Eu já me exasperei muito na vida. Hoje procuro conter-me.
Assisti à minha dose de revoluções e vi que o mais que se consegue com elas, em matéria de progresso institucional, é perder tempo. Mas é possível dispensar a revolução num país como este?
Hoje, por exemplo, foi dia. Como não me exasperar vendo aqui na TV o espetáculo revoltante dos quinta-colunas plantados dentro do STF pelo PT com a missão explícita de desmontar essa instituição, invalidar suas decisões mais recentes e importantes e, com isso, matar a função do Poder Judiciário num país em que o Legislativo já é um cadáver afogado em dinheiro e que beira o estado de anomia?
Tudo isso poucas horas depois de ter comentado na Radio Bandeirantes o fato de um prisioneiro condenado, o sr. Delúbio Soares, ter derrubado dois diretores da prisão em que está enjaulado porque tem costas quentes da Presidência da República para baixo para desafia-los e manter privilégios inaceitáveis. E ainda estomagado por ter tido de tragar ainda ontem a arrogante resposta das mais altas autoridades da republica petista - “É isso mesmo, e daí?” – à descoberta de que a horda do MST que, ha alguns dias, marchou sobre Brasilia e tentou invadir o Supremo Tribunal Federal foi financiada por verbas públicas!
Só tendo sangue de barata!
O que eu ia escrever hoje parava no esbarro que dei com a origem de uma citação recorrente de que poucos conhecem a origem.
Eram só os cinco parágrafos que destaco a seguir em itálico:
“Nos meados de janeiro, voltando das férias onde andei dando uns mergulhos na História do Brasil, escrevi o artigo “Abaixo a revolução” (aqui) comparando a história das instituições latinas e saxônicas e mostrando que a nossa marca recorrente é a da ruptura e a da revolução enquanto a deles é a da continuidade, tudo isso para concluir que, não por acaso, uma conduziu à democracia e aquela que mais grita e derrama sangue em seu nome não.
Hoje de manhã deparei-me com uma citação de George Santayana, espanhol de origem mas que passou boa parte da vida nos EUA e pensou e escreveu sua obra em inglês, que eu mesmo já repeti centenas de vezes sem nunca ter sabido de onde vinha e, muito menos, qual era o contexto em que se inseria.
Ela resume a essência do que tentei dizer naquele artigo com muito mais precisão e muito menos palavras, pelo que eu humildemente ofereço-a a vocês.
“O progresso não pode ser identificado à mudança; ao contrário ele é fruto da capacidade de reter e acumular experiência. Quando a mudança é radical não fica nada para ser melhorado e, consequentemente, não se pode fixar um direcionamento para fazer com que aquilo que já não existe se torne melhor: e onde a experiência não se fixa e perde-se após cada ato, como acontece entre selvagens, a infância se perpetua. Aqueles que não conseguem se lembrar do passado estão condenados a repeti-lo”.
Ele está indiscutivelmente certo e a História está aí para confirma-lo. Não é uma teoria. O que ele afirma é uma constatação, de modo que não se trata de renegar o que eu disse no artigo citado.
Mas enquanto eu editava essa materícula a televisão, aqui no canto do meu olho, despejava-me no fígado a imoralidade flácida e melíflua desse senhor Barroso que dona Dilma plantou no STF, como disse o ministro Joaquim com palavras mais brandas, porque ele concordou em entregar antes o voto que vendeu e depositou ontem.
Não ha, honestamente, como não entender a exasperação do ministro Joaquim Barbosa diante do cinismo dos quinta colunas com que se tem enfrentado, sobretudo pela tática dessa “polidez” pastosa que empregam, naquela velha tradição ibérica do “hímen complacente” que se deixa penetrar por todos os buracos mas volta sempre, com cara de santo, ao “estado de virgindade“.
O ministro Joaquim tenta fazer valer a lei, por dentro de canais institucionais torcidos exatamente para manter ”quem pode” fora do alcance dela, a exemplo do que fizeram, ha mais de 400 anos, os juristas que plantaram a pedra fundamental da democracia moderna na Inglaterra seiscentista submetendo o rei.
Eles conseguiram. Mas naquele exato momento, lá vão 400 anos, a latinidade deu um “cavalo-de-pau” na pista do progresso institucional e passou a seguir no rumo contrário. Desde então, a continuidade, aqui, consiste em permanecer na iniquidade. E como permanecemos nela desde sempre, é só no refino da iniquidade que temos “retido e acumulado experiência“.
Como inverter novamente o rumo sem uma revolução? E, se fizermos mais uma, como acumular experiência para um progresso real das instituições com a suspensão da vigência das instituições que é o que caracteriza a revolução?
Eis aí inteiro, portanto, o dilema latino. Eis aí o drama em que se tem debatido o Brasil honesto, intensamente vivido por quatro gerações de minha família, em que a esquerda honesta e os liberais honestos, aquela meia dúzia de sempre, vão sendo empurrados pelo desespero da resistência mole do “hímen complacente” dos carcomidos da hora até pescarem alguém das bordas da política, tentando convencer-se de que é um laivo de virtude aquilo que, na verdade, são apenas vícios que ainda não tiveram a chance de se revelar, e contribuir contrafeitos para coloca-los em posição de se mostrar os carcomidos que são, acabando, ao fim de tudo, os dois – liberais e esquerdistas honestos – por seguir juntos para o degredo pela mão do novo monstrinho que seu desespero acabou ajudando a criar.
Foi assim com a República, foi assim com Getúlio Vargas, foi assim com os militares, foi assim com Collor, foi assim com o PT.
Quem sabe, neste país dos avessos, a solução venha agora com uma revoluçãozinha encerrada dentro dos limites das prisões, como esta que os dois diretores demitidos por Delúbio estão dizendo ao país que não poderão conter se as coisas continuarem como vão, para mostrar ao mundo aqui de fora que esse tipo de crime já nem o crime admite?
Ou será que eles vão conseguir esculhambar até mesmo a ancestral e implacável “Lei do cão“?
Sei lá!
Não é atoa que as ruas estão pegando fogo. Vai piorar muito antes de melhorar!
27 de fevereiro de 2014
vespeiro
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