"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 22 de janeiro de 2014

PARA TOLERAR, ANTES É PRECISO DISCRIMINAR. OU: A INTOLERÂNCIA DOS "TOLERANTES"


“Quando a palavra de ordem ‘diversidade’ é usada, todas as células do cérebro devem supostamente parar de funcionar, para que um brilho rosado de sentimento possa assumir”. (Thomas Sowell)
 
O discurso típico da esquerda politicamente correta é sempre a favor de mais “tolerância”, do fim dos “preconceitos”, e enaltecendo a “diversidade”. Contudo, poucos são mais dogmáticos e intolerantes com as divergências do que os ícones dessa mesma esquerda. Basta ver o que falam dos liberais e conservadores. Por que?
 
Deixando de lado fatores morais, como a hipocrisia ou a canalhice, acredito que um erro básico de premissa possa ajudar a explicar o estranho fenômeno. O horror que essa gente sente de qualquer tipo de discriminação leva a essa intolerância. Explico melhor.
 
Só pode haver tolerância quando, antes, há discriminação. Falo aqui da etimologia da palavra latina discriminare, ou fazer distinção, aperceber-se das diferenças. Discriminar é, acima de tudo, separar com base em algum critério. E isso é fundamental para a existência da verdadeira tolerância.
 
Sim, é verdade que muitos passaram a usar a palavra discriminação apenas com seu sentido pejorativo, de tratar de forma injusta um grupo de pessoas com base em preconceitos étnicos ou raciais. Mas lido aqui com seu sentido original, que é focar nas diferenças, ou mesmo tratar de forma desigual, o que não é sinônimo de injustiça (tratar um criminoso e uma pessoa decente da mesma forma é que seria injusto).
 
Quando coloca-se uma faixa etária para determinado filme, está se discriminando. Quando há uma idade mínima para dirigir ou votar, isso é uma discriminação. Quando uma empresa de seguro cobra preços diferentes para idosos e jovens, isso é discriminação. Quando alguém seleciona um grupo de amigos para convidar para sua festa, isso é discriminação.
 
Em resumo, discriminar é parte essencial de nossas vidas. Cada um terá seu critério, e alguns serão mais nobres do que outros. Quem discrimina com base em julgamentos morais de comportamento, por exemplo, age melhor do que quem discrimina com base em aspectos genéticos ou pelas aparências. Mas todos discriminam. A alternativa é ignorar todo tipo de diferença, inclusive a moral, e isso seria mortal – além de muito injusto para com os melhores.
 
Escrevi um texto alegando que existe superioridade cultural e moral sim, combatendo, portanto, o relativismo exacerbado de nosso tempo. E não é que teve um monte de gente revoltada, atacando-me, xingando-me, acusando-me… de ser inferior por defender isso?! Alguém me explica o paradoxo? Pode alguém que nega a existência da própria inferioridade acusar o outro de ser inferior? Por coerência, nem mesmo Hitler ou Stalin seriam inferiores como seres humanos para essa gente.
 
O que nos remete à tolerância. A frase é atribuída a Voltaire, sobre Rousseau: “Não concordo com uma palavra do que dizes, mas defenderei até a morte teu direito de dizê-las”. Para chegar a esse ponto, antes foi preciso discriminar, ou seja, separar e julgar o outro.
 
O mundo de “absoluta” tolerância e ausência total de discriminação, pregado por parte da esquerda, seria, então, caótico. E seria, pasmem!, extremamente intolerante – como, de fato, essa ala esquerdista demonstra ser. Porque só há ausência de discriminação se todos forem… iguais! O sonho de toda utopia igualitária e coletivista: uma colônia de insetos gregários. Por isso tanto dogmatismo dessa turma: eles não toleram realmente as diferenças; eles odeiam os diferentes.
 
Os liberais e conservadores, ao contrário, compreendem que a vida em sociedade depende de discriminação. É um direito individual ou de um grupo discriminar, separar-se voluntariamente de outros que julgam inadequados para seu convívio, desde que haja tolerância aos demais. Podem tolerar porque discriminam. Aceitam a diversidade justamente porque não pretendem que todos sejam iguais.
 
A única exceção diz respeito ao alerta feito por Karl Popper: “Não devemos aceitar sem qualificação o princípio de tolerar os intolerantes senão corremos o risco de destruição de nós próprios e da própria atitude de tolerância”. Tolera-se as diferenças, a discriminação voluntária, pacífica; mas não se tolera os intolerantes dogmáticos que pretendem justamente destruir essa paz, essa segregação espontânea e natural.
 
Um exemplo para ilustrar melhor o ponto: alguém pode discriminar todo o grupo de homossexuais, por acreditar que vivem em pecado, que isso é imoral ou antinatural, por sentir aversão, o que for. Terá o direito de se afastar dos gays, não se misturar a eles se assim desejar (da mesma forma que os gays e demais terão todo o direito de achá-lo um imbecil).
 
Mas terá de tolerar a existência dos homossexuais, e essa tolerância virá justamente da discriminação que fez. Só não poderá, naturalmente, agredir alguém só porque é gay, o que seria intolerante. Aliás, não pode agredir ninguém pelo motivo que for, ponto. À exceção de legítima defesa, óbvio.
 
A esquerda mais intolerante não aceita isso, e deseja impor a esse sujeito uma diferença que ele rejeita. Ele estaria proibido de fazer tal discriminação e se segregar voluntariamente de quem não gosta. A segregação voluntária não é melhor do que a integração forçada? Quem é o verdadeiro intolerante nesse caso? O preconceituoso que se afasta voluntariamente de um grupo, ou o grupo que exige o fim dessa discriminação pacífica, ainda que à base da coerção, da força?
 
Espero ter deixado claro meu ponto. Da próxima vez que um amigo relativista alegar que condena qualquer discriminação, o leitor pode perguntar se ele convidaria um nazista para sua casa, em nome da absoluta “tolerância” às diferenças. Se ele disser que não, cairá em contradição; se ele disser que sim, tome muito cuidado com esse amigo…
 
22 de janeiro de 2014
rodrigo constantino

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