"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 28 de junho de 2015

CRISE NOS PRESÍDIOS NÃO INVALIDA REDUÇÃO DA MAIORIDADE

Os números da população carcerária do país (607,7 mil presos, com um déficit de 231 mil vagas) divulgados pelo Ministério da Justiça ratificam uma evidência: a política penitenciária está falida. Este é o mais expressivo sinal dos indicadores. No entanto, em vez de discutir seriamente a questão em si, o governo federal transformou a superlotação das prisões em bandeira contra a redução, no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), do limite da imputabilidade penal de jovens delinquentes.

Celas superlotadas e proteção da sociedade contra a explosiva criminalidade juvenil são coisas distintas. Misturá-las só atende a quem, por hipocrisia, volta as costas para a realidade que é o preocupante aumento do número de adolescentes que, em assaltos e outros crimes, praticam nas ruas atos de violência extrema.

É no âmbito da execução penal, terreno do gerenciamento da aplicação da lei nas penitenciárias, que a questão dos presídios precisa ser discutida — e com urgência. O Brasil tem uma população carcerária que excede o número de vagas porque, primeiro, prende mal, e, segundo, comete um erro primário: não investe para valer na construção de novas unidades prisionais.

São conhecidas, ainda, denúncias do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) dando conta da existência, no universo das cadeias do país, de presos que, tendo cumprido suas sentenças, ainda permanecem detidos, reflexo de uma burocracia ineficiente; outros, e em bom número, são mantidos em celas de presídios ou delegacias mesmo sem julgamento; e há ainda aqueles que, em vez de ocuparem vagas nas cadeias, poderiam ajustar contas com a Justiça cumprindo penas alternativas, como ações educativas ou sociais — caso, principalmente, de usuários de drogas ou condenados por tráfico eventual.

Mas, ainda que se adotassem medidas de racionalização da política carcerária, permaneceria a questão dos mandados de prisão não executados, e que, se fossem cumpridos, agravariam ainda mais o problema do déficit. Por isso, independentemente de o poder público cuidar dessa questão, é inescapável que, se há carência de vagas, é preciso construir mais presídios. Nisso também há falhas: mesmo diante da demanda, o governo federal só aplicou, entre 2011 e este ano, 16,7% dos recursos do Fundo Penitenciário Nacional (Funpen) destinados a obras no sistema.

Em aberto há muito tempo, são questões tratadas com leniência. A admissão do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, de que a divulgação desses indicadores é uma forma de pressão contra a redução da maioridade penal põe na mesa de discussão da revisão do ECA uma carta diversionista: contra a superlotação, em vez de melhorias no sistema penitenciário, prega-se o perigoso princípio de prender menos. Não resolve o problema da crise dos presídios, tampouco o do incremento da violência juvenil. Deixa-se tudo como está, ao preço do aumento dos riscos para a segurança da sociedade.


28 de junho de 2015
O Globo

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