Em sua última coluna, Elio Gaspari "psicografou" um bilhete do Barão do Rio Branco para o Presidente Michel Temer.
No bilhete, o Barão advertia para o fato de que, em menos de seis meses, a diplomacia do atual governo havia "encrencado" com cinco países latino-americanos.
Para Rio Branco, o comportamento mais assertivo do Brasil em relação a esses vizinhos seria contrário aos interesses nacionais, uma vez que, na América do Sul, "precisamos ser um fator de moderação."
O Barão imaginário se referia à recente reação do Itamaraty a comentários de governos que questionaram a legitimidade e a legalidade da presidência de Michel Temer.
Os termos das respostas da chancelaria brasileira foram considerados fortes para a tradição diplomática do país.
No entanto —deve-se notar— adotaram tom mais sóbrio e conciliatório que o dos ataques ao Brasil.
Em protesto ao impeachment de Dilma Rousseff e à efetivação de Michel Temer, os governos de Bolívia, Equador e Venezuela resolveram retirar seus embaixadores no Brasil. Em diplomacia, retirar embaixador é um ato muito simbólico. Traduzido para as relações humanas, significaria: "não quero mais papo com você". Considerando-se a densidade histórica das relações do Brasil com seus vizinhos, vê-se que a situação é séria.
Mas criticar publicamente a legitimidade de um governo recém-investido —ainda mais em um país vizinho— também é sério e simbólico. Sobretudo quando a rejeição ao impeachment de Dilma agrega a seu viés ideológico a defesa de benefícios conseguidos junto a um governo outrora generoso com países "ideologicamente amigos".
Nesse contexto, a reação adversa dos governos de Bolívia, Equador e Venezuela representa um ato de autodefesa e frustração, diante do fato de que fontes de financiamento vão começar a minguar, e de que a influência de Caracas, Havana e La Paz sobre o curso da política externa brasileira —tão presente e perceptível no governo Dilma— se encerrou.
Depois de ter visto senadores constrangidos nas ruas de Caracas, ter permitido que sua embaixada funcionasse como cárcere terceirizado para preso político e ter "perdido" refinarias na Bolívia, o Brasil encontra-se em momento de inflexão.
Precisa dar um reboot em suas relações com os bolivarianos. Deve mostrar quem é.
O Rio Branco psicografado acredita que, ao agir com firmeza e assumir discurso combativo, o Brasil correria o risco de se indispor e perder a posição de mediador que sempre teve no continente.
Mas como não ser combativo quando o que está em questão é a própria legitimidade do governo que se representa, ou, em outras palavras, o exercício da soberania nacional no exterior?
Para os tempos que correm, o Brasil adota o discurso diplomático adequado. Diante das críticas deselegantes e desinformadas por figuras lamentáveis como Nicolás Maduro, como deveria agir o governo brasileiro? Qual teria sido a alternativa ao discurso do Itamaraty? Fingir que não é com a gente?
O Brasil é um país grande. O que nos desautorizaria mais como mediadores? Falar grosso ou não ter voz?
06 de setembro de 2016
Alexandre Vidal Porto, Folha de SP
No bilhete, o Barão advertia para o fato de que, em menos de seis meses, a diplomacia do atual governo havia "encrencado" com cinco países latino-americanos.
Para Rio Branco, o comportamento mais assertivo do Brasil em relação a esses vizinhos seria contrário aos interesses nacionais, uma vez que, na América do Sul, "precisamos ser um fator de moderação."
O Barão imaginário se referia à recente reação do Itamaraty a comentários de governos que questionaram a legitimidade e a legalidade da presidência de Michel Temer.
Os termos das respostas da chancelaria brasileira foram considerados fortes para a tradição diplomática do país.
No entanto —deve-se notar— adotaram tom mais sóbrio e conciliatório que o dos ataques ao Brasil.
Em protesto ao impeachment de Dilma Rousseff e à efetivação de Michel Temer, os governos de Bolívia, Equador e Venezuela resolveram retirar seus embaixadores no Brasil. Em diplomacia, retirar embaixador é um ato muito simbólico. Traduzido para as relações humanas, significaria: "não quero mais papo com você". Considerando-se a densidade histórica das relações do Brasil com seus vizinhos, vê-se que a situação é séria.
Mas criticar publicamente a legitimidade de um governo recém-investido —ainda mais em um país vizinho— também é sério e simbólico. Sobretudo quando a rejeição ao impeachment de Dilma agrega a seu viés ideológico a defesa de benefícios conseguidos junto a um governo outrora generoso com países "ideologicamente amigos".
Nesse contexto, a reação adversa dos governos de Bolívia, Equador e Venezuela representa um ato de autodefesa e frustração, diante do fato de que fontes de financiamento vão começar a minguar, e de que a influência de Caracas, Havana e La Paz sobre o curso da política externa brasileira —tão presente e perceptível no governo Dilma— se encerrou.
Depois de ter visto senadores constrangidos nas ruas de Caracas, ter permitido que sua embaixada funcionasse como cárcere terceirizado para preso político e ter "perdido" refinarias na Bolívia, o Brasil encontra-se em momento de inflexão.
Precisa dar um reboot em suas relações com os bolivarianos. Deve mostrar quem é.
O Rio Branco psicografado acredita que, ao agir com firmeza e assumir discurso combativo, o Brasil correria o risco de se indispor e perder a posição de mediador que sempre teve no continente.
Mas como não ser combativo quando o que está em questão é a própria legitimidade do governo que se representa, ou, em outras palavras, o exercício da soberania nacional no exterior?
Para os tempos que correm, o Brasil adota o discurso diplomático adequado. Diante das críticas deselegantes e desinformadas por figuras lamentáveis como Nicolás Maduro, como deveria agir o governo brasileiro? Qual teria sido a alternativa ao discurso do Itamaraty? Fingir que não é com a gente?
O Brasil é um país grande. O que nos desautorizaria mais como mediadores? Falar grosso ou não ter voz?
06 de setembro de 2016
Alexandre Vidal Porto, Folha de SP
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