Os movimentos insurgentes de junho, enquanto arena de mobilização popular de rua, criaram a falsa impressão de que haviam sido de caráter episódico, visto que desapareceram repentinamente.
Ledo engano. As pesquisas eleitorais, que têm funcionado como caixa de ressonância do pensamento da população, estão revelando que as insatisfações permanecem latentes, só que agora externalizadas de forma recôndita. A queda substancial na avaliação da gestão de governantes desde o meio do ano, urbi et orbi, é prova eloquente disso.
É muito provável, portanto, que essas inquietudes perdurem até as eleições, mesmo porque algumas das demandas que as motivaram não podem ser atendidas no curto prazo e outras tantas ainda não sensibilizaram seus destinatários, particularmente as de cunho ético-político.
A questão que se coloca é de que forma esse mood da população afetará os resultados do pleito que se avizinha. Pelo menos quatro hipóteses podem ser aventadas:
(1) os eleitores serão mais rigorosos nas suas escolhas, descartando candidaturas cujo perfil não se enquadra na moldura-padrão desenhada em junho; (2) a taxa de renovação parlamentar será das mais elevadas: o clima é de decepção com o Legislativo, completamente dissonante com a pauta do povo. (3) os incumbentes terão mais dificuldades de se reelegerem ou de fazerem seus sucessores, conforme sinalizam os levantamentos de opinião; (4) O alheamento eleitoral (abstenção + votos em branco + votos nulos), que em 2010 atingiu 27%, tende a aumentar, o que diminui os votos válidos acarretando duas conseqüências:
(a) fica mais fácil para quem lidera as corridas majoritárias atingir 50% mais um dos votos válidos e encerrar o certame na sua primeira fase e (b) nas disputas proporcionais o quociente eleitoral baixa na proporção da queda nos votos válidos, dado o número de cadeiras do Parlamento.
Sob o prisma da alienação eleitoral, então, os protestos de rua, sendo estendidos às eleições, podem ensejar resultados indesejáveis: na perspectiva da disputa majoritária, subtrair a chance de segundo turno, momento mais oportuno para se avaliar as candidaturas líderes e suas propostas; no âmbito do embate proporcional, permitir que partidos e coligações de menor densidade eleitoral possam ascender ao Legislativo com candidatos menos representativos.
Tudo leva a crer, enfim, que o eleitor será mais criterioso, escolhendo candidatos que reúnam condições de contribuir com o aprimoramento ético do processo político e para o atendimento da pauta que impulsionou o movimento.
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15 de janeiro de 2014
Maurício Costa Romão, Ph.D. em economia, é consultor da Contexto Estratégias Política e Institucional, e do Instituto de Pesquisa Maurício de Nassau.
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