Trata-se de uma foto parecida com muitas que vemos atualmente. Nela, há uma mulher, sentada no chão em uma manifestação contra despejos de pessoas que não conseguem mais pagar seus alugueis.
Vemos também dois policiais, com seus capacetes e armas levantando a mulher pelo braço. Só há um detalhe que faz desta foto uma das mais comentadas da semana passada: esta mulher, que até então era uma ativista a brigar sempre com a polícia, acaba de se tornar prefeita de Barcelona. A polícia de Barcelona tem agora como chefe uma velha conhecida.
Ada Colau é apenas o exemplo mais visível de um processo de uma reconfiguração contemporânea da política. Seu partido não é um partido, mas uma plataforma cidadã, ou seja, um grupo de ativistas, professores que constituiu uma lista eleitoral aliando-se a vários grupos e partidos como o Podemos.
Os candidatos não foram escolhidos em convenções cheias de militantes-fantasmas filiados apenas para vencer embates internos, como acontece em tantos partidos de esquerda e direita. Nem seus candidatos foram decididos em conchavos em mesa de restaurante. Eles foram indicados em assembleia aberta, na qual escolhe quem está presente.
A MAIOR LIÇÃO
Foi assim que a provável futura prefeita de Madri, Manuela Carmena, foi escolhida candidata mesmo sem ter vínculos diretos com os partidos e grupos que compuseram sua coalização.
As pessoas esperam que você faça no poder aquilo que você já pratica em sua organização política. Esta foi a maior lição que os espanhóis estão a mostrar. Estranho falar em democracia quando nós da esquerda continuarmos a aceitar estruturas dirigistas, hierárquicas, hegemonistas e centralizadas.
As pessoas esperam que você faça no poder aquilo que você já pratica em sua organização política. Esta foi a maior lição que os espanhóis estão a mostrar. Estranho falar em democracia quando nós da esquerda continuarmos a aceitar estruturas dirigistas, hierárquicas, hegemonistas e centralizadas.
Mais estranho ainda é ganhar eleições apresentando programas que nunca serão realmente aplicados. Pois o script todo mundo já conhece: depois da eleição, fala-se que o último governo deixou as contas públicas em estado de calamidade, reclama-se da pressão da oposição, da “correlação de forças” e, assim, as belas imagens apresentadas pelo programa precisarão esperar. Isto quando o último governo não foi você mesmo em versão Mr. Hyde.
Os espanhóis quiseram deixar para trás esta mesma história de sempre. O que eles farão, agora nós veremos. Mas eles não temeram procurar reinventar a força da política através de uma confiança renovada no povo.
Enquanto isto, no Brasil, a casta de políticos profissionais passou a semana passada brincando de reforma política e procurando a melhor maneira de usar as leis para perpetuar sua própria existência.
11 de junho de 2015
Vladimir Safatle
Folha
Nenhum comentário:
Postar um comentário