Líder da rebelião de maio de 68 em Paris encerra carreira no Parlamento, prepara grande expedição pelo Brasil em 2014 e dá conselho aos jovens: “Se você só tiver duas possibilidades, escolha uma terceira!
Quando era maio no mundo, em 1968, Daniel berrava pelas ruas de Paris.
Anarquista, aluno da Universidade de Nanterre, Daniel Cohn-Bendit comandou a rebelião dos estudantes que ocuparam o prédio da Faculdade de Sociologia, em protesto contra a prisão de seis colegas. Em poucos dias, virou líder do levante dos estudantes contra o velho mundo, a velha vida, os velhos professores, os velhos governantes, o velho tédio.
Filho de judeus alemães fugidos do nazismo, Daniel Cohn-Bendit cuspia fogo. Comandou uma passeata de um milhão de estudantes e operários. Virou “Dani, le Rouge” – Dani, o Vermelho.
Naqueles dias, os muros de Paris eram cadernos de anotações onde os estudantes rebelados gravaram com spray os mandamentos da utopia:
“Eles compram tua felicidade. Roube-a!”
“A sociedade é uma flor carnívora”
“O tédio chora”
“Tome meus desejos como realidade, porque eu acredito na realidade dos meus desejos”
“A humanidade só será feliz no dia em que o último burocrata for enforcado nas tripas do último capitalista”
“A imaginação no poder”
“É proibido proibir”
“E se a gente incendiasse a Sorbonne?”
“Professores: vocês nos fazem envelhecer!”
“Corra, camarada: o velho mundo está atrás de você!”
Daniel ganhou do jornal “Le Monde” o título de “o principal porta-voz do movimento de maio de 1968, o mais vivo, o mais inteligente”.
Expulso da França no último dia daquele maio pelo governo do general De Gaulle, terminou voltando à pátria dos pais, a Alemanha, onde, nos anos seguintes, se engajou nos movimentos alternativos até virar militante do Partido Verde.
Daniel Cohn-Bendit cumpriu mandatos como deputado verde no Parlamento Europeu. Agora, aos 68 anos de idade, anuncia que vai deixar o Parlamento. Mas nem de longe pensa em “depor as armas”.
A curto prazo, os projetos de Cohn-Bendit envolvem diretamente o Brasil: como se quisesse mostrar que nunca é hora de pendurar as chuteiras, o líder da rebelião de maio de 1968 decidiu que vai – literalmente – botar o pé na estrada, no Brasil, durante a Copa do Mundo de 2014.
A bordo de uma van, Cohn-Bendit fará uma grande viagem pelo país. Vai registrar, com uma equipe de filmagem, o que acontecerá no país durante a disputa da Copa. Pretende produzir uma espécie de diário audiovisual.
O ex-líder da rebelião dos estudantes nem chegará perto dos estádios. Chama o entorno dos estádios de “Fifa Land” – o Território da Fifa. Bendit quer se encontrar com personagens de um outro país – o Brasil real.
O resultado da expedição de Cohn-Bendit pelas estradas brasileiras vai virar filme – um documentário com lançamento previsto para o final de 2014. A van que Cohn-Bendit dirigirá pelo Brasil afora já foi batizada: ganhou o nome de “Sócrates”.
É uma homenagem ao ex-jogador da seleção brasileira – que era amigo de Cohn-Bendit desde os tempos da Democracia Corinthiana, nos anos oitenta. O próprio Sócrates – morto em dezembro de 2011 – tinha transmitido a Cohn-Bendit o desejo de participar da expedição rodoviária.
Numa viagem ao Brasil, para preparar a grande expedição rodoviária que fará a partir de junho de 2014 por terras brasileiras, Daniel Cohn-Bendit falou ao Dossiê Geral, horas antes de embarcar de volta à Alemanha:
1.Como é que você se define hoje, politicamente?
Daniel Cohn-Bendit: “Sou, politicamente, um social-ecologista. Ou seja: um ecologista com engajamento social. E um batalhador pelos direitos humanos”.
2.O que a palavra utopia significa para você hoje?
Daniel Cohn-Bendit: “A gente ainda precisa de utopia. Mas é algo cada vez mais difícil. Minha geração teve uma série de utopias erradas – que não funcionaram. Não é questão de encontrar algo. Algumas vezes é uma questão de dizer “é preciso regular a globalização”. Isso é utopia, mas é uma necessidade. A utopia, portanto, é sempre algo que a gente tem de fazer, ainda que se saiba que é algo difícil de realizar”
3.Depois do fim das ideologias, a política perdeu o apelo que tinha sobre os jovens?
Daniel Cohn-Bendit: “Um dos grandes problemas é que os jovens não acreditam que a política muda as coisas. É o mesmo que acontece com a globalização. As grandes indústrias – e coisas assim – fazem o mundo. Os jovens já não acreditam nos políticos. O problema com a política, hoje, é que os políticos não dizem a verdade. Não dizem: “Não sei” ou “é difícil”. Os políticos sempre fingem que sabem para onde iremos caminhar ou como iremos. Não é verdade. É esta a razão por que os jovens dizem aos políticos: “Já não acreditamos em vocês”.
4.Você era “Dani, o Vermelho”. Depois, “Dani, o Verde”. Hoje, você é Dani o quê?
Daniel Cohn-Bendit: “Dani, o razoável….Não! Sou ainda verde. Uma vida sustentável ainda é uma necessidade. Eis aí uma utopia. Ainda acredito que a gente tem de mudar nossa maneira de viver. Porque nosso ritmo de vida é muito rápido. Os verdes – com um projeto social e ecológico – são uma necessidade”.
5.Eu sei que você não gosta de dar conselhos, como um avô – mas se um jovem pedisse a você um conselho político, o que é que você diria, em primeiro lugar?
Daniel Cohn-Bendit: “Tente encontrar seus próprios caminhos! Em segundo: o planeta corre perigo, em consequência de nosso modo de vida. Pense no que você pode fazer pelo planeta – não apenas no que os outros podem fazer por você”.
6. Há ainda, então, lugar para otimismo hoje? Como você sabe, depois do fim do socialismo, tantos disseram “ah, não quero mudar o mundo: vou tomar conta de mim mesmo…”
Daniel Cohn-Bendit: “Há um ditado judaico que diz: “Se você só tiver duas possibilidades, escolha sempre a terceira!”. Isso é otimismo.
7. E é o conselho que você dá?
Daniel Cohn-Bendit: “Sim!”
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