Ameaças à integração econômica alimentam a desconfiança corporativa. Brasil precisa encarar de uma vez por todas os dilemas que travam sua modernização
A divulgação na sexta-feira passada do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA no segundo trimestre do ano evidenciou sinais contraditórios sobre a recuperação da maior economia do mundo, que ainda sofre os efeitos da crise financeira global de 2008. Pelo lado positivo, os dados mostraram um crescimento robusto (4,2%) no consumo das famílias americanas — item que representa dois terços do cálculo do PIB —, sugerindo aumento na geração de emprego, maior acesso ao crédito, aumento salarial e do patrimônio.
Mas nem tudo são flores. O relatório mostra igualmente que as empresas permanecem tímidas em seus investimentos, e com estoques acumulados, fator preocupante, a ponto de ofuscar o peso do consumo das famílias no cálculo do PIB. A desconfiança do setor corporativo, que se traduz na ausência de investimentos em contratação de pessoal e em novas fábricas e equipamentos, representa atualmente talvez o maior desafio à recuperação econômica — dos EUA e do mundo.
Ela se alimenta de temores que extrapolam o campo financeiro. Antes de decidir investir, os empresários olham não só para a solidez fiscal da economia, a segurança jurídica e os níveis de corrupção, mas também para aspectos geopolíticos, como a instabilidade provocada pela violência extremista, crise política e a crescente retórica populista de ultranacionalistas, cujo exemplo mais grave foi a decisão do Reino Unido de abandonar a União Europeia, o Brexit.
No caso americano, a previsão média entre os investidores indicava que o PIB alcançaria algo em torno de 2% no período e não o índice de 1,2% registrado, permanecendo ainda perto do tíbio crescimento do primeiro trimestre, de 0,8%. Diante da desconfiança dos empresários, os analistas concluíram que o Federal Reserve (Fed) acertou ao manter a taxa básica de juros da economia inalterada em sua última reunião.
O banco central americano tem a difícil tarefa de calibrar, com sua política monetária, os estímulos à economia sem precipitar pressões inflacionárias. Mas, com a economia mundial integrada, uma decisão do BC americano tem efeitos que não se restringem à economia do país. A decisão do Fed, assim, representou mais tempo para que os países emergentes reorganizem as finanças para estimular e atrair investimentos, financeiros e empresariais. Um medida urgente, pois o ciclo de aumento de juros pode ser retomado pelo Fed a qualquer momento.
A desconfiança do setor corporativo, portanto, atinge a economia global como um todo. E no Brasil, apesar do colchão das reservas internacionais, há agravantes que tornam ainda mais urgente que o país encare seus dilemas e faça o dever de casa. Isto significa aprovar de uma vez por todas as reformas estruturais da economia, em especial a da Previdência, a trabalhista e o teto das despesas, desarmando a bomba-relógio cuja explosão atingirá as futuras gerações.
02 de agosto de 2016
Editorial O Globo
A divulgação na sexta-feira passada do Produto Interno Bruto (PIB) dos EUA no segundo trimestre do ano evidenciou sinais contraditórios sobre a recuperação da maior economia do mundo, que ainda sofre os efeitos da crise financeira global de 2008. Pelo lado positivo, os dados mostraram um crescimento robusto (4,2%) no consumo das famílias americanas — item que representa dois terços do cálculo do PIB —, sugerindo aumento na geração de emprego, maior acesso ao crédito, aumento salarial e do patrimônio.
Mas nem tudo são flores. O relatório mostra igualmente que as empresas permanecem tímidas em seus investimentos, e com estoques acumulados, fator preocupante, a ponto de ofuscar o peso do consumo das famílias no cálculo do PIB. A desconfiança do setor corporativo, que se traduz na ausência de investimentos em contratação de pessoal e em novas fábricas e equipamentos, representa atualmente talvez o maior desafio à recuperação econômica — dos EUA e do mundo.
Ela se alimenta de temores que extrapolam o campo financeiro. Antes de decidir investir, os empresários olham não só para a solidez fiscal da economia, a segurança jurídica e os níveis de corrupção, mas também para aspectos geopolíticos, como a instabilidade provocada pela violência extremista, crise política e a crescente retórica populista de ultranacionalistas, cujo exemplo mais grave foi a decisão do Reino Unido de abandonar a União Europeia, o Brexit.
No caso americano, a previsão média entre os investidores indicava que o PIB alcançaria algo em torno de 2% no período e não o índice de 1,2% registrado, permanecendo ainda perto do tíbio crescimento do primeiro trimestre, de 0,8%. Diante da desconfiança dos empresários, os analistas concluíram que o Federal Reserve (Fed) acertou ao manter a taxa básica de juros da economia inalterada em sua última reunião.
O banco central americano tem a difícil tarefa de calibrar, com sua política monetária, os estímulos à economia sem precipitar pressões inflacionárias. Mas, com a economia mundial integrada, uma decisão do BC americano tem efeitos que não se restringem à economia do país. A decisão do Fed, assim, representou mais tempo para que os países emergentes reorganizem as finanças para estimular e atrair investimentos, financeiros e empresariais. Um medida urgente, pois o ciclo de aumento de juros pode ser retomado pelo Fed a qualquer momento.
A desconfiança do setor corporativo, portanto, atinge a economia global como um todo. E no Brasil, apesar do colchão das reservas internacionais, há agravantes que tornam ainda mais urgente que o país encare seus dilemas e faça o dever de casa. Isto significa aprovar de uma vez por todas as reformas estruturais da economia, em especial a da Previdência, a trabalhista e o teto das despesas, desarmando a bomba-relógio cuja explosão atingirá as futuras gerações.
02 de agosto de 2016
Editorial O Globo
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