"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

COMO PASSAR PELO FILTRO IDEOLÓGICO DO ENEM


“Manipulação do Comportamento do Usuário pelo Controle de Dados na Internet” foi o tema espinhoso que o ENEM desencavou para redação da prova de 2018 para aterrorizar os postulantes a ingressar no ensino superior. A questão é: assuntos indigestos dessa natureza possibilitam efetivamente que os estudantes brasileiros aprendam a escrever melhor e a desenvolver suas ideias, a fim deixarem de figurar entre os piores do mundo, posição onde foram colocados justamente pelo sistema falido de ensino que o ENEM tem produzido? Matérias controversas como essa não deveriam mais apropriadamente ser pauta a ser debatida em outras esferas ao invés de tornadas temas de redação para adolescentes que mal sabem construir uma sentença com pé e cabeça até o fim?

Não é de hoje que os sádicos elaboradores dos exames do ENEM levantam temas excruciantes para torturar os jovens cuja única e modesta ambição é ter uma formação universitária decente para poder engrossar com dignidade a multidão de desempregados com diploma na mão: formação educacional de surdos (2017), violência contra a mulher (2015), trabalho infantil (2005), valorização do idoso (2009), abusos da mídia (2004), intolerância religiosa (2016), racismo (2016, 2ª prova), publicidade infantil (2014), lei seca (2013), preservação da floresta (2008), violência (2003), imigração (2012). E dá-lhe desgraça!

Certamente, os pupilos sentir-se-iam mais à vontade discorrendo sobre assuntos do seu cotidiano como games, música, filmes, esportes ou sentimentos universais como amor, amizade, medo, alegria em que talvez pudessem fazer extensas e criativas dissertações, exercer sua expressividade e, com mais propriedade, manifestar sinceramente suas opiniões ao invés de papaguear chavões.

Mas quem está interessado em sua opinião, Zé Mané? O ENEM quer apenas que o noviço recite submissamente a cartilha adotada, colocando-lhe na boca (e na ponta da caneta preta) lemas do receituário politicamente correto.

Faz parte dos objetivos dos educadores de plantão assombrar desde cedo a molecada com questões ‘adultas’, repletas de ‘responsabilidade social’ (seja lá o que eles acham que isso possa ser) e abortar impiedosamente seu despolitizado (‘alienado’) mundo de sonhos e fantasias.

Afinal, o objetivo do nosso sistema de ensino não é formar pessoas gabaritadas, realizadas, motivadas, cheias de vida, de bem com o mundo, e sim ‘guevarinhas’ raivosos, militantes engajados em promover passeatas, incitar ocupações e substituir regimes corruptos de direita por regimes corruptos de esquerda.

Resta-nos oferecer dicas aos jovens para sobreviver a isso. Para impressionar os julgadores com ‘consciência social’ do ENEM, lance mão de frases de efeito mas sem nenhum conteúdo efetivo como: “é necessário efetuar a mobilização da sociedade para pressionar as autoridades”, “é preciso assegurar os direitos constitucionais inalienáveis aos menos favorecidos”, “que seja adotada uma política de inclusão que respeite os direitos humanos de todos os cidadãos”, “é imprescindível estabelecer diálogo com os movimentos sociais representativos para aprofundar o processo de democratização”. Decore tais frases e insira-as aleatoriamente no meio do seu texto. Certamente, vai funcionar.

Caso queira se aventurar por algum acontecimento recente, jamais cite como fonte a imprensa ‘golpista’ que inclui Folha, Estadão, Globo, Veja etc. O único veículo que merece credibilidade dos examinadores é a Carta Capital.

São sempre bem vindas menções a pensadores chiques de esquerda como Sartre, Lukács ou Foucault. Não perca tempo lendo as obras dos ditos cujos pois você obviamente não vai entender nada. Basta pegar uma citação extraída de algum livro, pinçada no buscador do Google. Não se preocupe em checar a autenticidade pois os julgadores também nunca leram. Em se tratando de latino-americanos, dê preferência a Gabriel Garcia Márquez e sobretudo Eduardo Galeano (que, mesmo sendo um escritor menor, desfruta de um prestígio inigualável no meio). Não se arrisque a citar autores supostamente ‘de direita’ nem mesmo ficcionistas como Borges, Vargas Llosa ou Nelson Rodrigues.

Em hipótese alguma, deixe transparecer qualquer traço de aceitação ao sistema vigente ou perspectiva de melhores dias com o governo “fascista” eleito para não angariar antipatia dos professores, cuja formação foi herdada da resistência à ditadura militar. Você deve necessariamente compartilhar da mesma ideologia (ou ser visto como tal) ou será considerado inapto a ingressar numa boa faculdade por ser “coxinha” em potencial.

Por fim, não permita que o trauma da redação do ENEM destrua seu desejo por escrever e ler poesias, contos ou obras de ficção e realidade fantástica. Assim que passar o pesadelo das provas, saiba que há milhares de lindos e inspiradores livros que lhe permitem voar alto para longe da tragédia social pela qual, apesar do empenho em envolver-lhe feito pelos mestres politizados, você não deve carregar nenhuma culpa. De Machado de Assis a Drummond de Andrade, de Gonçalves Dias a Paulo Leminsky, de Lewis Carroll a George R R Martin, do Pequeno Príncipe a Harry Potter, do Superman ao Dragon Ball. Leituras deliciosas, motivadoras e sem compromisso, eivadas de liberdade e beleza que passam a quilômetros de distância do mundo em degradação retratado pelos educa(stra)dores do ENEM.


28 de novembro de 2018
Sérgio Sayeg

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