"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

A MORTE DE UMA NARRATIVA

Uma das coisas mais fascinantes na minha vida de analista político foi ver e ouvir o Lula discursando em várias reuniões do Conselhão. Era extraordinário como ele conseguia cativar a audiência com um discurso simples e direto, cheio de analogias com a vida real e que, de forma certeira, atingia o alvo.

Ao ouvi-lo, lembrava-me de meu pai, que dizia ser Lula um típico vendedor de feira do Nordeste. Uma retórica simples e, ao mesmo tempo, emocionante, que atingia o objetivo. Lula foi capaz de levar adiante seus dois governos com sua poderosa narrativa. E, com ela, convenceu a maioria da população de que Dilma Rousseff seria a candidata ideal para o país. 
Foi seu êxito final. Depois de eleger Dilma, Lula está no volume morto, tal como Dilma e o PT.

De modo paradoxal, a morte da narrativa lulista se deu pelas mãos de Dilma. Sua forma de governar foi profundamente antagônica à adotada pelo “lulismo” quando no governo. 
Ironicamente, a aprendiz está matando o mestre em uma lenta agonia caracterizada por alguns detalhes. Quase sempre a orientação do mestre foi ignorada. Alguns dos pilares do lulismo, como a gestão política eficiente da base no Congresso e o diálogo com formadores de opinião, foram abandonados e/ou praticados de forma ineficiente. O diálogo regular realizado no Conselhão foi esquecido.

O antigo software de fazer política foi deixado de lado e o novo não funciona. Enquanto o gasto público foi capaz de blindar a popularidade do governo, correu tudo bem. A farra fiscal acabou e com ela o brilho artificial do governo. A narrativa lulista morreu de morte “matada”. E nada assumiu o seu lugar. O governo não tem uma narrativa e se envergonha dos caminhos escolhidos. Ainda que, patrioticamente, Dilma tenha aceitado sacrificar sua popularidade para tentar promover o ajuste fiscal.

Porém, o problema é mais grave do que fazer um ajuste. Dilma deve tentar construir uma nova narrativa que englobe o ajuste fiscal, suas razões e os caminhos a serem perseguidos. Até mesmo uma séria autocrítica deveria ser feita como ponto de partida. Não é o que ocorre. Dilma não construiu sua narrativa. Nem mesmo quando tinha mais de 60% de aprovação, no início de 2013. Naquela época, o governo estava embalado pelo final da era Lula. Quando o impulso acabou, revelou-se a face do insucesso. Foi uma época de fracassos assintomáticos.

Agora, premida pelo espectro do impeachment, com uma base política rachada e uma grave crise econômica e fiscal assolando o país, Dilma não tem muito tempo a perder. É hora de construir uma nova narrativa que atenda aos anseios da população. Como fazer? Isso é simples de planejar e difícil de executar. 
O planejamento deve contemplar os vários públicos e ter mensagens consistentes para cada um deles. Porém, o difícil é abandonar os velhos hábitos e tecer uma narrativa que seja convincente e que, sobretudo, supere a desconfiança solidamente cevada nos últimos quatro anos.

Como disse o jornalista José Roberto Toledo, Dilma Rousseff perdeu a agenda social e a agenda econômica. Só lhe restou o cargo. Apegada a ele, tenta ensaiar uma resistência.



21 de agosto de 2015
Murillo de Aragão

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