Milhões nas ruas protestando; sete em cada dez eleitores declarando desejo de mudança no governo. O cenário no qual transcorreram as eleições de 2014 prenunciava uma transformação profunda da política brasileira. O resultado não poderia ser mais contrastante. O Congresso Nacional terá poucas caras novas e com sobrenomes velhos.
Os Estados continuam sendo governados, na imensa maioria, pelos mesmos caciques de sempre. E Dilma Rousseff (PT) segue sendo presidente do Brasil, após derrotar o PSDB no segundo turno: 2002, 2006 e 2010 “reloaded”.
A maior renovação aconteceu no Maranhão, com Flávio Dino (PC do B), que desalojou o clã dos Sarney. No Mato Grosso, Pedro Taques (PDT) é um procurador tornado senador que se elegeu governador.
Em todo o resto, a troca de comando, quando houve, foi de seis por meia dúzia. Ou, no máximo, por um terço de 18.
REELEITOS NA CÂMARA
Dos 513 deputados federais, 401 tentaram se reeleger e 290 conseguiram. Sua taxa de sucesso foi de 72%. Nada se correlaciona mais com a vitória na eleição parlamentar do que já ser um parlamentar. Por outro lado, se “apenas” 290 estarão de volta a Brasília no próximo ano, quer dizer que 223 são novos, certo? Não exatamente. Pelo menos 25 não são novatos, mas redivivos. Já foram deputado antes, só tinham dado um tempo.
A Câmara terá 198 neófitos que terão seu primeiro gabinete brasiliense. Formalmente, é a maior taxa de renovação desde 1998: 39%. Mas o exame da lista de eleitos revela que grande parte das caras novas têm sobrenomes ou nomes de guerra velhos conhecidos do Congresso, como Covas, Cardoso e Garotinho.
Mudam só os prenomes: Bruno em lugar de Mario, Clarissa em vez de Anthony. Às vezes nem isso, basta acrescentar um “júnior”, um “neto” ou até um um “bisneto” no final. São todos herdeiros do poder, como Newton Cardoso Jr., Expedito Netto e Arthur Bisneto. A hereditariedade do poder é um dos legados da monarquia que a república brasileira conserva com mais afeto e zelo.
Entre os neófitos, quem não chegou lá por ser parente se encaixa em pelo uma dessas categorias: já passou por outro cargo eletivo (prefeito, deputado estadual etc), exerceu alguma função pública (policial, promotor etc), é celebridade – com as exceções que confirmam a regra. Na Câmara, a eleição foi seis por meia dúzia.
QUESTÃO DE RENDA…
Por que os gritos e cartazes não se converteram em votos de protesto? Não em quantidade suficiente para mudar os donos do poder. Por que? Há várias respostas, esta é apenas uma.
Porque quem foi às ruas protestar foi um segmento expressivo, mas um segmento, não toda a população. Eram majoritariamente jovens que tiveram mais oportunidades de estudo do que qualquer outra geração anterior à deles na história do Brasil.
Os mais velhos votaram na continuidade. Não arriscaram porque, mesmo sem tanto estudo quanto os filhos, experimentaram um incremento de renda que nem seus pais nem avós experimentaram. Para eles não era seis por meia dúzia.
Estadão
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