"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

segunda-feira, 16 de junho de 2014

AS JORNADAS DE JUNHO, UM ANO DEPOIS

Nesses 12 meses, a resposta do poder público ao clamor das ruas oscilou entre a omissão, alguns poucos acertos e iniciativas sem relação nenhuma com as reivindicações

O povo talvez até não soubesse exatamente o que queria, mas ainda assim marchou aos milhões pelas ruas de todo o país em junho do ano passado, fazendo tremular as mais variadas bandeiras. Os governos contra os quais as faixas e os gritos eram dirigidos sabiam com exatidão e com antecedência quais eram as causas que importavam à sociedade e que eles, os governos, já há tempos deveriam ter atendido. Aturdidas com o barulho ensurdecedor, as autoridades comprometeram-se apressadamente com tudo, ainda que soubessem de antemão que não cumpririam a palavra.

Um ano depois dos protestos juninos, aqui ou ali alguma coisa foi feita. O povo queria passagem de ônibus grátis ou mais barata? Tudo bem, vamos congelá-las para os usuários mas, ao mesmo tempo, vamos transferir o inevitável prejuízo do desequilíbrio econômico-financeiro dos sistemas de transporte coletivo para os cofres públicos. E, então, para atender ao clamor dos que bradavam contra a passagem cara, vieram os pesados subsídios para o transporte, que por sua vez tiraram recursos da saúde, da educação, da segurança...

Na verdade, este foi apenas um dos exemplos do arremedo de resposta que os gestores públicos deram às ruas de junho de 2013. Neste caso, vestiram pobremente um santo para pelar vários outros, pois a sociedade se manteve carente de serviços de saúde, educação, segurança... causas importantes que também faziam parte da coleção de reivindicações populares. Havia até, em relação a estes itens básicos da sobrevivência humana e da responsabilidade dos governos, uma exigência – que se desse a eles o mesmo “padrão Fifa” com que o país se comprometeu para ter a honra de sediar a Copa do Mundo iniciada anteontem.

Acossada pelos protestos que poderiam lhe custar (como de fato custaram) perda de popularidade e densidade eleitoral, a presidente Dilma Rousseff respondeu com a proposta de uma “agenda positiva” de cinco pontos, alguns dos quais mais ligados à agenda petista que ao clamor popular, como a convocação de uma Assembleia Constituinte exclusiva para a reforma política, ideia logo abandonada (apenas temporariamente, a julgar pela “Resolução sobre tática eleitoral e política de alianças” publicada pelo PT no começo de maio), até por não interessar tanto aos que poderiam torná-la realidade: os políticos que compõem o Congresso Nacional.

Este, por sua vez, cumpriu a sua parte da encenação ao, logo em seguida, derrubar – acertadamente, é preciso dizer – a proposta de emenda constitucional que limitava os poderes do Ministério Público. Mas a ação rapidamente deu lugar aos discursos inócuos contra a corrupção, a favor da transparência dos atos públicos, assim como de defesa de melhores condições para a mobilidade urbana. Tiraram-se das gavetas onde mofavam outros projetos de “apelo” popular – tudo para fazer de conta que as ruas tinham sido ouvidas e estavam sendo atendidas.

Ledo engano. O país pouco mudou de um ano para cá, salvo pelo fato de que, a reboque das manifestações democráticas e pacíficas, surgiram grupos de vândalos especializados em atacar e depredar bens públicos e privados a serviço de facções políticas radicais de esquerda, os tais “black blocs”, agindo sob o pretexto de ser “contra tudo o que aí está”. No mais, nem caminharam milímetros as reivindicações legítimas, nem se contém a sanha destruidora dos vândalos.

Lição positiva que aprendemos durante este ano é perceber que, pelo menos, o junho de 2013 contribuiu para o crescimento da consciência política e dos direitos da cidadania. A questão que ainda permanece, no entanto, é como canalizar esta energia para o bem e, consequentemente, para nos levar a um Brasil melhor?

 
16 de junho de 2014
Editorial Gazeta do Povo, PR

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