Militares, Militantes, Meliantes e a Intervenção
Edição do Alerta Total – www.alertatotal.net
Novamente, grandes manifestações de rua para este domingo são convocadas pela mobilização em redes sociais. Ninguém em bom senso se iluda que haverá imensa quantidade de pessoas como naqueles atos anteriores ao impeachment da Dilma Rousseff. No entanto, é líquido e certo que a qualidade fará diferença. A legitimidade dos protestos e as demandas objetivas, também. O culto ao “Super Moro” (herói que se multiplica no subconsciente do brasileiro) tende a se expandir.
O cenário brasileiro é, no mínimo, esquisito. Alguns analistas – inclusive os militares – insistem na tese de que prevalece uma “maturidade e normalidade das instituições”. Trata-se de uma avaliação estrategicamente temerária. Nunca antes na História deste País houve um conflito tão evidente e aberto entre os poderes executivo, legislativo e judiciário (incluindo-se aí a máquina independente do Ministério Público), enquanto os militares só observam atentamente a tudo.
O conflito direto entre os poderes, sobretudo com o protagonismo do judiciário com o chamado “Efeito Lava Jato”, é uma novidade. A “guerra” não-declarada expõe, exatamente, o que muitos preferem não admitir publicamente – ou porque realmente não enxergam ou porque preferem não botar mais lenha na fogueira do inferno: as instituições republicanas brasileiras não funcionam como deveriam porque foram contaminadas pela combinação de ineficiência estrutural, corporativismo e corrupção sistêmica.
No Brasil, o crime assumiu uma feição mais que organizada. O crime é institucionalizado. Não é mera obra de “facções”. Afeta, diretamente, todos os poderes públicos. Todos, sem exceção, alguns mais, outro menos. A crise estrutural assume uma dimensão mais tensa e grave quando combinada com a debilidade econômica por ela gerada e a crise política de complicada solução sem um “tranco”, um “freio de arrumação”, uma repactuação constitucional. A corrupta, ineficiente e perdulária máquina estatal – fonte e reprodutora dos problemas – não tem mais como se sustentar “roubando” a sociedade, via extorsão de impostos, juros e serviços públicos caríssimos.
Os deuses e semideuses do mercado, muito a contragosto, são forçados a reconhecer uma “piora da situação”. Até a queda da Dilma, com a ascensão de Michel Temer, apostava-se em uma “melhora” a partir do começo de 2017. Agora, indicadores oficiais e análises isentas de mercado confirmam que a recessão vai se prolongar. Além de estamos longe da retomada do crescimento, o fator político da crise afeta diretamente o econômico, alimentando a tensão social. O desmanche das medidas anticorrupção pelo Congresso Nacional foi a senha para a Odebrecht sacramentar a abertura do portão do apocalipse com as delações premiadas de 77 dirigentes, junto com o acordo de leniência do próprio grupo.
A incerteza política e econômica foi deflagrada. A cúpula do Legislativo desafia o Judiciário – que aumenta o já tradicional corporativismo e, de forma inédita, parte para o ativismo público. Magistrados e promotores deixam de se manifestar apenas nos autos dos processos para falarem nas redes sociais – e também nas ruas. Facções criminosas de políticos perderam a vergonha e desafiam o poder togado, focando em suas fragilidades institucionais.
Ainda não está claro qual será o resultado final dos embates. A tradicional “conciliação” entre os poderes nunca esteve tão complicada de ser viabilizada. A aprovação de uma Lei sobre Abuso de Autoridade, a toque de caixa e sem um debate mais demorado, tende a gerar ainda mais estresse na guerra entre os poderes. Se o parlamento também mexer na remuneração dos magistrados e no orçamento do judiciário, a situação ficará mais beligerante ainda.
Resumindo: Os problemas estruturais continuam os mesmos. O governo Temer perdeu a capacidade de promover as reformas prometidas. O conflito entre Legislativo e Judiciário vai aumentar a quantidade de condenações e prisões, ao mesmo tempo em que vai gerar restrições na legislação para a livre atuação judiciária. Tudo só vai aumentar a ojeriza da população em relação aos políticos. Tal revolta gera perigosas pré-condições para um “ódio” e desrespeito contra a atividade política – que deveria ser legítima, e não criminosa.
É preciso insistir por 13 x 13: Medidas Anticorrupção e Leis sobre Abuso de Autoridade mereceriam um amplo debate antes de serem aprovadas pelo parlamento e sancionadas pelo Presidente da República. Infelizmente, as coisas não acontecem assim no Brasil. Demagogia, malandragem e canalhices tomam o lugar das livres discussões. Novamente, corremos o risco de ampliar o regramento já excessivo, sem efetiva garantia de respeito e cumprimento às leis, além de copiarmos instrumentos legai excelentes para outros países, mas nem sempre adequados à realidade brasileira.
A única saída para consertar o Brasil é uma inédita Intervenção Cívica Constitucional. Publicamente, no entanto, os militares insistem em não admitir tal solução. Recente entrevista do ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI), General de Exército Sérgio Westphalen Etchegoyen, deixa isto bem claro: “As Forças Armadas têm hoje uma noção perfeitamente clara do seu papel e da grandeza do Brasil. O Brasil não é um país que dependa das Forças Armadas para progredir”.
Considerando que uma das principais estratégias militares de guerra é a dissimulação, as palavras do General poderiam refletir, exatamente, um pensamento contrário. No entanto, tal hipótese parece falsa. Os militares rejeitam qualquer intervenção direta no mesmo estilo de 1964. A História, no entanto, ensina que intervenções pontuais, para freio de arrumação, ocorreram em Honduras, no Paraguai e, por alta pressão popular, na pequena Islândia.
Apesar de inédita por aqui, Intervenção Cívica Constitucional não é uma “jabuticaba” brasileira... Se conseguirmos ir além do mero “iluminismo de zelites”, gerando uma consistente mobilização popular em torno de mudanças estruturais concretas, poderemos criar as pré-condições não-beligerantes para a necessária Intervenção. Caso ocorra uma explosão de violência e o caos social no Brasil – e não estamos longe disto -, aí a Intervenção se torna inevitável. Tudo dependerá da velocidade com que decisões corretas – ou equivocadas – serão tomadas daqui para frente.
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04 de dezembro de 2016
Jorge Serrão é Jornalista, Radialista, Publicitário e Professor.
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