Governo precisa fazer política, conversando com todos, inclusive a oposição, porque a estabilidade econômica e política interessa a toda a sociedade
O panelaço que acompanhou na noite de domingo o pronunciamento à nação da presidente Dilma Rousseff, em regiões de cidades importantes como São Paulo, Rio e Belo Horizonte, continuou a ecoar segunda-feira.
Interpretar a manifestação como uma tentativa antidemocrática de um “terceiro turno” para as eleições do ano passado, termo empregado por Dilma e o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, é de nenhuma valia para o governo. Afinal, tanto a presidente quanto o ministro reconheceram, e não poderia ser diferente, que está em vigor a plena liberdade de manifestação.
Se não passa de insensatez de minorias desprezíveis conspirar contra uma presidente eleita e empossada sem contestações formais, cabe ao Planalto interpretar sem devaneios a mensagem transmitida na noite de domingo.
Culpar a “burguesia”, a “elite branca”, termos que fazem a alegria de militantes, fração ínfima da população, também em nada ajuda o Planalto. Queiram ou não, a barulheira feita em grandes cidades anteontem virou um fato político a ser considerado, e deveria levar o Palácio a uma reflexão sobre sua linha de comunicação com a sociedade.
O dramático resultado da pesquisa Datafolha sobre a popularidade de Dilma, realizada no início de fevereiro, já sinalizava para sérios ruídos nessa comunicação. Entre outros pontos, pesou na queda pela metade da popularidade da presidente em relação a dezembro — de 42% para 23% — o fato de ter sido constatado que ela disse uma coisa na campanha e, reeleita, passou a fazer outra.
Diante disso, embora defendesse, com acerto, o ajuste fiscal, não foi boa a ideia de insistir na inverosímil explicação de que a crise atual se deve aos ombros cada vez mais largos de uma “crise internacional” somada à seca. Ora, a Europa continua mesmo a patinar e a China cresce “apenas” a 7,5%, mas os Estados Unidos aceleram a recuperação, com a criação de centenas de milhares de empregos a cada trimestre. O Brasil do primeiro governo Dilma é que errou de política econômica, a qual a presidente tenta agora rever, e ainda bem.
Dilma demora a se curvar à necessidade de fazer política. Convocar o vice-presidente Michel Temer, do PMDB, para de fato auxiliar nesse campo é urgente. A chegada dele ajudará no manejo do quadro potencialmente grave de um Congresso sem Norte, em que seus principais dirigentes, os peemedebistas senador Renan Calheiros (AL) e Eduardo Cunha (RJ), com pedidos de inquérito no Supremo para serem investigados no petrolão, ameaçam usar a instituição em defesa própria, algo inaceitável.
O foco precisa ser a contribuição do Congresso ao ajuste nas contas públicas. Usar o cargo para ameaçar o Ministério Público com retaliações típicas do baixo clero é não entender o momento do país. Porém, para contornar esses obstáculos, o Planalto precisa dialogar, e com todos os partidos, incluindo o PSDB. A estabilidade econômica e política interessa a toda a sociedade.
11 de março de 2015
Editorial O Globo
O panelaço que acompanhou na noite de domingo o pronunciamento à nação da presidente Dilma Rousseff, em regiões de cidades importantes como São Paulo, Rio e Belo Horizonte, continuou a ecoar segunda-feira.
Interpretar a manifestação como uma tentativa antidemocrática de um “terceiro turno” para as eleições do ano passado, termo empregado por Dilma e o ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, é de nenhuma valia para o governo. Afinal, tanto a presidente quanto o ministro reconheceram, e não poderia ser diferente, que está em vigor a plena liberdade de manifestação.
Se não passa de insensatez de minorias desprezíveis conspirar contra uma presidente eleita e empossada sem contestações formais, cabe ao Planalto interpretar sem devaneios a mensagem transmitida na noite de domingo.
Culpar a “burguesia”, a “elite branca”, termos que fazem a alegria de militantes, fração ínfima da população, também em nada ajuda o Planalto. Queiram ou não, a barulheira feita em grandes cidades anteontem virou um fato político a ser considerado, e deveria levar o Palácio a uma reflexão sobre sua linha de comunicação com a sociedade.
O dramático resultado da pesquisa Datafolha sobre a popularidade de Dilma, realizada no início de fevereiro, já sinalizava para sérios ruídos nessa comunicação. Entre outros pontos, pesou na queda pela metade da popularidade da presidente em relação a dezembro — de 42% para 23% — o fato de ter sido constatado que ela disse uma coisa na campanha e, reeleita, passou a fazer outra.
Diante disso, embora defendesse, com acerto, o ajuste fiscal, não foi boa a ideia de insistir na inverosímil explicação de que a crise atual se deve aos ombros cada vez mais largos de uma “crise internacional” somada à seca. Ora, a Europa continua mesmo a patinar e a China cresce “apenas” a 7,5%, mas os Estados Unidos aceleram a recuperação, com a criação de centenas de milhares de empregos a cada trimestre. O Brasil do primeiro governo Dilma é que errou de política econômica, a qual a presidente tenta agora rever, e ainda bem.
Dilma demora a se curvar à necessidade de fazer política. Convocar o vice-presidente Michel Temer, do PMDB, para de fato auxiliar nesse campo é urgente. A chegada dele ajudará no manejo do quadro potencialmente grave de um Congresso sem Norte, em que seus principais dirigentes, os peemedebistas senador Renan Calheiros (AL) e Eduardo Cunha (RJ), com pedidos de inquérito no Supremo para serem investigados no petrolão, ameaçam usar a instituição em defesa própria, algo inaceitável.
O foco precisa ser a contribuição do Congresso ao ajuste nas contas públicas. Usar o cargo para ameaçar o Ministério Público com retaliações típicas do baixo clero é não entender o momento do país. Porém, para contornar esses obstáculos, o Planalto precisa dialogar, e com todos os partidos, incluindo o PSDB. A estabilidade econômica e política interessa a toda a sociedade.
11 de março de 2015
Editorial O Globo
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