Operação Lava Jato.
São operadores do mercado financeiro legal, doleiros, lobistas e ex-executivos que trabalhavam fora dos quadros da Odebrecht, mas vinculados ao Setor de Operação Estruturadas – departamento do grupo que cuidava dos repasses da corrupção a políticos e agentes públicos.
CONTAS SECRETAS – Foram os chamados “prestadores de serviços” que mantiveram em funcionamento, por mais de dez anos, a estrutura de contas secretas em nome de empresas offshores (que existiam no papel, com sede fora do Brasil), usadas para movimentação de dinheiro de propina, e que faziam transferências no exterior e também entregas de moeda em espécie.
O ofício primordial do início das semanas de trabalho da secretária Maria Lúcia era colocar em funcionamento essa equipe de “prestadores de serviços”. Ao mesmo tempo que afastavam a Odebrecht da origem dos valores, dissimulavam os repasses para efetivar pagamentos aos corrompidos – uma lista de políticos do PT, PMDB e PSDB, entre outros.
A sistemática de funcionamento dos operadores de propina e o detalhamento do papel desempenhado por cada um integram a lista de revelações a serem feitas nas delações premiadas e no acordo de leniência, fechados há dez dias pela Odebrecht com a força-tarefa da Operação Lava Jato.
MAIS DEPOIMENTOS – Depois de nove meses de tratativas, os 77 executivos e ex-executivos do grupo começarão, nesta segunda-feira, 12, a serem ouvidos por procuradores da República, na fase final do acordo, antes dele ser enviado para o Supremo Tribunal Federal (STF) para ser homologado pelo ministro Teori Zavascki, relator da Lava Jato – o que deve acontecer em março de 2017.
A secretária Maria Lúcia trabalhou no “departamento de propinas” de 2006 a 2015. Era ela que controlava as execuções de pagamentos em dinheiro vivo. Sua prisão, em março, e o acordo de delação fechado com a Lava Jato – à revelia dos patrões – levaram executivos do grupo a buscar a colaboração com os investigadores como única saída para amenizar as penas aplicadas pelo juiz federal Sérgio Moro, dos processos de primeira instância do caso, em Curitiba.
No acordo, a Odebrecht concordou em devolver US$ 2,5 bilhões aos cofres públicos pelos crimes de corrupção e lavagem descobertos na Petrobrás e em outros contratos públicos. Marcelo Odebrecht teve a mais dura pena dos 70 delatores da Lava Jato – sem contar os da empreiteira -, dez anos de prisão, sendo dois anos e meio em regime fechado.
12 de dezembro de 2016
Ricardo Brandt, Fábio Serapião, Fausto Macedo e Julia Affonso
Estadão
Nenhum comentário:
Postar um comentário