"Quero imaginar sob que novos traços o despotismo poderia produzir-se no mundo... Depois de ter colhido em suas mãos poderosas cada indivíduo e de moldá-los a seu gosto, o governo estende seus braços sobre toda a sociedade... Não quebra as vontades, mas as amolece, submete e dirige... Raramente força a agir, mas opõe-se sem cessar a que se aja; não destrói, impede que se nasça; não tiraniza, incomoda, oprime, extingue, abestalha e reduz enfim cada nação a não ser mais que um rebanho de animais tímidos, do qual o governo é o pastor. (...)
A imprensa é, por excelência, o instrumento democrático da liberdade." Alexis de Tocqueville
(1805-1859)

"A democracia é a pior forma de governo imaginável, à exceção de todas as outras que foram experimentadas." Winston Churchill.

domingo, 26 de julho de 2015

BRASIL PROTELA CRISES POR FALTA DE OUSADIA DAS LIDERANÇAS



Este é o verdadeiro retrato da política brasileira contemporânea








Raramente na história houve tanta acumulação de situações de crise como no atual momento. Algumas são conjunturais e superáveis. Outras são estruturais e exigem mudanças profundas, como, por exemplo, a reforma política e a reforma tributária no Brasil. Mas há uma crise que se apresenta sistêmica e recobre toda a Terra e a humanidade. Ela é ecológica e social.
A percepção geral é que, assim, como a Terra viva se encontra, não pode continuar, pois pode nos levar a um quadro de tragédia com a dizimação de milhões de vidas humanas e de porções significativas da biodiversidade.
A crise sistêmica é grave porque carrega dentro de seu bojo a possibilidade da destruição da vida no planeta e, eventualmente, o desaparecimento da espécie humana. Não podemos subestimar sua gravidade. A atual crise brasileira é um pálido reflexo da crise maior planetária.
SAIR MELHOR
É nesse contexto que cabe um aprofundamento da natureza da crise para sairmos melhores dela. Desde o advento do existencialismo, a vida é entendida como processo permanente de crises e de superação de crises. Ortega y Gasset, no ensaio “Esquemas das Crises” (1942), mostrou que a história, por causa de suas rupturas e retomadas, possui a estrutura da crise, que obedece à seguinte lógica:
1) a ordem dominante deixa de realizar um sentido evidente; 2) reinam dúvida, ceticismo e uma crítica generalizada; 3) urge uma decisão que cria novas certezas e outro sentido; 4) tomada uma decisão, mesmo sob risco, abre-se, então, novo caminho e outro espaço para a liberdade. Supera-se a crise. Nova ordem pode começar.
A crise representa purificação e oportunidade de crescimento. Não precisamos recorrer ao ideograma chinês de “crise” para saber dessa significação. Basta nos remetermos ao sânscrito, matriz de nossas línguas ocidentais. Em sânscrito, “crise” vem de “kir” ou “kri”, que significa purificar e limpar. Então, a crise representa um processo crítico, de depuração do cerne: só o verdadeiro e substancial fica, o acidental e agregado desaparece.
SUPERAÇÃO DA CRISE
Ao redor e a partir desse cerne se constrói outra ordem que representa a superação da crise. Ela se traduzirá num curso diferente das coisas. Depois, seguindo a lógica da crise, essa ordem também entrará em crise. E permitirá, após processo crítico de acrisolamento e purificação, a emergência de nova ordem. E assim sucessivamente.
A crise possui também uma dimensão pessoal. A maior de todas é a crise da morte. Possui também uma dimensão cósmica, que é o fim do universo, que para nós não acaba na morte, mas numa incomensurável explosão e implosão para dentro de Deus.
Entretanto, todo processo de purificação não se faz sem cortes e rupturas. Daí a necessidade da decisão, que opera uma cisão com o anterior e inaugura o novo.
O Brasil vive, há séculos, protelando suas crises por faltar às lideranças ousadia histórica de tomar decisões que rompam com o passado perverso. Sempre se fazem conciliações negociadas a pretexto da governabilidade. Dessa forma, sutilmente se preservam os privilégios das elites, e as maiorias são condenadas a continuar na marginalidade social.
A crise do capitalismo é notória. Mas nunca se fazem cortes estruturais que inaugurem uma nova ordem econômica. Sempre se recorre a ajustes que preservam a lógica exploradora de base, como ocorreu recentemente na Grécia. Com a decisão, o caos e a crise desaparecem, e nasce nova esperança.

26 de julho de 2015
Leonardo Boff, O tempo

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