"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

sábado, 7 de maio de 2016

QUEM DESDENHA QUER VENDER A PETROBRAS A PREÇO DE BANANA


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Charge do Peu Teles, reprodução do Arquivo Google




















Como foi revelado no processo de privatização da Vale do Rio Doce (hoje somente Vale, pois o Rio Doce já foi eliminado do nome em 2008, como premonição do desastre de Mariana) a corretora Merryl Lynch teve participação chave na estimativa de valor da empresa. Com isso, houve desvalorização tremenda dos ativos no período pré-privatização, de forma que se vendeu por 3 dinheiros a empresa, que instantaneamente valorizou para 20, valendo 60 no final de 2015. Soube-se ainda que a Merryl Lynch manteve relacionamento constante com os concorrentes que participariam do leilão (Anglo American).
A atuação da Merryl Lynch na YPF (petroleira argentina) foi semelhante, ao reduzir as reservas de 2,2 bi para 1,7 bilhões de barris de óleo antes da privatização. Incrivelmente, com o “ótimo” trabalho dos compradores da espanhola Repsol, ela retornou a 2,2 bilhões de barris rapidamente após a aquisição, sem nenhum investimento.
Passando do passado para o presente, mudam os nomes, não os procedimentos. O processo de desinvestimento da Petrobras (para o bem, para o mal, devia ser naturalmente chamado de privatização, pois não deixa de ser uma venda do controle público para o privado) segue as mesmas notas. Sob a tutela (bem paga) da americana PriceWaterhouseCooper (PwC), a Petrobras viu suas reservas caírem exatos 20%, de 16,6 para 13,3 bilhões de barris. Curiosamente, muito parecido com o percentual de redução da YPF, que sofreu com queda de 22% em suas reservas durante a atuação da Merryl Lynch. Foi a primeira queda de reservas em muitos anos.
ESTRATÉGIA ARDILOSA
Reduzir reservas, apontar prejuízos contábeis, se fazer de coitado, tem algumas vantagens: sem a necessidade de pagamento de lucros, dividendos, bônus para funcionários, Imposto de Renda etc., a empresa economiza um bom dinheiro, que será útil para pagamento das dívidas que afogam a companhia.
Esta é uma estratégia válida e bastante utilizada, inclusive, por empresas de ônibus, para engordar os subsídios do governo. No entanto, efetuar o princípio cristão da humildade não contribui nem um pouco, se você estiver colocando os ativos à venda. Antes de vender o carro você manda polir, e não joga barro por cima.
Ao divulgar que tudo é pior do que parece, automaticamente o comprador aproveita a fragilidade para reduzir o preço.
DIGA-ME COM QUEM ANDAS
A PwC tem em sua lista de 20 maiores clientes a Exxon Mobil e a Chevron, aquela que gosta de trocar figurinhas com o senador (futuro ministro do Exterior) José Serra acerca das leis brasileiras de exploração de petróleo.
A lista de controvérsias da empresa também é extensa, incluindo lobby com o governo de Luxemburgo para facilitar a fuga de impostos de 343 multinacionais (chamado “Luxembourg leaks“), favorecimento na privatização da distribuição de água de Nova Delhi, na Índia, e vista grossa nas manipulações da taxa Libor. A PwC afirma publicamente que tudo isso é coisa do passado (2010?) e que a empresa já resolveu todos os problemas e que nada mais disto acontece.
DESVALORIZAÇÃO
A desvalorização não ocorre somente nas reservas de petróleo. Foi anunciado prejuízo bilionário na BR Distribuidora (elo entre as refinarias e os consumidores finais) em 2015. Exatamente a BR Distribuidora, que teve sua venda anunciada.
Cabe notar que lucros e prejuízos das subsidiárias dentro da empresa integrada de energia (como é a Petrobras) é um conceito bastante frágil, pois acaba sendo totalmente gerenciável pelo chamado “preço de transferência interna”.
Pelo fato de ser monopolista em vários degraus da cadeia produtiva, a Petrobras dita o preço, por exemplo, de saída de refinaria, o preço do transporte e, por fim, o preço de entrega nos postos de combustíveis. Assim sendo, meramente definindo o preço destas transações internas, pode-se transferir lucros e prejuízos de uma subsidiária para outra.
VELHO EXPEDIENTE
As montadoras de automóveis usam deste expediente, por exemplo, para transferir gordos montantes de dinheiro das subsidiárias brasileiras para as matrizes européias e norte-americanas, sob rubricas como “aluguel de máquinas”, “treinamentos”, “transferência de propriedade intelectual”, “royalties”, “juros sobre empréstimos”, e mesmo peças compradas entre uma empresa e outra com o valor arbitrado entre as partes (mesmo carros populares tiveram as lâmpadas de freio italianas por muito tempo).
O fato de apresentar o prejuízo da BR Distribuidora prejudica sua privatização/desinvestimento (parcial ou não) de duas formas: (1) o contador que ignorar, propositadamente ou não, o caráter gerenciável do balanço, reduz o valor da empresa com a demonstração de prejuízo; (2) o comprador inteligente se recusa a fazer parte de uma empresa cujo lucro está totalmente dependente e controlado pela vontade alheia.
MONOPÓLIO PRIVADO
De fato, os proeminentes compradores já informaram que só aceitam a compra se detiverem 51% da empresa e seu consequente controle. Novamente caímos no problema do monopólio privado (pior que o monopólio público, que já é ruim).
Por fim, nestes moldes o desinvestimento está fadado ou ao esquecimento ou ao fracasso. Se não acontecer, esquecido está. Se acontecer, será nos termos dos compradores, que constituirá um custo amargo para a população: serão reservas vendidas a preço de banana para as multinacionais (e isso que nem a banana não é mais vendida a preço de banana) ou a desintegração da maior empresa integrada de energia da América do Sul.
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PS
 – Como diz nosso amigo de infância Félix Bulhões, ex-presidente da multinacional White Martins, pior do que um monopólio estatal, só um monopólio privado(C.N.)


07 de maio de 2016
Carlos Newton

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