Esquema de propina em São Paulo reforça importância de autonomia nas investigações e maior transparência na atuação dos auditores fiscais
"Quando os auditores foram depor, eles eram vistos como profissionais respeitados. Nunca se imaginou esses esquemas de corrupção", declarou à Folha o ex-vereador Cláudio Fonseca (PPS), que integrou a CPI do IPTU em 2009 na Câmara Municipal de São Paulo.
Soa irônico que os "profissionais respeitados" fossem Ronilson Bezerra Rodrigues e Eduardo Horle Barcellos, hoje apontados como membros da chamada máfia do ISS (Imposto sobre Serviços).
Mas não pode ser encarado como simples troça o fato de especialistas em arrecadação na mais rica cidade do país participarem de uma quadrilha que, segundo investigações do Ministério Público e da Controladoria Geral do Município, acumulou patrimônio ilegal de R$ 80 milhões.
A CPI do IPTU, comandada por Antonio Donato (PT) e Aurélio Miguel (PR), em tese ajudou a elucidar falhas na arrecadação de impostos em São Paulo. Não rendeu --agora parece óbvio o porquê-- pistas de corrupção nesse setor.
Corrupção havia, mas os fiscais convidados a auxiliar a CPI eram os grandes interessados em ocultar os desvios. Sua atuação na máfia do ISS remontaria a 2007, gestão do ex-prefeito Gilberto Kassab (PSD), e o esquema de cobrança de propina em troca de alívio tributário teria provocado prejuízo de R$ 500 milhões aos cofres públicos.
À luz das notícias recentes, é difícil aceitar como mera coincidência que Miguel e Donato tenham presidido e relatado aquela comissão parlamentar. De acordo com depoimentos ao Ministério Público, ambos receberam dinheiro dos fiscais --os vereadores Nelo Rodolfo (PMDB) e Paulo Fiorilo (PT) também foram citados.
Embora nada tenha sido comprovado contra esses políticos, as suspeitas são graves. Assim como é grave que Mauro Ricardo, secretário de Finanças nas gestões de José Serra (PSDB) e Kassab, tenha omitido da corregedoria a denúncia anônima que recebeu, em 2012, sobre os fiscais, seus subordinados.
Com muito atraso, São Paulo começa a descobrir que os órgãos de investigação precisam de autonomia para executar seu trabalho. Pouco adianta iniciar apurações se seus caminhos podem ser obstruídos com facilidade --mas é precisamente o que costuma acontecer.
A Controladoria Geral do Município, criada pelo prefeito Fernando Haddad (PT), indica uma mudança importante, que mereceria ser replicada em outras cidades.
É imperioso, além disso, usar tecnologias há muito existentes para tornar mais transparente a atuação dos fiscais. Somente escusos interesses suprapartidários explicam que tenham muito poder e poucas contas a prestar.
19 de novembro de 2013
Editorial da Folha
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