“Em política nada se perde e nada se transforma — tudo se corrompe.” Millôr Fernandes
Ao mirar em Temer, delação de Odebrecht mostra que crise política está longe do fim. O que poderá acontecer caso se confirme que Marcelo Odebrecht, ex-presidente da empreiteira que carrega seu sobrenome, doou ao PMDB R$ 10 milhões em dinheiro vivo e não declarado nem por ele nem pelo partido à Justiça? E que o fez a pedido de Michel Temer, na época presidente do PMDB e vice-presidente da República, com quem Marcelo teria se reunido em Brasília a poucos meses das eleições de 2014?
EM SUA mais recente edição, a revista “Veja” informa que teve acesso a um anexo da delação premiada de Marcelo à Lava-Jato. E que nele está dito que, em maio de 2014, houve um jantar no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente da República, presentes Temer, o então deputado Eliseu Padilha, atual ministro-chefe da Casa Civil, e Marcelo. Na ocasião, Temer teria pedido “apoio financeiro” da empreiteira ao PMDB.
A ODEBRECHT, segundo Marcelo, repassou R$ 10 milhões ao partido — R$ 4 milhões entregues a Padilha e R$ 6 milhões endereçados a Paulo Skaf, o candidato do PMDB ao governo de São Paulo naquele ano, com o apoio de Temer. O dinheiro foi registrado na contabilidade do setor da Odebrecht conhecido como “departamento de propina”. Sim, havia um só para isso.
EM NOTA enviada à “Veja”, Temer admite que jantou com Marcelo e que ele e o empresário conversaram “sobre auxílio financeiro da construtora Odebrecht a campanhas eleitorais do PMDB, em absoluto acordo com a legislação eleitoral em vigor e conforme foi depois declarado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE)”. Consta no TSE que em 2014 a Odebrecht doou ao PMDB R$ 11,3 milhões. Teria sido a isso que se referiu Marcelo em sua delação?
TUDO INDICA que não. Marcelo insiste, na delação, que os R$ 10 milhões (não R$ 11,3 milhões) saíram em dinheiro vivo do “caixa paralelo” da Odebrecht. Se mentiu ou se a Lava-Jato não achar provas do que ele disse, a delação será recusada. E Marcelo, já condenado a 19 anos e quatro meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, não terá sua pena reduzida. Ele está preso há quase 14 meses. O que ganharia mentindo?
ESTA É A segunda vez em que Temer é citado por delatores da Lava-Jato. O primeiro a citá-lo foi Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro. Em 2012, de acordo com Machado, ele e Temer se encontraram na Base Aérea de Brasília. Temer teria pedido ajuda para a campanha de Gabriel Chalita, candidato do PMDB a prefeito de São Paulo. A ajuda de R$ 1,5 milhão foi dada pela empreiteira Queiroz Galvão, envolvida no roubo à Petrobras.
“O CONTEXTO da conversa deixava claro que o que Michel Temer estava ajustando com o depoente era que este solicitasse recursos ilícitos das empresas que tinham contratos com a Transpetro na forma de doação oficial para a campanha de Chalita”, revelou Machado. Temer negou que tivesse pedido algo a ele. Quanto ao encontro na Base Aérea, respondeu que não se lembrava.
MESMO QUE se prove o que Marcelo contou em sua delação, dificilmente Temer será processado. Se houve crime, ele o cometeu antes de ser reeleito vice-presidente em outubro de 2014. A partir do próximo mês, com a cassação do mandato de Dilma pelo Senado, Temer deixará de ser interino para se transformar de fato em presidente da República. Mas não é disso que se trata.
COM POPULARIDADE baixa, obrigado a promover duros ajustes na economia, como Temer conseguiria governar uma vez acusado de crime de caixa dois? A crise política parece longe de ser superada.
09 de agosto de 2016
Ricardo Noblat, O Globo
Ao mirar em Temer, delação de Odebrecht mostra que crise política está longe do fim. O que poderá acontecer caso se confirme que Marcelo Odebrecht, ex-presidente da empreiteira que carrega seu sobrenome, doou ao PMDB R$ 10 milhões em dinheiro vivo e não declarado nem por ele nem pelo partido à Justiça? E que o fez a pedido de Michel Temer, na época presidente do PMDB e vice-presidente da República, com quem Marcelo teria se reunido em Brasília a poucos meses das eleições de 2014?
EM SUA mais recente edição, a revista “Veja” informa que teve acesso a um anexo da delação premiada de Marcelo à Lava-Jato. E que nele está dito que, em maio de 2014, houve um jantar no Palácio do Jaburu, residência oficial do vice-presidente da República, presentes Temer, o então deputado Eliseu Padilha, atual ministro-chefe da Casa Civil, e Marcelo. Na ocasião, Temer teria pedido “apoio financeiro” da empreiteira ao PMDB.
A ODEBRECHT, segundo Marcelo, repassou R$ 10 milhões ao partido — R$ 4 milhões entregues a Padilha e R$ 6 milhões endereçados a Paulo Skaf, o candidato do PMDB ao governo de São Paulo naquele ano, com o apoio de Temer. O dinheiro foi registrado na contabilidade do setor da Odebrecht conhecido como “departamento de propina”. Sim, havia um só para isso.
EM NOTA enviada à “Veja”, Temer admite que jantou com Marcelo e que ele e o empresário conversaram “sobre auxílio financeiro da construtora Odebrecht a campanhas eleitorais do PMDB, em absoluto acordo com a legislação eleitoral em vigor e conforme foi depois declarado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE)”. Consta no TSE que em 2014 a Odebrecht doou ao PMDB R$ 11,3 milhões. Teria sido a isso que se referiu Marcelo em sua delação?
TUDO INDICA que não. Marcelo insiste, na delação, que os R$ 10 milhões (não R$ 11,3 milhões) saíram em dinheiro vivo do “caixa paralelo” da Odebrecht. Se mentiu ou se a Lava-Jato não achar provas do que ele disse, a delação será recusada. E Marcelo, já condenado a 19 anos e quatro meses de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, não terá sua pena reduzida. Ele está preso há quase 14 meses. O que ganharia mentindo?
ESTA É A segunda vez em que Temer é citado por delatores da Lava-Jato. O primeiro a citá-lo foi Sérgio Machado, ex-presidente da Transpetro. Em 2012, de acordo com Machado, ele e Temer se encontraram na Base Aérea de Brasília. Temer teria pedido ajuda para a campanha de Gabriel Chalita, candidato do PMDB a prefeito de São Paulo. A ajuda de R$ 1,5 milhão foi dada pela empreiteira Queiroz Galvão, envolvida no roubo à Petrobras.
“O CONTEXTO da conversa deixava claro que o que Michel Temer estava ajustando com o depoente era que este solicitasse recursos ilícitos das empresas que tinham contratos com a Transpetro na forma de doação oficial para a campanha de Chalita”, revelou Machado. Temer negou que tivesse pedido algo a ele. Quanto ao encontro na Base Aérea, respondeu que não se lembrava.
MESMO QUE se prove o que Marcelo contou em sua delação, dificilmente Temer será processado. Se houve crime, ele o cometeu antes de ser reeleito vice-presidente em outubro de 2014. A partir do próximo mês, com a cassação do mandato de Dilma pelo Senado, Temer deixará de ser interino para se transformar de fato em presidente da República. Mas não é disso que se trata.
COM POPULARIDADE baixa, obrigado a promover duros ajustes na economia, como Temer conseguiria governar uma vez acusado de crime de caixa dois? A crise política parece longe de ser superada.
09 de agosto de 2016
Ricardo Noblat, O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário