"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

A POLÍTICA ENTRE A UTOPIA E A REALIDADE DO SEU EXERCÍCIO

           

 
Antes de abordarmos, sucintamente, a questão complexa da política, faz-se mister distinguir, como já fizemos em artigo anterior, a Política com P maiúsculo, que é a busca comum do bem comum, da política com p minúsculo, que consiste na política partidária, que, como a palavra sugere, é parte, e não o todo.
 
Importa ainda conscientizar o fato de que a política, mais que qualquer outra realidade, participa da ambiguidade inerente à condição humana que nos faz simultaneamente dementes e sapientes. Por isso, por um lado, dizem os papas, a política é a mais alta forma do amor e, por outro, contém deformações lamentáveis, como o patrimonialismo e a corrupção.
 
Daí viver a política em permanente crise. A nossa é de baixa intensidade, pois o povo não se sente representado pelos parlamentares. Mas ela pode sempre melhorar e transformar-se. O ideal é que cheguemos a uma democracia sem fim, um projeto sempre inacabado porque sempre perfectível.
 
Não secundamos um pragmatismo preguiçoso, sem sonhos e destituído de vontade de aperfeiçoamento. Infelizmente, essa é a tendência dominante, particularmente no quadro da pós-modernidade. E está contaminando os jovens.
 
É PRECISO SONHAR
 
Entretanto, uma pessoa ou uma sociedade que já não sonham e que não se orientam por utopias escolheram o caminho de sua decadência e de seu desaparecimento. Sem utopia não se alimenta a esperança, e o desfecho fatal é a autodestruição. A utopia nos faz andar. Jamais alcançaremos as estrelas.
Mas que seriam nossas noites sem elas? Porque temos estrelas, não tememos a escuridão.
Precisamos, portanto, de uma utopia para a política, para que desempenhe as funções pelas quais existe: organizar a sociedade, montar um Estado, distribuir os poderes e realizar a busca comum do bem comum para todos, sem privilégios e discriminações.
 
Isso vale tanto para a Política com P maiúsculo quanto para a política com p minúsculo. Ambas precisam incorporar a ética do bem comum, da responsabilidade coletiva, da transparência e da retidão em todos os negócios em que estão envolvidos os poderes públicos.
 
Quando confrontamos a política realmente existente com a utopia da política, notamos imensas contradições. Há um constrangimento poderoso que pesa sobre a política: o fato de a política hoje estar submetida à economia e ao mercado, que se regem por uma feroz competição, deixando totalmente à margem a cooperação e os valores da solidariedade. Isso faz com que os valores não materiais ocupem um lugar irrelevante quando não são feitos também mercadorias.
Ora, desses valores altamente positivos vive fundamentalmente a política que se entende como prática da ética social.
 
REFORMA POLÍTICA
 
A Igreja Católica ajuda a criar uma ética pessoal, de retidão e integridade. Há políticos que incorporam essa ética (ética na política), mas ela não elaborou suficientemente uma ética social e política que trabalhe as instituições, os braços longos do poder (que devem ser transparentes) e um serviço público. É nesse campo que ocorrem as perversões da política. Especialmente grave é o financiamento privado das eleições, que se traduz por troca de favores e implica alta corrupção.
 
No Brasil, com tradição patrimonialista, o político facilmente considera seu o bem público e se apropria dele sem maiores escrúpulos. É roubo do pão que falta na mesa do pobre, é livro que o estudante não tem, é remédio inacessível ao enfermo necessitado.
A desejada reforma política reintroduziria a ética na política. Para Aristóteles, política e ética eram sinônimos.
 
15 de outubro de 2014
Leonardo Boff

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