A queda do ministério do governo da França é o resultado da forte guinada do presidente François Hollande para uma política econômica ortodoxa.
A França vive hoje uma estagnação do sistema produtivo parecida com a do Brasil. Hollande se elegeu pregando a cartilha heterodoxa contra o arrocho fiscal e impôs uma linha dura contra o capital e os mais ricos. Chegou a decretar um imposto de renda de 75% sobre ganhos superiores a 1 milhão de euros por ano. Tudo o que conseguiu foi o fechamento recorde de indústrias e a revoada de artistas e de empresários para o exterior.
Em janeiro, Hollande beijou a cruz e agora tenta levar adiante uma política econômica que ele mesmo denominou de “pacto de austeridade”, destinada a reequilibrar as contas públicas e a criar condições para que o setor produtivo recupere competitividade.
O problema básico de Hollande é o de que a dívida alta demais (93,6% do PIB), o baixo crescimento econômico (de apenas 0,3% em 2013) e o alto desemprego (10%) impedem a expansão dos gastos públicos como alavanca de recuperação da economia. Se a França não fizesse parte de uma união monetária (área do euro), seu governo ainda poderia desvalorizar sua moeda para reduzir os salários, baratear em moeda estrangeira o produto francês e exportar mais. Como renunciou à soberania monetária, tem de produzir efeito equivalente por meio da redução drástica de despesas.
O francês não tem nem consciência nem disciplina pública suficiente para aceitar uma redução de salários, como o alemão aceitou. Assim, as reformas e o megacorte de despesas públicas da ordem de 50 bilhões de euros (US$ 65,5 bilhões) em três anos funcionam como disfarce para a redução da renda. A transferência de recursos em vantagens fiscais para as empresas para que possam se recuperar foi de 40 bilhões de euros (US$ 52,4 bilhões).
Neste domingo, o até ontem ministro da Economia, Arnaud Montebourg, feroz adversário da “obsessão alemã”, em entrevista ao jornal francês Le Monde, na prática declarou-se em rebelião contra essa política. Assim, facilitou a vida de François Hollande que acaba de ordenar a recomposição do governo que abre caminho para o inevitável.
Na última sexta-feira, o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, admitiu que poderia ajudar a retomada da atividade com emissão de moeda se os governos da área do euro fizessem sua parte com mais aperto fiscal. Isso sugere que o movimento de Hollande seja parte de esforço coordenado da área do euro para a criação de condições para a retomada sustentável da produção.
A conversão do socialista Hollande à austeridade, agora com ações de maior impacto, é um aviso para o governo Dilma que também vem desprezando recomendações em direção ao maior equilíbrio fiscal. Pode-se administrar política pública de qualquer coloração ideológica, desde que a execução do orçamento seja feita com equilíbrio.
Isso não significa que não se devam fazer dívidas. Significa apenas que estas têm de ser cobertas com recursos que não coloquem em risco seu pagamento futuro. No Brasil, até mesmo o flexível ministro da Fazenda, Guido Mantega, já avisou que, em 2015, será preciso providenciar um alentado aumento do superávit das contas públicas para garantir um mínimo de arrumação da economia.
Antônio Ermírio
Dizia sempre o que pensava. Podia mudar de opinião, mas nunca desdisse o que disse. Terno surrado sobre camisa de colarinho folgado em pelo menos três dedos, Antônio Ermírio estava sempre pronto a operar sua régua de cálculo. Os resultados saiam com precisão de décimos. Acreditar no futuro do Brasil era só um bom começo. O resto teria de vir com trabalho duro – e nada de dar mesada generosa demais para os filhos, “pra não criar vagabundo”. Fará muita falta.
A França vive hoje uma estagnação do sistema produtivo parecida com a do Brasil. Hollande se elegeu pregando a cartilha heterodoxa contra o arrocho fiscal e impôs uma linha dura contra o capital e os mais ricos. Chegou a decretar um imposto de renda de 75% sobre ganhos superiores a 1 milhão de euros por ano. Tudo o que conseguiu foi o fechamento recorde de indústrias e a revoada de artistas e de empresários para o exterior.
Em janeiro, Hollande beijou a cruz e agora tenta levar adiante uma política econômica que ele mesmo denominou de “pacto de austeridade”, destinada a reequilibrar as contas públicas e a criar condições para que o setor produtivo recupere competitividade.
O problema básico de Hollande é o de que a dívida alta demais (93,6% do PIB), o baixo crescimento econômico (de apenas 0,3% em 2013) e o alto desemprego (10%) impedem a expansão dos gastos públicos como alavanca de recuperação da economia. Se a França não fizesse parte de uma união monetária (área do euro), seu governo ainda poderia desvalorizar sua moeda para reduzir os salários, baratear em moeda estrangeira o produto francês e exportar mais. Como renunciou à soberania monetária, tem de produzir efeito equivalente por meio da redução drástica de despesas.
O francês não tem nem consciência nem disciplina pública suficiente para aceitar uma redução de salários, como o alemão aceitou. Assim, as reformas e o megacorte de despesas públicas da ordem de 50 bilhões de euros (US$ 65,5 bilhões) em três anos funcionam como disfarce para a redução da renda. A transferência de recursos em vantagens fiscais para as empresas para que possam se recuperar foi de 40 bilhões de euros (US$ 52,4 bilhões).
Neste domingo, o até ontem ministro da Economia, Arnaud Montebourg, feroz adversário da “obsessão alemã”, em entrevista ao jornal francês Le Monde, na prática declarou-se em rebelião contra essa política. Assim, facilitou a vida de François Hollande que acaba de ordenar a recomposição do governo que abre caminho para o inevitável.
Na última sexta-feira, o presidente do Banco Central Europeu, Mario Draghi, admitiu que poderia ajudar a retomada da atividade com emissão de moeda se os governos da área do euro fizessem sua parte com mais aperto fiscal. Isso sugere que o movimento de Hollande seja parte de esforço coordenado da área do euro para a criação de condições para a retomada sustentável da produção.
A conversão do socialista Hollande à austeridade, agora com ações de maior impacto, é um aviso para o governo Dilma que também vem desprezando recomendações em direção ao maior equilíbrio fiscal. Pode-se administrar política pública de qualquer coloração ideológica, desde que a execução do orçamento seja feita com equilíbrio.
Isso não significa que não se devam fazer dívidas. Significa apenas que estas têm de ser cobertas com recursos que não coloquem em risco seu pagamento futuro. No Brasil, até mesmo o flexível ministro da Fazenda, Guido Mantega, já avisou que, em 2015, será preciso providenciar um alentado aumento do superávit das contas públicas para garantir um mínimo de arrumação da economia.
Antônio Ermírio
Dizia sempre o que pensava. Podia mudar de opinião, mas nunca desdisse o que disse. Terno surrado sobre camisa de colarinho folgado em pelo menos três dedos, Antônio Ermírio estava sempre pronto a operar sua régua de cálculo. Os resultados saiam com precisão de décimos. Acreditar no futuro do Brasil era só um bom começo. O resto teria de vir com trabalho duro – e nada de dar mesada generosa demais para os filhos, “pra não criar vagabundo”. Fará muita falta.
29 de agosto de 2014
Celso Ming, O Estadão
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