"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

terça-feira, 9 de outubro de 2018

CAMPANHA DE BOLSONARO SOUBE APROVEITAR A INTERNET E AS REDES SOCIAIS

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Charge do Edra (Arquivo Google)
Dois dias após a eleição que mudou o país, e que terá impacto global na sequência de eleições mundiais afetadas pelas redes sociais, a ressaca do maremoto político de 7 de outubro ainda é grande. Falamos em colunas anteriores tanto da polarização como do conteúdo simbólico e sociológico das redes sociais. Falamos, também, de sua gigantesca influência no ambiente político, pela construção de narrativas eficientes em tempo real. Alertamos ainda sobre bots e fake news, e das perturbações potenciais ao processo de escolhas públicas e de votação.
Acompanhando o Twitter, já durante o debate na quinta-feira (dia 4), verificamos que Bolsonaro, que sempre esteve na frente nas redes sociais até então, ampliou ainda mais sua vantagem frente aos demais concorrentes, atingindo médias equivalentes ou acima de 100 mil tuítes por hora. Ele não participou do debate na Globo. No horário, foi veiculada uma entrevista sua para a Record. Essa margem de crescimento se estabeleceu na última semana e durou até a votação no domingo.
PELO FACE – Observando o Facebook desde setembro, vemos outro quadro ainda mais revelador. Bolsonaro havia estabelecido uma muralha de engajamento e de atração de perfis em patamar imensamente maior que a soma dos outros candidatos. Esse domínio — que em gráfico aparenta um curioso formato do Pão de Açúcar —  teve um pico menor no dia 1º de outubro e outro maior no dia 4, na quinta. Houve um volume total de 13,9 milhões de interações nas publicações de Bolsonaro na rede, com seu ápice durante o debate, quando chegou a atrair 430 mil interações em média por postagem.
Suas inserções nas redes não se resumiram a essas duas plataformas. Tiveram impacto demolidor também nas listas de mobilizadores no WhatsApp, que selaram uma estratégia que prescindiu dos meios tradicionais de TV e da estrutura partidária. Isso muda completamente a forma de fazer campanha, gerar mobilização e engajamento.
Discurso Moralista – Claro, houve a mensagem e sem a correta envelopagem isso não seria possível. Ao construir um discurso moralista com base na questão da corrupção e da segurança pública como metatemas, Bolsonaro produziu sínteses que atingiram os brasileiros, a despeito de seu viés ultraconservador. A partir disso, abriu outras frentes por esse viés, trazendo a questão da Venezuela, da economia e do antipetismo, apresentando-se como o único capaz de higienizar a política e a vida pública.
Mas houve também o senso de timing. Com discurso construído desde 2014, intensificado em 2016, no impeachment, e turbinado em 2018 pelas redes, houve tempo para Bolsonaro consolidar e possibilitar conversões. Milhões delas.
CIRO SE ATRASOU – Outros, como Ciro Gomes, intensificaram sobremodo sua presença nas redes, mas tardiamente. Ciro logrou o segundo lugar virtual na busca de última hora de parte do eleitorado por uma terceira via, ainda assim muito distante, atingindo, antes do início da votação, a marca de 547 mil tuítes. Bolsonaro já estava em 1,5 milhão.
Para nossa surpresa, esse potencial impacto foi negligenciado por analistas e pelas campanhas. No caso de alguns analistas, percebe-se que erraram em suas previsões por desconsiderarem o impacto das redes.
Fixaram-se numa abordagem retrô, na qual o tempo de TV e estruturas partidárias tradicionais eram os fatores preponderantes da equação. Essas análises permearam a estratégia de várias campanhas, que buscaram por aí mudar seu destino na esperança que o tempo diferenciado de mídia seria definitivo para reverter o jogo. A esfinge não foi decifrada e os engoliu.
09 de outubro de 2018
Marco Aurelio Ruediger (Marco Aurelio Ruediger é chefe da Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getulio Vargas)

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