"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 5 de setembro de 2015

ENSAIO DE GOLPE DE ESTADO



Não sou o primeiro a perceber, mas o que se passa na fronteira colombo-venezuelana tem muito pouco a ver com os colombianos deportados, cuja cifra escandalosa já se aproxima das 10.000 vítimas, todas de uma atitude canalha do governo de Maduro.

Na realidade, estamos ante um ensaio de golpe de Estado.
A cortina de fumaça é espessa. Sabemos, por exemplo, que a disparidade maluca entre as taxas de câmbio, somada ao ridículo preço da gasolina no outro lado da fronteira, fazem que a zona se encha de malandros. ¿Semeiam uma montanha com alpiste e depois querem que os pássaros não venham comê-lo? 

A culpa não é dos pássaros, mas sim dos que semearam o alpiste. 
A repressão, claro, não afeta a esses malandros pela simples razão de que eles possuem relações privilegiadas com a Guarda Nacional venezuelana e com o 'chavismo', quando não são membros de ambos. 
Vejam, entre outros fatos, que os "paramilitares", não portam armas e vivem em favelas humildes como "Mi Pequeña Barinas". Devem ser idiotas esses paramilitares.

Um dado é essencial para entender a situação: segundo todas as pesquisas, o "chavismo" perderá, por mais de 20 pontos, as eleições de 6 de dezembro. Isto significa que sequer uma fraude eleitoral está ao alcance do Governo, porque os "chocorazos" (golpes, engôdos, fraudes) se tornam inviáveis quando se tem que "remontar", refazer fraudulentamente, mais de 5%, que dizer 20% dos votos. E a derrota que se aproxima do "chavismo" é muitíssimo mais dramática que as que se veem comumente em outros países, pois eles tem justificado todos seus atropelos com a desculpa de que são eleitoralmente imbatíveis. 

Agora, temos que as torpezas de Maduro não são somente econômicas e de modelo de sociedade. Na política, está metendo os pés pelas mãos. Se a intenção das deportações era captar os votos "chauvinistas", falhou pois estes ele já os tem, enquanto que os abusos na fronteira fará com que perca a grande maioria dos votos da comunidade colombiana, que somam cerca de dois milhões de votantes potenciais. 
Os colombianos com dupla nacionalidade são pobres (em sua maioria), não masoquistas.

Maduro se prevalece com os colombianos da fronteira justamente porque não são perigosos paramilitares, senão gente humilde e desarmada. Por sorte — e quase não acredito que tenha que escrever isto —, até Maduro sabe que uma aventura bélica seria seguramente um suicídio, de modo que não vai tentá-la. 
Alguns dirão que ele pode reprisar a colossal distribuição de "mogolla" (tipo de pão especial) que funcionou nas eleições presidenciais de 2012 e 2013. Porém resta um dilema: o Governo Venezuelano está quebrado e não tem "mogolla" para distribuir. 
Os velhos mecanismos para subornar o eleitorado restaram sem um real, como se diz. De modo que, para repartir, só pau.

Ao fim, não restará a Maduro mais que engolir o dragão — porque já não é um simples sapo — de um revez eleitoral em dezembro ou suspender as eleições, o que equivale a dar um golpe de Estado. Ainda que esta possa parecer uma "solução" tentadora, o mais provável é que acelere o já quase inevitável fim do regime.

Como a gaiola com o passarinho que conversava com don Nicolás foi levada por um dos deportados para o outro lado do rio Táchira; o pobre grandalhão ficou sem interlocutor e terá que conversar com dona Cília (Cília Flores de Maduro, 1ª dama venezuelana), porque já não há nem mesmo cumbias para bailar frente ao seu minguado público. 

Fonte: tradução livre de El Espectador

05 de setembro de 2015
André Hoyos

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