Mary Anastasia O'Grady, editora do Wall Street Journal para assuntos latino-americanos, faz uma análise impiedosa da vitória de Dilma nas eleições do dia 26 de outubro. Essa vitória não se deveu apenas ao generoso assistencialismo do governo petista, mas contou também com o apoio de "uma classe alta formada por eleitores urbanos de esquerda, que se sentem virtuosos em defender a intervenção estatal na vida dos outros e ajudar a ditadura cubana".
O artigo da jornalista norte-americana foi publicado no dia 28, comentando também a criação dos "conselhos populares" - finalmente derrubada pela Câmara dois dias depois. O provável, diz ela, é que Dilma nada mude, assegurando por mais quatro anos a "já tradicional reputação do Brasil para mediocridade":
Recessão econômica, inflação de preços acumulada em 6,7% nos últimos 12 meses e um audacioso esquema de corrupção na estatal Petrobras não foram suficientes para negar à presidente Dilma Rousseff, do PT, a reeleição para um segundo mandato. Ela derrotou seu desafiante Aécio Neves, do Partido da Social Democracia Brasileira, por 51,63% a 48,36%. A campanha de Dilma baseou-se em uma plataforma anti-mercado e pró-assistencialismo, o que ajuda a explicar por que ela se saiu muito melhor nas regiões mais pobres e dependentes de auxílios do governo do que nas regiões prósperas voltadas para o agronegócio, como o sul e o centro-oeste, e na maior cidade brasileira, onde a economia se baseia majoritariamente no setor de serviços e em indústrias de alto valor agregado.
Assim como nos EUA, o Brasil também possui uma classe alta formada por eleitores urbanos de esquerda, que se sentem virtuosos em defender a intervenção estatal na vida de outras pessoas e em ajudar a ditadura cubana. Porém, existe também um Brasil mais ambicioso, o qual é formado por empreendedores que se arriscam, por agropecuaristas competitivos globalmente e por uma ascendente classe média que anseia enormemente por uma maior integração com o resto do mundo. Esses brasileiros queriam desesperadamente uma mudança para mais mercado e mais capitalismo, e viram no candidato Aécio Neves um representante mais próximo dessa mudança. Foram esses brasileiros que fizeram com que as eleições presidenciais do último domingo fossem a mais apertada da história do Brasil.
Com esse resultado apertado, Dilma tem agora de descobrir o que fará com seus próximos quatro anos. De um lado, ela pode imaginar ser possível consolidar o poder do PT — seu objetivo supremo — dando continuidade às políticas que utilizou até agora, não importa os custos para a economia. Alternativamente, ela pode optar por fazer ajustes econômicos pragmáticos com o objetivo de restaurar a confiança e o crescimento.
Essa última opção é até possível, mas é bem improvável, pois os militantes do seu partido, que ganharam poderes e engordaram suas contas bancárias durante os governos do PT, querem ainda mais poder, e não menos. Dilma pode até fazer algumas declarações aparentemente conciliatórias e, no curto prazo, implantar algumas medidas em prol de um pouco mais de liberdade econômica, como fez seu mentor Lula nos primeiros anos de seu governo, quando ele tinha o objetivo de acalmar os mercados que estavam em queda por temor de seu novo governo. Uma vez alcançado esse objetivo, no entanto, Lula voltou para a esquerda.
As chances são de que Dilma fará o mesmo, assegurando por mais quatro anos a já tradicional reputação do Brasil para a mediocridade. Somente se uma investigação criminal comprovar que Dilma e Lula sabiam sobre o esquema de corrupção na Petrobras é que as coisas podem se alterar substantivamente.
A grande ironia da campanha eleitoral é que, enquanto Dilma e Lula reivindicavam todo o crédito pelo crescimento econômico que o Brasil vivenciou na década de 2000, ambos se opuseram às reformas estruturais ocorridas na década de 1990. A privatização de empresas estatais, a abertura (ainda que limitada) da economia brasileira à concorrência estrangeira, e a reforma monetária de 1994, que criou o real e acabou com a hiperinflação — todas essas medidas estimularam o desenvolvimento e, devido a essa geração de riqueza, possibilitaram a criação de programas assistencialistas mais generosos, os quais são a marca registrada do PT.
Não fossem essas reformas da década de 1990 — às quais o PT se opôs —, não haveria chances de sucesso para os subsequentes governos do PT na década de 2000.
O problema é que o PT não quis aprofundar essas reformas, e a consequência é que o "milagre brasileiro" morreu no berço. Na mais generosa das avaliações, o país é visto hoje como apenas mais um entre vários países em desenvolvimento; já na maioria das vezes, ele é visto lá no fim da fila.
Nem Lula e nem Dilma parecem se preocupar com desenvolvimento econômico. De acordo com um relatório do Goldman Sachs, de 2004 a 2013, os gastos do governo cresceram a um ritmo de 8% ao ano, em termos reais, o que representou um crescimento mais de duas vezes maior do que o crescimento do PIB. A inflação de preços está hoje em quase 7% ao ano para aqueles bens e serviços cujos preços não são controlados pelo governo. E quando se considera apenas o setor de serviços, a inflação de preços está em 8,6% ao ano. Para piorar, as expectativas quanto à inflação futura estão se deteriorando.
Dilma imaginou que poderia conter a carestia congelando o preço da gasolina, a qual é ofertada pela Petrobras, e o preço do etanol, o qual é ofertado por usineiros locais e utilizado por carros flexíveis em combustível. No entanto, dado que os custos de produção continuaram aumentando (por causa da inflação crescente), a Petrobras e o setor sucroalcooleiro estão incorrendo em severos prejuízos. Várias usinas de álcool já faliram e várias outras estão por falir. Elas não sobreviverão caso essa política de congelamento de preços continue.
O PT se gaba de ajudar os pobres com políticas assistencialistas, mas a mesma mão que dá é aquela que tira — e a mão que tira é a mais pesada. O aumento do protecionismo, os pesados encargos sociais e trabalhistas que oneram a folha de pagamento das empresas, os altos impostos sobre o consumo, uma infraestrutura em frangalhos, e as inflexíveis leis trabalhistas geram custos que impedem o aumento dos salários e que fazem com que o padrão de vida dos brasileiros esteja muito aquém do seu potencial.
Ainda mais preocupante é o estrago que o PT pode fazer com as instituições e com o estado de direito ao longo dos próximos 48 meses. A sociedade civil brasileira é uma forte defensora das liberdades civis e do pluralismo. No entanto, como um sagaz empresário me confidenciou, "Estamos vivenciando, passo a passo, uma tendência rumo à Argentina, à Bolívia e ao Equador". Um exemplo é o decreto de maio, assinado por Dilma, que cria os "conselhos populares", os quais criariam um modelo semelhante ao que já existe na Venezuela. Até o momento, o Congresso vem oferecendo resistência. Porém, se o tradicional esquema de compra de votos ocorrer, ele pode capitular.
Trata-se de uma perspectiva pavorosa para qualquer pessoa que conheça um pouco de história. Como já havia observado no século XVIII o filósofo David Hume: "A liberdade não é abolida de uma só vez; o processo ocorre em etapas."
Hoje, Dilma é apenas uma política que ganhou uma eleição. No futuro, os brasileiros podem aprender que o governo de um partido só e regras indefinidas são os verdadeiros projetos de longo prazo do PT.
(Instituto Mises).
02 de novembro de 2014
in orlando tambosi
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