Antigamente, dizia-se que tudo acabava em samba no Brasil. Depois, as coisas passaram a acabar em pizza. A partir da Lava Jato, houve uma mudança radical e agora tudo acaba no Supremo. A próxima polêmica no tribunal envolve a nomeação de Moreira Franco para o recém-criado cargo ministerial de secretário-geral da Presidência da República. A denúncia é de que o novo ministério foi criado com o objetivo de blindar Moreira Franco e evitar ser apanhado por juiz federal de primeira instância.
Ao ser empossado, Moreira Franco concedeu uma breve entrevista e disse que a secretaria-geral foi erguida ao status de ministério para “robustecer a Presidência”. Sobre as evidências de que se trata de episódio semelhante à nomeação do ex-presidente Lula para a Casa Civil no governo Dilma Rousseff, Moreira Franco disse que a situação dele é diferente, por já fazer parte da equipe do presidente Michel Temer, e negou ter pedido para ser nomeado.
MENTIRAS E VERDADES – Como o filme inacabado que Orson Welles rodou no Brasil, neste caso tudo é verdade e tudo também é mentira. Há meses temos noticiado aqui na Tribuna da Internet, com exclusividade, a deterioração nas relações entre Temer e o ministro Eliseu Padilha, da Casa Civil. Relatamos a briga surda entre as duas alas – de um lado, Temer e Moreira Franco; e de outro, Padilha e Márcio de Freitas Gomes (Imprensa) e Gustavo do Vale Rocha (Assuntos Jurídicos).
Como a Imprensa trabalhava para atender os interesses de Padilha e não para a Presidência, Temer primeiro formou um Conselho de Comunicação Social, mas nada mudou. Em setembro, anunciou que iria nomear um porta-voz, para esvaziar a Assessoria de Imprensa. Houve forte resistência de Padilha e Temer levou exatos 30 dias para assinar a nomeação, mas não adiantou nada, porque a Imprensa continuou trabalhando para Padilha.
As relações com Padilha continuaram se deteriorando, mas Temer não podia – nem pode – demiti-lo. Trata-se de um ministro “imexível”, no linguajar inovador do ex-ministro Rogério Magri.
NOVO MINISTÉRIO – Diante do avanço da Lava Jato, Temer tomou coragem e criou o novo ministério, numa jogada de duplo objetivo – blindar Moreira Franco e esvaziar Padilha.
“Minha participação no governo junto ao presidente Temer fez com que entendêssemos que era necessário robustecer a Presidência da República recriando a Secretaria-Geral e, na Secretaria-Geral, tendo a Assessoria de Comunicação, que no passado foi um ministério e, ao lado da assessoria, o Cerimonial para que tivéssemos condições de organizar de maneira muito mais integrada todo o trabalho do presidente da República”, disse Moreira, com muita clareza.
Mas essa nova jogada de Temer só vai atingir o objetivo de blindar Moreira, porque não conseguiu esvaziar Padilha. Embora Moreira tenha assumido a Comunicação, a Assessoria de Imprensa continua controlada por Padilha e trabalha exclusivamente para ele.
DEFESA NO SUPREMO – Essa disputa de poder, que agita os bastidores do Planalto, seria o melhor argumento para justificar a nomeação de Moreira Franco, mas não poderá ser usada pela Advocacia-Geral da União, que também está sob controle direto de Padilha, responsável pela nomeação de Grace Mendonça, a “esquecidinha da AGU”.
Como alegar ao Supremo que o objetivo foi “robustecer a Presidência”, conforme declarou Moreira? Como admitir que a Casa Civil se tornou um poder à parte dentro do Planalto? Como reconhecer que o presidente da República não tem condições de demitir um de seus ministros?
Tudo isso exibe o estágio da esculhambação institucional no país e indica que a nomeação de Moreira Franco corre o risco de ser cancelada pelo Supremo, como seria de se desejar. Aliás, se um presidente da República não consegue demitir um ministro, é melhor pedir o boné e ir cuidar da família.
06 de fevereiro de 2017
Carlos Newton
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